A utilização do bagaço da cana-de-açúcar na geração de energia elétrica pode ser uma alternativa estratégica para combater o risco de racionamento no país durante a estiagem prolongada. Isso porque, esse tipo de eletricidade é gerado justamente durante a época de seca, entre abril e novembro, quando ocorre a moagem da cana para produção de açúcar e etanol no Sudeste, e no mesmo período em que o nível dos reservatórios fica mais baixo.
Na região de Ribeirão Preto (SP), apenas duas usinas juntas produzem energia suficiente para abastecer uma cidade com 500 mil habitantes por 18 horas ininterruptas. O diretor de bioenergia Jairo Balbo contou que o projeto foi implantado há 25 anos, um dos primeiros no interior do estado, com a pretensão de abastecer apenas a própria unidade em caso de apagão.
“Nós tínhamos um pequeno gerador e queríamos ser autossuficientes, mas no primeiro ano produzimos o suficiente para suprir a usina e ainda sobrou. Então fechamos um acordo com a companhia de abastecimento e passamos a disponibilizar o excedente para a rede”, explica Balbo.
Atualmente, após um investimento de R$ 65 milhões na compra de uma caldeira e um sistema de geradores mais modernos, o grupo consegue produzir 45 megawatts (MW) de energia. Desse total, apenas 34% ficam nas usinas. O percentual restante é vendido para concessionárias e poderia ser ainda maior, caso houvesse incentivo financeiro governamental.
Energia de Itaipu – Segundo dados da União das Indústrias de Cana-de-Açúcar (Unica), as cerca de 440 usinas brasileiras produzem atualmente 1.350 MW a partir do resíduo da cana, o suficiente para poupar 5% dos reservatórios da região Sudeste/Centro-Oeste, os mais afetados pela falta de chuvas.
A quantidade poderia ser dez vezes maior, segundo o diretor da Unica, Sérgio Prado, caso existissem políticas públicas para incentivar a geração de energia a partir da biomassa. Prado defende a criação de um plano que possa auxiliar os usineiros a expandir o modelo já aplicado.
“É uma prática ainda tímida em face do potencial que o setor sucroalcooleiro oferece. Todas as usinas juntas têm capacidade para gerar 15.300 MW, o equivalente a pouco mais de uma Itaipu”, afirma.
Mais barato – O engenheiro eletricista Arthur Padovani destaca ainda que os custos de investimentos são menores se comparados à geração de usinas hidrelétricas e nucleares. “No caso da energia eólica, sem dúvida custa mais barato, mas é difícil de ser colocada na rede. Também não basta ter só a termelétrica, precisa ter gás. E onde vamos arrumar gás por tanto tempo?”, questiona.
Padovani explica também que a energia gerada pela cana polui menos em comparação às termelétricas. O carvão mineral, a que o governo recorreu este ano para suprir o aumento da demanda energética nacional, coloca na atmosfera 800 quilos de CO2 por MW/h. No caso do bagaço, a emissão é praticamente zero.
“Biomassa é cogeração pura, ou seja, geração simultânea. Você tem que queimar o bagaço para produzir etanol e açúcar, então a energia elétrica é uma consequência.”