Os debates que se travam em torno da conveniência de se construir reservatórios de água para a produção de energia elétrica não se justificam, segundo os especialistas que participaram do painel “Hidrelétricas sem reservatórios: seremos cobrados pelas gerações futuras?”, no seminário da Fiesp.
O engenheiro eletricista José Carlos de Miranda de Farias, diretor de estudos sobre energia elétrica da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), acredita que a cobrança virá. Mas ele espera poder se defender: não é de hoje que procura conscientizar diversos setores da sociedade sobre a importância de se construir grandes reservatórios, uma vez que esses imensos lagos não servem apenas para acumular água. Têm inúmeras utilidades, a começar do controle que exercem sobre a vazão dos rios, como ocorre com o represamento dos principais rios do Nordeste, em que foram construídos cinco reservatórios.
O objetivo principal é a produção de energia elétrica, mas os benefícios secundários desses reservatórios, segundo Farias, são incontáveis. Com eles, Recife (PE), está a salvo das cheias. Os agricultores colhem até três safras de melão por ano e foi possível ali se estabelecer uma importante indústria da pesca, que além de alimentar a população local, ainda dirige parte significativa da produção ao comércio exterior.
Farias afirmou que os reservatórios devem fazer parte de um sistema integrado, que inclui o aproveitamento da biomassa, da energia solar e outras fontes alternativas. Os reservatórios, para ele, devem atuar como uma grande bateria. Entram em ação no momento em que faltam ventos, luz ou chuvas para manter a produção de energia. Na Europa, quando faltam vento e luz solar, o que entra em ação são as usinas de geração térmica para garantir o fornecimento de energia à população, emitindo gases de efeito estufa. Para ele, a falta de reservatórios na Amazônia limitará a capacidade de regularização da vazão dos rios.
Para o consultor Rafael Kelman, o Brasil está preso a uma armadilha. A formação de reservatórios permite armazenar energia e regular a vazão da água. Mas isso não será possível em Belo Monte, e em tantas outras hidrelétricas que sejam construídas no região Norte, por causa das condições topográficas. Com isso, a capacidade de geração de energia ficará restrita à sazonalidade. Kelman, que é diretor da empresa de consultoria energética PSR, ressaltou que os benefícios dos reservatórios ficam limitados, caso não sejam construídas linhas de transmissão em extensão adequada para transferir a energia gerada para regiões distantes. Ele lembrou também que esses lagos gigantes se tornam ainda mais importantes na medida em que os efeitos das mudanças climáticas se acentuam.
As hidrelétricas, segundo acredita o consultor, são ágeis e eficientes. “Quanto mais se quer regularizar o fornecimento de energia, mais reservatórios precisam ser construídos”, afirmou. A questão, para ele, é quanto ao seu tamanho. “Não há muitos locais adequados para a construção de reservatórios na bacia Amazônica”, ressaltou. Por isso, é melhor que sejam construídos nos afluentes dos rios onde ocorre a produção de energia. “Os reservatórios não precisam estar próximos à produção.”
O coordenador do Greenpeace Brasil, Ricardo Baitelo, contestou parcialmente a posição dos demais palestrantes. Para ele, térmicas e hidrelétricas não são as únicas alternativas para a produção de energia. Baitelo explicou, porém, que o Greenpeace não é contra as hidrelétricas. Só recomenda que outras tecnologias devem ser consideradas, referindo-se à energia eólica e solar.
A instituição só faz oposição radical às nucleares. Mas lembra que o desafio para suprir a demanda das futuras gerações é imenso e requer planejamento, especialmente porque a maioria dos países se comprometeram a cumprir programas de redução de emissões de gases de efeito estufa até 2050.