A COP 26 deixará marcas fortes no futuro da economia, pelo mundo afora. Foram 15 dias de amplas discussões, negociações e compromissos em torno de metas, que agora devem impactar nossas vidas e a das próximas gerações, em algum grau, sejam ou não cumpridos. Difícil falar de tudo no espaço de um pequeno comentário. Então, aqui o foco vai para um dos fatos geopolíticos mais relevantes dessa Cúpula do Clima – o reengajamento dos EUA na questão climática (o governo Trump havia abandonado o Acordo de Paris) e a retomada de seu protagonismo no encaminhamento mundial da questão.
O presidente Joe Biden fez da agenda verde um pilar de suas políticas internas e externas. Aí se encaixam coisas como a renovação da infraestrutura do país sob uma perspectiva sustentável e impulsionada por inovações da economia verde. Também estímulos econômicos de peso a pesquisas e empreendimentos que proporcionem saltos no uso de tecnologias limpas. No seu conjunto, estamos falando de um programa da ordem de 1 trilhão de dólares, para incentivar o setor privado na direção de soluções menos agressivas ao ambiente e descarbonizadas.
Esse retorno dos EUA ao protagonismo climático (debate e ação) cria um contraponto geopolítico à visibilidade que a China estava adquirindo na agenda verde, apesar de ser o maior emissor de GEE do planeta. E a Europa, que há muito é um celeiro de bandeiras pela sustentabilidade. Ou seja: os motores da economia mundial – EUA, China e União Europeia – parecem estar mais engajados na agenda verde (apesar de controvérsias em seus próprios territórios). Mas, quando se olha de uma perspectiva histórica, o progresso vem prevalecendo.
Enfim, parece que a questão climática, outras agendas de ambientais e a bioeconomia pautarão em boa medida o crescimento econômico nos próximos anos. Disso, ao que tudo indica, ninguém vai escapar. Pelo menos não as 20 maiores economias do mundo (o chamado G 20), todas com um relevante grau de integração internacional, entre elas o Brasil. E nós, aqui nos trópicos, o que temos para navegar nessa rota, sob pressões de todos os lados pela descarbonização da economia e sustentabilidade do planeta?
Na COP 26, a percepção do Brasil acho que saiu como as duas faces de uma moeda. De um lado, o passivo político do desmatamento na Amazônia e da baixa efetividade do governo em contê-lo. De outro lado, o dinamismo da sociedade civil em criar inovações e engajar-se na pauta climática, com nossos avanços em energia renovável, produção sustentável de alimentos (iLPF e Plano ABC+), carne carbono neutro e florestas plantadas repercutindo positivamente. O país também formalizou compromissos de zerar o desmate ilegal até 2028, cortar a emissão de GEE pela metade até 2030, reduzir gás metano e atingir a neutralidade de carbono em 2050. Promessas, no entanto, que ainda estão sob o signo de um certo descrédito.
Como na vida o joio sempre desvaloriza o trigo, o Brasil precisa fazer as lições de casa que não deveria ter abandonado. Lições que o país bem conhece, mas nem sempre conduz com a vontade e a responsabilidade desejáveis. O país bem poderia ser um visionário na agenda verde, como já foi um dia na agricultura tropical sustentável, o que lhe valeu o protagonismo na segurança alimentar mundial. Afinal, o que foi a revolução agrícola tropical que fizemos senão uma atitude visionária na época, atrás da autossuficiência em alimentos?
É hora de também sermos visionários em estratégias de sustentabilidade. Será que é razoável resistir a coisas que seriam boas para o país, em nome de paradigmas do século passado? No mínimo, seria inteligente pensar e avaliar custo-benefício a médio e longo prazos. Pelo que se observa no quadrante histórico da economia mundial que se inicia com a COP 26, a ponte com o amanhã está em ser mais assertivo com as visões ascendentes das sociedades e do consumidor global. As gerações mais novas são nativas da descarbonização, da energia limpa e da bioeconomia. E será com elas que vamos escrever as nossas páginas de futuro.