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Infraestrutura

Investimos pouco e ainda por cima gastamos mal

É preciso aumentar a eficiência da gestão e do gasto público para alavancar o desenvolvimento.

Investimos pouco e ainda por cima gastamos mal

Em 2001, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso extinguiu a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), pressionado por denúncias de corrupção, que envolviam R$ 2,2 bilhões em desvios e 653 projetos cancelados por irregularidades. Em 2007, o ex-presidente Lula ressuscitou-a, mas, infelizmente, segundo a Controladoria Geral da União (CGU), cerca de 90% do orçamento do órgão vem sendo consumido para pagar funcionários e despesas administrativas. Em vez de servir ao Nordeste, serve-se a si mesma.

O poder público no Brasil consome demais, 21% do Produto Interno Bruto (PIB), e investe de menos, 2%. Além desse excesso de consumo, também limitam os investimentos com projetos mal feitos e indícios de corrupção que paralisam obras no Tribunal de Contas da União (TCU). Há excesso de burocracia, incoerências e inconsistências da legislação, que atrasam a concessão de licenças ambientais. Processos licitatórios e marcos regulatórios de infraestrutura seguem desatualizados, com agências enfraquecidas.

A Austrália limitou o crescimento do gasto público a 1% ao ano até que o orçamento se reequilibre. Depois, o crescimento ficará limitado a 2% ao ano. Projeções do Movimento Brasil Eficiente (MBE) indicam que, para o país recuperar a capacidade de crescer rapidamente, a expansão dos gastos públicos correntes (transferências mais custeio) não deve ultrapassar um terço da taxa de crescimento da economia. Isso permitiria aumentar os investimentos dos atuais 19% para 25% do PIB, dos quais, 5% em infraestrutura.
 
O problema é que, na prática, vem ocorrendo o inverso: de 1999 a 2009, segundo o economista Samuel Pessoa, da Fundação Getulio Vargas (FGV), o gasto público federal real cresceu à taxa média de 7,3%, bem mais, portanto, do que a economia. No primeiro semestre de 2012, enquanto a economia cresceu menos de 1%, a arrecadação federal aumentou 7,8% e o gasto da União, 12,5%. E, diferentemente, de países como Chile, Austrália e Noruega, o governo brasileiro não tem aproveitado as épocas favoráveis para criar uma poupança da qual possa se socorrer nos tempos ruins. Isso indica que novos percalços serão sempre debitados à sociedade, realimentando um círculo vicioso.

O brasileiro trabalha cinco meses do ano somente para pagar tributos, e trabalha outros quatro meses para adquirir os serviços que o Estado deveria suprir por conta dos tributos que recolhe. Pagamos muito ao governo e recebemos pouco de volta. Uma amostra disso está na área da saúde: temos metade do número de leitos hospitalares, por mil habitantes, que a Argentina, e um sexto do que o Japão possui. Na esfera da educação, registra-se que de três a quatro alunos da rede pública concluem o ensino fundamental sem saber ler, escrever e fazer contas. O atraso segue: um alvará de construção civil demora, em média, 469 dias no Brasil, contra 67 em Hong Kong. Para registrar um negócio em nosso país, são necessários 119 dias, ante sete no Chile.

Além de funcionar mal, a máquina pública é cara. Os analistas da Receita Federal fizeram greves, no ano que passou, pleiteando 85% de aumento de salário, após um ajuste de 60% em 2008 (dividido em três parcelas anuais). Sérgio Mendonça, secretário de Relações de Trabalho do Ministério do Planejamento, menciona esse como um dos exemplos fora da realidade. Como agravante, observa-se a falta de regulamentação para as greves do funcionalismo, que tramita no Congresso desde 2010, mas que, na realidade, está pendente desde a promulgação da Constituição em 1988. Até o ex-presidente Lula criticou as greves dos servidores sem perda salarial. Enquanto na Alemanha existem 170 funcionários em cargos de confiança e no Reino Unido, 300, no Brasil esse número sobe para 22 mil em mais uma demonstração de que a nossa máquina pública, antes de mais nada, serve-se do público.
 
Estudos que medem a eficiência dos gastos públicos têm concluído que fartura de recursos leva à má utilização e ao desperdício. É a falta de dinheiro que torna o gestor mais eficiente. O economista Raul Velloso confirma que a falta de caixa estimula o aperfeiçoamento do gasto. Pesquisa sobre os frutos da aplicação dos royalties do petróleo ilustra isso. Os municípios beneficiados com cifras elevadas não têm crescido mais do que os outros, porque não há regras nem mecanismos de controle para a aplicação desses recursos, e nem metas a alcançar. A maior parte tem sido consumida pelo custeio da máquina e pela corrupção, em detrimento de novos investimentos. Deveríamos aprender com a Noruega, que tem sabido gerenciar bem a riqueza proveniente do petróleo: criou um fundo fiscalizado pelo Ministério das Finanças e gerenciado pelo Banco Central que só libera para o orçamento público o rendimento anual líquido de aproximadamente 4%. Assim, essa riqueza, que é finita, fica preservada para o futuro do país.

O serviço público precisa ser modernizado. Conceitos como estabilidade de emprego e isonomia salarial precisam ser substituídos por avaliação de desempenho e gestão por resultados. É preciso que o administrador público tenha maior flexibilidade para substituir pessoas de desempenho inadequado. Assim como no setor privado, premiar aquelas de rendimento diferenciado, bem como, viabilizar a criação de mecanismos que permitam à sociedade cobrar responsabilidades dos gestores.

Mesmo que tenhamos hoje situação fiscal melhor que a de muitos países desenvolvidos, ela é pior que a da maioria dos mercados emergentes. Para cobrir as nossas necessidades de financiamento, precisamos de recursos que nos colocam na antepenúltima posição num levantamento de 23 nações emergentes: 18,5% do PIB em 2012, contra 3,9% da Colômbia, 2,5% do Peru e apenas 1% do Chile. Além disso, esses países têm inflação controlada e crescimento mais robusto do que o que vem sendo registrado pelo Brasil.

Segundo o economista Paulo Rabello de Castro, do Movimento Brasil Eficiente, precisamos estancar o processo de extração de eficiência do setor privado para financiar custeios públicos.

Temos que empreender verdadeira batalha pelo aumento da eficiência da gestão e do gasto público, o primeiro e provavelmente mais importante passo para o tão necessário ajuste fiscal que possa alavancar o nosso desenvolvimento.

Carlos Rodolfo Schneider é vice-presidente da Ciser e coordenador do Movimento Brasil Eficiente (MBE)