A participação expressiva da Eletrobras nos dois últimos leilões do setor elétrico vai muito além de uma possível diretriz política de seu acionista majoritário, o governo federal, para garantir o sucesso das licitações. A forte atuação da estatal, que arrematou, sozinha ou em parceria, metade dos lotes ofertados no último leilão de transmissão e 63,4% da capacidade negociada no leilão A-3, é uma necessidade urgente da empresa de ter novas receitas, após perder parte significativa do faturamento com a Medida Provisória nº 579, transformada na lei 12.783/2013 – da Prorrogação das Concessões.
“É uma definição estratégica de buscar projetos que tenham condições de ser, ao mesmo tempo, competitivos e que tragam resultados adequados para a empresa. O futuro da companhia é agregar novas receitas aos seus negócios”, disse Marcos Aurélio Madureira, presidente da Chesf.
Braço de atuação da Eletrobras no Nordeste, a Chesf arrematou, em parceria com fundos de investimentos, contratos para 12 parques eólicos na Bahia, Pernambuco e Piauí, somando 338 megawatts (MW) instalados. Segundo a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), os projetos alcançam receita anual de R$ 160,5 milhões.
“A participação expressiva da Eletrobras foi uma ação para recompor receita depois da MP nº 579”, avalia Thais Prandini, da consultoria Thymos Energia.
De acordo com o balanço da Eletrobras do terceiro trimestre, a receita operacional líquida da companhia recuou 9,2%, em relação a igual período de 2012, para R$ 6,1 bilhões. No acumulado do ano até setembro, a queda da receita é de quase 10%, totalizando R$ 17,8 bilhões, devido às tarifas mais baixas de geração e transmissão, no âmbito da MP.
Diante desse cenário, a empresa precisa fazer dinheiro rapidamente para recompor parte do rombo na receita. Capitalizadas com R$ 14 bilhões da indenização dos ativos de geração e transmissão cujas concessões foram renovadas antecipadamente, as subsidiárias da Eletrobras estão investindo em projetos menores e de curto prazo, para ter retorno mais rápido e mais garantido.
“As subsidiárias da Eletrobras estão com dinheiro da indenização. Estão com caixa neste momento. O desafio delas é investir em projetos com retorno mais seguro, de curto prazo, para fazer fluxo de caixa”, afirma o coordenador do Grupo de Estudo do Setor de Energia Elétrica da UFRJ, professor Nivalde de Castro.
No leilão A-3 (que negocia contratos para início de fornecimento de energia em três anos) realizado na segunda-feira, além da Chesf, a Eletrobras arrematou contratos para outros 15 projetos eólicos, por meio da Eletrosul, subsidiária que atua na região Sul do país. Localizados no Rio Grande do Sul, esses parques totalizam 212,5 MW de capacidade e terão receita anual fixa de aproximadamente R$ 80 milhões, de acordo com a CCEE.
Devido à fraca competição no A-3, o preço médio, de R$ 124,43 por megawatt-hora (MWh), ficou próximo do preço-teto, de R$ 126 por MWh, o que garantiu aos projetos taxas de retorno entre 12% e 15%, segundo cálculos de um consultor que atende companhias do setor elétrico e que preferiu não se identificar.
A Eletrobras já havia adotado uma estratégia mais agressiva no leilão de energia de reserva, em agosto. Na ocasião, o grupo respondeu por 38 dos 66 parques eólicos vencedores da licitação.
No leilão de linhas de transmissão realizado na semana passada, a participação das subsidiárias da Eletrobras também foi expressiva. Sozinhas ou em consórcio, elas venceram cinco dos dez lotes que receberam ofertas, respondendo por quase 70% da receita anual permitida negociada no leilão. Apenas o grupo Eletrobras vai receber anualmente R$ 138,3 milhões pela operação dessas linhas de transmissão.
Segundo Castro, a ausência de grandes grupos privados no último leilão A-3 indica uma cautela por parte deles em um período de instabilidade do setor, provocada por reflexos regulatórios da MP nº 579 e por um cenário macroeconômico nebuloso.
No setor, contudo, comenta-se que as empresas privadas estão se preparando para melhores oportunidades de negócio mais à frente. Na área de geração, a aposta é o leilão A-5 (que negocia contratos com início de entrega em cinco anos), marcado para 13 de dezembro. O prazo maior para a implantação das usinas dá mais segurança aos investidores.
Já no setor de transmissão, as atenções estão voltadas para o leilão do sistema de transmissão que fará o escoamento de energia da megausina de Belo Monte, de 11.233 MW, no Pará, para o Sudeste, que deve ocorrer no início de 2014. Segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), a principal linha do sistema terá 2,1 mil km de extensão, ligando a hidrelétrica a uma subestação em Minas Gerais, e investimentos de cerca de R$ 4 bilhões.