A falta de capacidade das estradas de acesso ao porto de Santos, pátios reguladores operando perto do limite e o desrespeito a agendamentos na chegada de cargas apontam para mais uma safra de soja com problemas e congestionamentos no maior complexo portuário da América Latina.
Filas de caminhões nos acessos e dentro da cidade de Santos já foram registrados na semana passada e voltaram a ocorrer na terça e nesta quarta-feira, provocando reclamações de caminhoneiros, moradores e comerciantes de grãos do Brasil, que se debate para superar gargalos logísticos com medidas preventivas enquanto esperados investimentos não resolvem um dos principais problemas para acelerar seu crescimento.
Praticamente todas as cargas exportadas que chegam de caminhão precisam descer a Serra do Mar, pelas rodovias Anchieta e Imigrantes. E agora, numa tentativa de organizar um caótico fluxo, todos os veículos são obrigados a fazer uma parada agendada em pátios reguladores em Cubatão, a poucos quilômetros dos terminais portuários, sob ameaça de multa.
“Cubatão não está comportando. É muita perda de tempo e sofrimento para nós”, disse à Reuters o caminhoneiro Wilson Luiz de Almeida Jr., esperando na fila para descarregar em um terminal de Santos.
Assim como muitos outros, Almeida enfrentou uma verdadeira odisseia para percorrer os últimos 40 quilômetros de viagem, na terça-feira: quatro horas para descer a serra e conseguir entrar no pátio e mais quatro horas para sair do pátio e chegar ao portão do terminal.
Isso representa custos para toda a cadeia produtiva e perda de competitividade para o Brasil, um dos produtores agrícolas mais eficientes do mundo, dentro da fazenda, mas com histórico problema de infraestrutura.
A Associação Nacional de Exportadores de Cereais (Anec) estimou prejuízo de 2,5 bilhões de dólares para as empresas do setor em 2013, devido a fatores que incluíram a elevação não esperada no custo do frete rodoviário, em parte decorrente dos congestionamentos para acessar os portos.
“Os pátios não dão conta de absorver porque os caminhões chegam fora da programação”, disse um empresário do setor de logística em Cubatão, que pediu para não ser identificado.
Ele avalia que os congestionamentos na região se devem à mistura do fluxo elevado de caminhões de grãos com veículos que atendem o polo industrial de Cubatão, sem falar que Santos é fundamental para a entrada e saída de bens manufaturados do Brasil.
“Aumenta-se a demanda de capacidade de exportação, mas as rodovias continuam as mesmas”, disse.
O problema dos últimos dias não é novo. No primeiro semestre do ano passado, a partir do início do escoamento da nova safra de soja, ruas e avenidas de Santos e Guarujá, no acesso aos terminais graneleiros, enfrentaram congestionamentos frequentes.
Neste ano, o volume da oleaginosa a ser embarcado pelo país só tende a crescer, acompanhando uma nova safra recorde, que permitirá ao Brasil liderar novamente as exportações globais de soja, num momento de forte demanda da China pela matéria-prima.
Os embarques brasileiros devem subir 4 por cento, para 44,5 milhões de toneladas, disse nesta quarta-feira a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove).
Santos é o principal porto para as exportações de grãos e açúcar no país.
O PIOR DA HISTÓRIA
Na porta de um dos terminais, tentando saber em que momento descarregaria sua carga, o caminhoneiro José Carlos dos Santos estava pessimista.
“Este já é o pior ano para nós”, disse ele, com a experiência de quem transporta grãos para Santos há 27 anos.
Há dois pátios reguladores na região de Cubatão (Baixada Santista) que operam em parceria com as empresas exportadoras e as autoridades portuárias, para coordenar o fluxo de caminhões antes da chegada deles aos terminais.
Na terça-feira, dia de grandes congestionamentos, o Ecopátio operava perto da capacidade máxima, com lotação de 85 por cento da recepção de 3.500 caminhões por dia. E isso num momento em que nem um terço da safra de soja de cerca de 90 milhões de toneladas está colhida.
O Rodopark recebeu 1.100 caminhões, de uma capacidade de 1.200 por dia.
Com a safra já sendo escoada, as autoridades ainda trabalham para tentar cadastrar este ano pelo menos dois novos pátios reguladores: um em Sumaré (SP) e outro em Santos. Cada um deve ter capacidade estática para não muito mais do que 150 veículos, segundo a Codesp, empresa federal que administra o porto.
“O acesso aos pátios está complicado. A fila está no entorno”, disse o caminhoneiro Luiz Veloso, que trazia farelo de soja de Goiás para Santos.
“As vias de acesso ao porto são insuficientes”, afirmou o diretor-presidente da Codesp, Renato Barco, em entrevista coletiva na terça-feira.
Na avaliação do presidente da Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec), Sérgio Mendes, todo o sistema de acesso ao porto opera muito próximo de seu limite.
“Folga evidentemente o sistema não tem… Se não for muito bem organizado, basta um caminhão sair fora para criar problemas”, disse.
AGENDAMENTO
A esperança das autoridades federais que administram o porto é conseguir disciplinar as empresas exportadoras e os terminais a enviarem caminhões para a região do porto apenas dentro de um sistema de agendamento, que está sendo implementado nesta safra.
“À medida que temos algumas empresas que insistem em não cumprir as regras, temos o tumulto. Há veículos que estão antecipando em dois ou três dias sua chegada… recepção de veículos não agendados, tanto em pátios como em terminais”, disse Luis Claudio Montenegro, diretor de informações portuária da Secretaria de Portos (SEP), do governo federal.
Nada impede que um caminhoneiro ou exportador fure o esquema de agendamento, visando alguma vantagem econômica que supere o valor das multas.
Até o momento, houve somente advertências e conversas para fazer com que as empresas respeitem o agendamento. Multas devem começar a ser aplicadas esta semana, disseram os representantes da SEP e da Codesp.
Na avaliação da prefeitura de Santos, há poucos motivos para otimismo.
“Tivemos problemas nos primeiros dias… Se isso tudo for só o início, é até compreensível, mas se daqui para a frente a situação agravar, isso preocupa”, disse secretário municipal de Assuntos Portuários, José Eduardo Lopes.