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Entrevista

Para Loyola, país necessita de uma 'correção' na política macroeconômica

Gustavo Loyola: "O Banco Central precisa ser enérgico para baixar a inflação".

02/12/2009 Editoria: Brasil Reporter: Joao Villaverde Local: SP Pauta: Seminario sobre economia brasileira para 2010 com quatro economistas. A ideia e ter fotos de cada um falando e, se possivel, em separado, apara atualizarmos imagens. Personagem: Gustavo Loyola, da Tendencias Consultoria. Foto: Anna Carolina Negri/Valor
02/12/2009 Editoria: Brasil Reporter: Joao Villaverde Local: SP Pauta: Seminario sobre economia brasileira para 2010 com quatro economistas. A ideia e ter fotos de cada um falando e, se possivel, em separado, apara atualizarmos imagens. Personagem: Gustavo Loyola, da Tendencias Consultoria. Foto: Anna Carolina Negri/Valor

Qual deveria ser o caminho adotado pelo governo? Atender as demandas da sociedade, que envolvem mais gastos públicos, ou a do mercado, que pede ajuste fiscal?

Gustavo Loyola: Não colocaria assim. Acho que não há saída sem manutenção de responsabilidade da política macroeconômica. Qualquer afastamento dessa responsabilidade mais cedo ou mais tarde vai cobrar um preço político e social muito grande. Por trás dessas manifestações, existe certo desconforto em relação à inflação. Imagina se você começa agora a adotar medidas que acabem levando a desequilíbrio maior na questão inflacionária. É um tiro no pé. Não tem como falar em atender esses anseios da sociedade por melhores serviços públicos jogando no lixo a agenda de responsabilidade macroeconômica. Quando a gente observa a natureza das demandas sociais, vê que o que está por trás delas são demandas que implicam qualidade do gasto público, onde o governo gasta e como gasta, ou arrecada impostos. Esse é o grande problema, porque você acaba tendo um sistema de prioridades invertidas. O governo acaba fazendo coisas demais, tendo uma agenda que não atende o que a sociedade espera.

O sr. poderia citar um exemplo de prioridade invertida?

Loyola: Em termos de gasto, um exemplo: o dinheiro que se gasta com a Copa do Mundo. É isso mesmo que se quer? Ou ele poderia ir para outro tipo de gasto? Os subsídios que são dados pelo BNDES, é isso que a sociedade quer? Outro exemplo: o governo optou nos últimos meses por reduzir o IPI, os impostos incidentes sobre a gasolina e estimular o financiamento de veículos. Uma agenda pró-transporte individual. A manifestação que se viu nas ruas tem como objetivo o transporte público. É isso que a sociedade quer? Subsidiar o transporte individual ou o coletivo? Não dá para querer tudo ao mesmo tempo. A saída não é gastar aquilo que não se tem, entrar em uma agenda irresponsável.

Considerando essas escolhas, agora que estamos em um ano pré-eleitoral e de mercado turbulento em razão dos sinais de redução da liquidez com a retomada da economia dos EUA, qual caminho a política econômica deve seguir?

Loyola: Do ponto de vista macroeconômico, acho que é preciso cuidar bem dessa turbulência. Tinha tudo para ser uma turbulência benigna, porque, no fundo, é uma reação do mercado a uma notícia boa, que é a reação da economia americana. Se você tem uma base macroeconômica sólida, essa turbulência tende a ser passageira e de efeito benigno. O problema é que pega uma economia em que as pessoas estão cada vez mais desconfortáveis, com medo da inflação, a situação fiscal está menos transparente. Essa é a situação atual que eu vejo no Brasil. A gente precisa de um pouco mais de transparência na questão fiscal, o BC precisa ser enérgico para baixar a inflação, um dos incômodos que levaram a essas sucessivas manifestações. Não foi o único, mas não deixou de adicionar ao problema.

A pressão popular e o ano eleitoral podem dificultar um ajuste fiscal, que é o que o mercado pede?

Loyola: Existe o risco de o governo não reagir corretamente, ter uma leitura equivocada e de repente tentar atender essa pressão adotando medidas mais populistas, que não são sustentáveis. Esse é um risco, buscar medidas de curto prazo. Quase como se fosse uma política de empurrar a sujeira para baixo do tapete, que vai dar problema mais para frente.

Se isso acontecesse, quais seriam as implicações para a economia?

Loyola: Baixo crescimento para o país mais à frente, pode ser inflação, depende do tipo de medida que pode ser adotada. Nós temos muitas experiências no Brasil no passado e na América Latina de populismo que deu errado.

O sr. acredita na possibilidade de o governo atender à demanda do mercado e sinalizar um choque fiscal crível?

Loyola: Não quero descartar essa possibilidade. Em algum momento o governo não vai ter muita alternativa. Espero que faça isso o mais rápido possível.

O ministro da Fazenda disse que a meta de superávit primário para este ano será de 2,3%, mas não explicou como a alcançará. O sr. acredita que o governo vai cumprir a meta este ano?

Loyola: A grande dúvida que fica é que, pelas ações no passado da equipe econômica, todo mundo questiona a maneira pela qual se cumpre a meta. É uma meta verdadeira, esse número vai ser atingido? Ou por algum tipo de manobra? O governo está pagando um preço por ter deixado de agir com transparência, principalmente naquele ajuste que houve no fim do ano passado, quando adotou aquele turbilhão de contabilidade criativa no fechamento do ano. Criou-se uma situação de desconfiança em relação ao desempenho fiscal do governo e isso é muito ruim. É uma pergunta que, se houvesse credibilidade, não seria feita.

Em meio à pressão popular, é possível fazer esse ajuste fiscal e ainda vencer a eleição no ano que vem?

Loyola: A eleição tem muito a ver com a questão econômica. O governo tem que zelar, do ponto de vista eleitoral, para não haja uma deterioração mais forte do ambiente econômico que atinja o mercado de trabalho. A deterioração já foi observada na inflação, mas o mercado de trabalho está relativamente preservado. A única maneira de evitar essa deterioração é atacar a inflação. Isso exige um redirecionamento da política macroeconômica, notadamente da política fiscal. Principalmente no contexto de um dólar volátil. Isso não seria muito problema, caso não estivéssemos com esse período de desconfiança. Isso pode levar a um agravamento da inflação no Brasil, que viria em um momento em que a inflação já está em patamar desconfortavelmente alto. Esse tem que ser o objetivo do governo. Arrefecer essa expectativa inflacionária, melhorar essa percepção em relação à questão fiscal e procurar alavancar investimentos, seja de brasileiros, seja externos.

O sr. acha que essa estratégia poderia “acalmar as massas”?

Loyola: Acho que não adianta você querer acalmar as massas com um anestésico que, quando passar, daqui a pouco, vai gerar mais dores ainda. Precisa de remédio. É claro que uma parte importante da agenda que foi às ruas não é econômica, é política, tem outros aspectos. Mas do ponto de vista econômico, o que a sociedade quer discutir, a meu ver, é como é feita a taxação no Brasil, e como se gasta. Muitas vezes a gente faz análise macroeconômica e foca na questão quantitativa. Mas por trás disso há a maneira pela qual você gasta, com baixo volume de investimento. O governo precisa ter algumas prioridades e ser eficiente no seu gasto. O governo brasileiro é muito ineficiente, a cada real que se gasta, grande parte se perde no caminho e não gera resultado.

O sr. acredita que a economia está tão ruim como o mercado está interpretando? Ou há exagero?

Loyola: Quando há mudança de preços de ativos, como nesse movimento do dólar, existe tendência de um certo exagero. Não acho que a situação no Brasil seja de crise, nem que o Brasil esteja à beira de uma crise. Mas é necessário que o governo preste atenção aos alertas que estão sendo colocados. Por exemplo, a Standard & Poor’s colocou perspectiva negativa para o nosso rating. Para o Brasil, seria extremamente negativo perder o investment grade. Do ponto de vista de investimentos, isso tiraria o Brasil do mapa e voltaríamos a ser um país de alto risco. Por isso é importante, sem postura alarmista, insistirmos para que haja uma correção nessas políticas, principalmente na política macroeconômica, buscando uma retomada nas políticas fiscais e monetárias. Principalmente fiscais, que é onde me parece que está o calcanhar de Aquiles.

Esse cenário exigirá uma atuação mais firme do BC?

Loyola: Pode ser. Em um cenário em que a política fiscal não ajuda, é expansionista, a política monetária tem que fazer um esforço maior, o que significa ter a taxa de juros mais alta do que em um cenário em que a política fiscal colaborasse mais.