Estudo do Serviço Florestal Brasileiro (FSB), financiado pelo Banco Mundial, concluiu que a indústria madeireira é pouco fiscalizada pelos governos estaduais, há falhas na licença de operação e faltam transparência e critérios rigorosos e padronizados em relação à origem do insumo florestal nela processado. “É urgente mudar o foco do controle, hoje centrado da extração e transporte da madeira”, afirma Antonio Carlos Hummel, diretor-geral da instituição. Em sua análise, a ênfase deve estar nas serrarias e empresas de beneficiamento: “A fiscalização do consumo é a melhor forma de matar o problema na floresta”.
O relatório subsidiará uma nova agenda de combate à ilegalidade da madeira, em construção pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA). “Se as práticas tradicionais de controle não estão resolvendo, é preciso fazer diferente”, ressalta Hummel. A pesquisa, coordenada pela consultora Anna Fanzeres, é enfática ao afirmar que “o atual sistema de licenciamento de indústrias madeireiras não favorece o combate à ilegalidade e, consequentemente, não contribui com as práticas de manejo florestal”.
Amapá, Pará, Maranhão, Rondônia e Mato Grosso possuem comprovação da origem da madeira que chega às indústrias, mas não existe cruzamento de informações dentro de um modelo padronizado. Nas serrarias, a principal fonte de ilegalidade está nos resíduos da madeira. A norma atual de controle sobre o que entra e o que sai da indústria prevê um rendimento de 45% no corte das toras. O restante se perde. No entanto, como na prática a produtividade é diferente, ocorre uma “sobra” de 10% a 20% de volume nos estoques – quantidade que pode ser utilizada para “esquentar” madeira sem licenciamento ou extraída de áreas proibidas, colocando-a no mercado.
“Não é possível continuar apostando em modelos de controle que não conseguem fechar a conta da correlação entre o volume original da entrada de toras e o volume final de madeira processada”, diz o estudo. Os pesquisadores recomendam a criação de uma norma federal de referência para o licenciamento de indústrias madeireiras na Amazônia, o que poderia ser realizado por meio da regulamentação dos artigos 35 e 36 do novo Código Florestal (Lei 12.651/2012).
A exploração e industrialização ilegal de madeira fragiliza a competitividade de quem faz o correto e investe no manejo florestal sustentável.
Estima-se que 90% da produção de madeira na Amazônia tenha algum tipo de ilegalidade ou seja lastreada pelo que se chama de “falsa legalidade” – quando a documentação “comprova” a licença e a exploração por métodos adequados, com base em dados fictícios. Além de levar construtoras a substituir madeira nativa por materiais alternativos, o problema reduz os benefícios da concessão de florestas públicas à exploração sustentável por empresas.
Existem 22 milhões de hectares de florestas federais aptas ao regime de concessão, com potencial de fornecer 6,7 milhões de metros cúbicos de madeira dentro da legalidade, com garantia de origem e viabilidade de logística. Do total disponível, menos de 10% foi licitado e está em operação. “O modelo tem papel importante na economia florestal brasileira e contribuiria significativamente na geração de emprego e renda para a região Amazônica”, avalia André Luiz de Andrade, gerente de planejamento florestal do SFB.
Há pressões internacionais de mercado para a mudança de padrão da madeira brasileira.
A União Europeia, com o FLEGT (Forest Law Enforcement, Governance and Trade), fornece uma série de medidas destinadas a excluir a madeira ilegal e aumentar a demanda por produtos responsáveis. Nos EUA, o Lacey Act estabelece procedimentos de controle para importadores e exportadores de madeira. “As perspectivas são muito boas para modelos de negócios alicerçados na sustentabilidade e legalidade”, completa Andrade.
A recuperação da economia global favorece a demanda. O relatório “Living Forest”, divulgado no fim do ano passado pelo WWF, traz projeções otimistas para o consumo de madeira, nativa e de plantações. Em 2010, segundo a FAO, o total da oferta mundial foi de 3,4 bilhões de metros de metros cúbicos, um mercado de US$ 18,5 bilhões ao ano. Para 2030, no cenário mais conservador, o volume deverá ultrapassar os 7,1 bilhões de metros cúbicos, ou seja, mais que o dobro. Além dos usos tradicionais, a biomassa florestal deverá ser mais utilizada para fins energéticos e para compor biomateriais – produtos farmacêuticos, plásticos, têxteis e eletrônicos.
Diante da maior demanda, diz o estudo, até 2050 entre 242 milhões e 304 milhões de hectares adicionais de florestas naturais fora de parques e reservas devem ser manejadas para a colheita comercial no mundo, além de mais 250 milhões de hectares de novas plantações de árvores. Ao todo, a área adicional equivale a dois terços do território brasileiro.
A questão é que hoje menos da metade das florestas em produção no planeta segue critérios ambientais e se tornam vulneráveis à degradação e desmatamento, o que tem mobilizado mercados internacionais para a adoção de controle. No Brasil, a preocupação chegou à indústria moveleira, alvo de recente estudo encomendado pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), no sentido de orientar o setor na competição com os asiáticos. “Recomendamos uma série de medidas como o consumo responsável de matéria-prima e a maior diversificação de espécies madeireiras”, revela Luciana Betiol, pesquisadora do Centro de Estudos em Sustentabilidade, da Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo.
Na construção civil, a expectativa está no mercado interno. O Ministério da Fazenda projeta um cenário promissor ao prever que a parcela do setor na Formação Bruta de Capital Fixo passará de 8%, em 2012, para 12%, em 2022. Em paralelo, a Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção Civil estima uma taxa de crescimento da venda de materiais de construção de 4,7% ao ano, levando em conta a perspectiva de construção de 37 milhões de novas moradias até 2030.