Às vésperas do início do plantio de grãos no Brasil, o preço da soja atingiu o maior patamar em quatro anos em relação ao do milho no mercado futuro – um incentivo adicional à expansão da área destinada à oleaginosa no Sul do Brasil e na Argentina, onde as duas culturas disputam por área no plantio de verão.
Em setembro, a cotação média da soja negociada na bolsa de Chicago (US$ 13,6433 por bushel) está 2,92 vezes mais alta que a do milho (4,6775 por bushel), considerando os contratos com maior liquidez. De acordo com o Valor Data, trata-se do maior diferencial desde agosto de 2009, quando a relação alcançou 3,07 vezes.
O maior aperto na oferta global de soja, realçado pela preocupação com a colheita nos Estados Unidos, fez com que a commodity se valorizasse em relação ao “rival”. Nos últimos 30 dias, o preço da soja subiu 11,2% em Chicago, enquanto o milho avançou pouco menos de 3,5%.
Historicamente, a relação de equilíbrio entre o preço das duas commodities (baseada nos diferenciais de produtividade e custos de produção) oscila em torno de 2,3 vezes. Abaixo desse nível, a produção de milho tende a ser mais rentável que a de soja; acima, a soja passa a ser a opção mais vantajosa.
Entre janeiro e março, período em que os agricultores americanos planejam o plantio, o preço médio da soja em Chicago oscilou entre 1,97 e 2,03 vezes o do milho. Com isso, o mercado sinalizava a necessidade de os Estados Unidos produzirem uma grande safra de milho após a quebra de 2012.
Desde então, o diferencial vem subindo mês após mês. Segundo analistas, o mercado está convencido de que a produção americana de milho será suficientemente grande para que os estoques cheguem ao fim da temporada em níveis confortáveis, ainda que o clima hostil das últimas semanas roube dos produtores algumas sacas por hectare.
Também pesa sobre o milho a demanda fraca pelo grão nos Estados Unidos (tanto para exportação quanto para a fabricação de etanol), assim como o fato de que setembro é o mês em que a colheita ganha força, reabastecendo os canais de distribuição e empurrando os preços para baixo.
Em contrapartida, o mercado de soja lida com um cenário de maior aperto na oferta e incertezas em relação ao tamanho da produção nos Estados Unidos.
Com o recrudescimento do calor, a condição das lavouras ao longo do Meio-Oeste vem se deteriorando. Há quatro semanas, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) calculava que 62% das lavouras de soja estavam em situação “boa” a “excelente”. Em avaliação realizada no último domingo, apenas 52% foram classificadas dessas forma.
Com isso, a produção americana deste ano deve ficar bem aquém da expectativa inicial de 93 milhões de toneladas. No mês passado, o USDA já havia reduzido sua estimativa para 88,6 milhões de toneladas. Agora, analistas de mercado ouvidos pela Dow Jones Newswires apostam em um novo corte, para 85,7 milhões de toneladas – apenas 3 milhões de toneladas a mais do que em 2012.
Com isso, os estoques americanos ao fim da temporada 2013/14 poderiam somar não mais do que 4,4 milhões de toneladas, pouco mais da metade do que o USDA previa até julho. Os analistas mais pessimistas veem estoques tão baixos quanto 2,9 milhões de toneladas, inferiores até às 3,4 milhões de toneladas remanescentes da safra 2012/13.
“Temos um cenário apertado para a soja. Qualquer perda agora fará uma grande diferença sobre o mercado”, afirma Steve Cachia, analista da Cerealpar.
Trata-se de um cenário muito diferente em relação ao do milho. Mesmo que o USDA corte em 3 milhões de toneladas sua estimativa para a produção americana de milho – para 346,6 milhões de toneladas, como prevê o mercado -, o efeito sobre os estoques deverá ser pequeno. A expectativa é que a projeção oficial para o volume remanescente da nova safra caia de 46,7 milhões para 43,1 milhões de toneladas – ainda assim, um crescimento de 135,9% na comparação anual. “Não são 3 ou 4 milhões de toneladas que vão mudar o cenário para o milho”, conclui Cachia.
Diante desse cenário, observa o analista, a soja ficou muito mais atraente que o milho para os fundos que especulam nos mercados de commodities. De acordo com os últimos dados da Comissão de Comércio de Futuros de Commodities (CFTC, na sigla em inglês), os investidores institucionais estavam “comprados” em mais de 159 mil contratos de soja no último dia 3 – um recorde para o ano. Em compensação, estavam “vendidos” em pouco mais de 64,5 mil contratos de milho, um sintoma do desânimo em relação às perspectivas de alta da commodity.
“Nos últimos tempos, os fundos passaram a vender milho e comprar soja, que é a última chance de capturar algum ganho antes da colheita americana”, afirma Cachia.
Segundo a consultoria Safras & Mercado, a produção de soja pode crescer até 8%, a 88 milhões de toneladas, na safra 2013/14. Em contrapartida, a colheita de milho tende a recuar 5,9%, a pouco mais de 77 milhões de toneladas. Para o plantio de verão – quando os produtores do Sul podem escolher entre soja e milho -, a consultoria prevê uma queda de 13% na produção de milho.
O consultor da FCStone, Vinícius Xavier, afirma que o produtor está “bem decepcionado” com o milho. “Tenho visto aqui no Paraná algumas áreas de milho perdendo 30% para soja. Há situações também em que o produtor quer trocar o milho pela soja, mas já não consegue mais semente”, observa.
Segundo ele, a soja que começa a ser plantada neste mês (e que será colhida em março) pode ser negociada na faixa entre R$ 62 e R$ 63 por saca no norte do Paraná. No caso do milho, os produtores sequer conseguem tomar preço. “Não temos praticamente nenhuma negociação da nova safra do grão. Mal estamos negociando a safrinha deste ano”, afirma Xavier.