O fraco desempenho do setor industrial e a deterioração da confiança dos empresários desde janeiro está levando economistas a revisar as projeções para o investimento em 2014. Algumas estimativas, que no início do ano eram de alta de até 4% para a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF, medida das contas nacionais do que se investe em máquinas e equipamentos e na construção civil), se transformaram em queda de quase de 5% e ajudam a explicar a piora do cenário para crescimento do país no período.
A redução, se confirmada, praticamente apagaria a alta de 5,2% observada no ano passado e só seria inferior, no período recente, à queda de 6,7% observada em 2009.
Para alguns economistas, além do aumento do pessimismo entre os empresários, o fim de incentivos para aquisição de bens de capital também contribui para piorar os prognósticos para o investimento neste ano. Apenas entre janeiro e maio, a produção de bens de capital caiu 5,8%, enquanto a atividade industrial como um todo encolheu 1,6%, com retração em 15 de 24 setores. As compras de bens de capital do exterior também recuaram: até maio, o país reduziu esse tipo de importação em 3,32%, segundo a Funcex.
O economista-chefe do Bradesco, Octavio de Barros, foi um dos que revisaram a projeção para 2014. No início do ano, a expectativa dele era de crescimento de 4% da formação de capital fixo. Agora, prevê queda de 5%. De acordo com Barros, o principal problema não são mudanças nos fundamentos macroeconômicos, mas a perda de confiança na economia. A queda da confiança da indústria hoje, diz, já é metade da verificada em 2009, ano de encolhimento do PIB, quando o nível de confiança chegou a 74 pontos. Hoje, está próximo de 88 pontos, pelo sexto mês consecutivo abaixo de 100, o que indica empresários pessimistas.
O quadro deve levar a uma piora tanto na construção civil quanto no ramo de bens de capital. Nas estimativas do Bradesco, o setor de construção no PIB deve mostrar queda de cerca de 3% no segundo trimestre, seguindo queda de 2,3% ocorrida no primeiro trimestre. Em relação aos bens de capital, destaca que o nível de produção já se encontra próximo ao de 2012 e, na comparação com igual período do ano passado, a queda atinge 7,6%. Em parte, essa retração é influenciada pelo desempenho ruim de caminhões e ônibus, que mostram recuo de 27,7% na mesma comparação.
Para Marcelo Kfoury, do departamento econômico do Citi Brasil, há uma série de fatores que explicam o pessimismo crescente dos empresários. Além das incertezas naturais em ano de eleição, há a expectativa de ajustes em 2015, que costuma ser de “arrumação de casa”, com o início de um novo mandato. O acúmulo de estoques, afirma, é outro fator importante para atrasar projetos de investimento. “Na indústria automobilística, os veículos parados estão quase em nível recorde. Com isso, não há incentivo para elevar a capacidade de produção”.
O economista estima retração de 3% dos investimentos neste ano, após alta de 5,2% em 2013. Em sua avaliação, há cerca de 30% de chance de que o país entre em recessão, com dois trimestres consecutivos de encolhimento da atividade econômica, embora este não seja seu cenário base atualmente. Ainda assim, Kfoury estima crescimento de apenas 0,9% em 2014.
Ainda que fatores pontuais, como o acúmulo de estoques pela indústria e o aumento de juros em algumas linhas do Programa de Sustentação dos Investimentos (PSI), ajudem a explicar a expectativa de queda de investimentos em 2014, para Fernando Rocha, sócio e economista da JGP Gestão de Recursos, o quadro econômico atual é o mais relevante.
Segundo Rocha, a política econômica aumentou o nível de incerteza, com inflação alta, limitações do lado fiscal e sinais mais evidentes de moderação da demanda doméstica e do mercado de trabalho. Sem perspectiva de alteração significativa do cenário no curto prazo, o setor produtivo prefere adotar postura mais cautelosa.
José Márcio Camargo, economista da Opus Investimentos, afirma que os problemas no setor energético, com aumento do custo de energia, também fazem com que empresários coloquem o pé no freio. Em sua avaliação, a taxa de investimentos do Brasil pode ficar em apenas 16% ao fim deste ano, mesmo nível observado em 2006 e abaixo da do ano passado, quando o investimento como proporção do PIB ficou em 18,2%.
Camargo avalia que o momento atual é curioso, porque há a percepção de que aumenta o grau de incerteza entre os agentes econômicos quando os sinais são de reeleição da presidente Dilma Rousseff. O crescimento da oposição, ao contrário do que costuma ser usual, anima empresários. Em sua avaliação, isso acontece porque os candidatos da oposição têm deixado mais claro qual será sua política econômica, inclusive anunciando alguns nomes para cargos importantes, como o Ministério da Fazenda. Já Dilma tem evitado falar sobre a política econômica no caso de um segundo mandato.
Mansueto Almeida, especialista em contas públicas, avalia que o atual quadro de queda de confiança é preocupante, por se assemelhar ao de 2009, quando o PIB caiu 0,3%. Para Mansueto, o pessimismo, antes mais restrito ao mercado financeiro, agora parece ter contagiado os empresários das diversas atividades econômicas.
“Hoje, nada joga a favor do investimento”, disse Antônio Corrêa de Lacerda, professor da PUC-SP, afirmando que o câmbio continua apreciado e mantido assim para resolver pressões inflacionárias internas e não para ampliar a competitividade industrial. O economista previa aumento de 4% na formação de capital fixo em 2014 e agora espera queda de 5%. Lacerda também cita a ociosidade nas fábricas como fator relevante para explicar o fato de que as empresas têm adiado desembolsos.
Outro impedimento, diz, são os juros altos, que favorecem a aplicação de recursos das empresas no mercado financeiro e não em investimentos. As políticas de desoneração têm tido efeitos marginais reduzidos, afirma, tendo o país atingido um limite no modelo de crescimento do pós-crise de 2008 baseado no aumento do consumo e do crédito. “Isso hoje não tem mais o mesmo potencial.
Outro fator importante, segundo Lacerda, é que a Petrobras, grande indutora dos investimentos, “está com o pé no freio, porque não tem caixa”. “Isso afeta muito sua capacidade de ativar a cadeia produtiva do petróleo que poderia ser um forte indutor dos investimentos.”
O pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), Gabriel Leal de Barros, entende que em ano de eleição é natural que os agentes estejam mais cautelosos pela incerteza sobre o que pode ocorrer no futuro, por isso a preferência por segurar decisões de investimento até obterem algumas respostas para suas expectativas. “Se o governo atual continuar, vai aprofundar as políticas econômicas que estão em vigor? Ou, se continuar, vai destravar outras agendas para a melhora do crescimento econômico?”, destacou.
“A deterioração de alguns dados econômicos foi bastante rápida”, diz Leal de Barros. “O país piorou bastante. Do início do ano até agora, as revisões dos agentes [no boletim Focus] têm sido feitas sistematicamente para baixo em relação ao crescimento, e sobre a inflação as revisões têm sido para cima.”