A suinocultura é uma atividade que sempre esteve presente dentro das propriedades brasileiras, há muitos anos. Inicialmente, como uma atividade de subsistência, o principal ativo comercial do suíno era a banha e, por isso, era chamado de “porco banha”. De Norte a Sul, o Brasil usava exclusivamente banha de porco para cozinhar.
Em meados dos anos 50, com a introdução da gordura vegetal no mercado, a suinocultura mudou o foco: veio o melhoramento genético e a busca de crescimento na atividade, com o objetivo de tornar a criação de suínos uma atividade rentável. Considero este um dos maiores desafios já enfrentados pela suinocultura brasileira: o de transformar o “porco banha” em “porco carne”.
Para enfrentar essa nova realidade da competição com os óleos vegetais, os produtores precisaram importar matrizes e reprodutores destinados a propiciar animais com maior percentual de carne do que gordura. Esta foi a primeira missão da Associação Brasileira dos Criadores de Suínos (ABCS): articular a importação dessas matrizes, oriundas da Alemanha, Argentina e dos Estados Unidos. A entidade foi fundada por 48 suinocultores em 1955, no município gaúcho de Estrela.
A evolução na suinocultura deu-se ano a ano através de intenso trabalho. Nos anos 80, empresas de outros países, com avanço genético muito superior às brasileiras, começaram a ver o Brasil como uma oportunidade e transformaram esse trabalho de melhoramento genético também em negócio em nosso país. Também houve a necessidade da indústria brasileira em buscar o desenvolvimento voltado para a produção de carne: mais carne, menos gordura.
A partir da década de 90, o trabalho de melhoramento genético começou a aperfeiçoar-se ainda mais. Esta evolução, muito significativa e rápida, veio para tornar a suinocultura uma atividade rentável ao criador de suínos. Uma evolução importante e necessária para atender a demanda dos consumidores, que cada vez mais pedia uma proteína animal com menores índices de gordura, menos colesterol, enfim, mais saudável.
Também neste período a suinocultura já visualizava a inserção no mercado internacional. Em torno do ano 2000, o Brasil passou a ser um importante exportador da proteína e, a partir de 2002, entrou definitivamente no mercado mundial de carne suína. Hoje, o país é o quarto maior produtor e quarto maior exportador mundial de carne suína e o Rio Grande do Sul classifica-se como segundo maior produtor e segundo maior exportador entre os Estados brasileiros, ficando atrás apenas de Santa Catarina. A suinocultura brasileira está, sim, entre as principais suinocultura do mundo.
Outro fator que vale ressaltar é a concentração da produção ao decorrer dos anos. Com a mudança e melhoria dos padrões de qualidade no que se refere à criação de suínos, os produtores precisaram se adaptar. Com isso, muitos desistiram da atividade suinícola. Alguns não tiveram condições de continuar na atividade e outros, simplesmente, não quiseram realizar todo um processo de melhorias, enfim, não avistaram vantagens nessa mudança. Também foi necessário alinhar a atividade suinícola às normas ambientais, sem exceções. A suinocultura está inserida no Conselho Nacional do Meio Ambiente como uma atividade licenciável e, desde 2005, a Associação de Criadores de Suínos do Rio Grande do Sul (ACSURS) dispõe um trabalho de assessoria técnica na área ambiental juntos aos associados.
O número de suinocultores, que nas décadas de 80 e 90 girava em 70 mil, hoje é de 9 mil no Estado do Rio Grande do Sul. Uma importante mudança no que diz respeito ao aspecto social, bastante impactante no cenário gaúcho.
Com isso, também deu-se a profissionalização desses criadores, que tiveram que qualificar sua produção para tornar a atividade suinícola economicamente rentável. A partir dessa década, começou-se a trabalhar com o sistema de integração: cada frigorífico contava com produtores próprios que, através de contratos, deveriam garantir o abastecimento diário das plantas industriais. Todos os produtores mantinham em sua propriedade o ciclo completo de produção, que contempla desde o nascimento até a engorda dos animais. Com o aperfeiçoamento do sistema de integração, em 2000, a suinocultor contou com uma nova mudança na produção, com a opção do suinocultor em trabalhar com o ciclo completo de produção ou apenas uma parte do processo, fazendo com que o criador trabalhasse ainda mais focado em sua produção, oferecendo maior qualidade ao produto, que é a carne suína.
Hoje, a suinocultura brasileira caracteriza-se como sendo 90% de produção integrada. Com isso, busca-se a regulamentação do Sistema de Integração através do Projeto de Lei 330/2011, da senadora Ana Amélia Lemos, que estabelece direitos e deveres para produtores rurais e agroindústrias em contratos de parceria de produção integrada. Aprovado em dezembro do ano passado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal, agora a proposta segue para análise da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA), onde será votada em decisão terminativa. Este será um marco para a suinocultura, pois fazer valer esta “Lei da Integração” está sendo um desafio trabalhado diariamente pelas entidades que atuam em defesa do suinocultor.
Também desafio – atualmente o maior deles – é conquistar e manter novos mercados, tanto o externo quanto o interno. No Brasil, o consumo de carne suína por pessoa é de 15 quilos ao ano, enquanto que na Europa a média passa dos 40 quilos. O consumo da carne suína ainda é cercado de muitos mitos, tabus e preconceito. No Rio Grande do Sul, a ACSURS trabalha em parceria com a ABCS, através do Programa Nacional de Desenvolvimento da Suinocultura (PNDS), com o objetivo de aumentar o consumo da proteína em ações que são desenvolvidas em todo o País.
Quanto ao mercado externo, como citado anteriormente, nos últimos 12 anos o Brasil participa com uma quantidade média de 550 mil toneladas ao ano em exportação. O mercado externo é um desafio e o Brasil conta com uma fatia desse mercado, no entanto, ele precisa ser cuidado diariamente, pois muitos outros países também buscam o mesmo. Temos exigências a serem cumpridas, mesmo sabendo que hoje a suinocultura brasileira e gaúcha atende aos requisitos que a suinocultura europeia e americana tem; não perdemos em nada no que diz respeito a qualidade e genética, nutrição e sanidade, entre outros aspectos, porém, o desafio é muito maior.
Entre conquistas e desafios, do “porco banha” ao título de quarto maior produtor e quarto maior exportador de carne suína, ainda há muito a ser feito. A suinocultura brasileira – e a gaúcha – tem esse potencial. Precisamos transformá-la em uma atividade rentável, com lucros ao suinocultor.
Valdecir Folador, presidente da ACSURS.