A agropecuária é a principal atividade econômica de Ivaí, nos Campos Gerais, com cerca de 14 mil habitantes. Há cerca de dois anos, o cultivo sem agrotóxico aportou na região e duas propriedades já conquistaram a certificação para produzir olerícolas orgânicas. Os produtores estão otimistas, não só por se livrarem do contato com os defensivos, como também por conquistar novos mercados.
O cultivo orgânico em Ivaí começou antes da pandemia, quando Raphael Branco de Araújo, engenheiro agrônomo do IDR-Paraná, organizou um treino-visita para que produtores do município conhecessem o cultivo de tomate sem agrotóxico. “Procuramos encontrar pessoas que estivessem abertas a essa tecnologia e apresentamos a elas algumas tecnologias como o SPDH (o Sistema de Plantio Direto de Hortaliças)”, explicou. Em 2020 ele começou o trabalho mais direto em duas propriedades com o objetivo de obter a certificação.
Ricardo Marques, morador na comunidade Faxinal do Tanque, foi um dos agricultores escolhidos para esse trabalho pioneiro em Ivaí. Até dois anos atrás a principal fonte de renda da propriedade era o cultivo de fumo. Mas a descoberta de um câncer do tipo linfoma levou o produtor a procurar uma alternativa. Por recomendação médica, Marques teve que se afastar do contato com agrotóxicos e buscar uma alimentação mais saudável.
O produtor passou então a lidar com a produção de leite e a cultivar algumas hortaliças, sem qualquer produto químico, para o consumo próprio. Ocasionalmente o que sobrava da horta era vendido na vizinhança. Marques participou do treino-visita sobre tomate orgânico promovido pelo IDR-Paraná há dois anos. De imediato ele se identificou com o plantio agroecológico e decidiu plantar tomate. Mais do que isso, resolveu pegar o caminho da transição agroecológica e buscar a certificação para a produção orgânica de olerícola e para isso contou com a assistência técnica.
“O maior problema da propriedade do Ricardo era o solo muito compactado, resultado de 15 anos de exploração da fumicultura”, explicou o extensionista Raphael Araújo, que acompanhou o trabalho na propriedade. Segundo ele, a solução foi implantar o Sistema de Plantio Direto de Hortaliças (SPDH) que aumenta a quantidade de matéria orgânica no solo.
“Também introduzimos a adubação verde. O trigo mourisco, a ervilhaca, aveias e centeio são plantas que deixam o solo mais estruturado e diminuem a compactação. O Ricardo ainda parou de revolver o solo para o plantio”, acrescentou.
Além de melhorar as condições do solo, Araújo indicou ao agricultor o uso de produtos homeopáticos nos cultivos. Segundo o servidor, eles evitam doenças foliares e diminuem os efeitos das geadas sobre as plantas. Marques também recebeu sementes do milho IPR 164 e deixou de cultivar variedades transgênicas. “Isso aumentou a soberania do produtor. Ele deixou de depender da semente de uma só empresa”, ressaltou Araújo.
Atualmente, Marques cultiva um hectare com diversas olerícolas. “Para controlar as pragas e doenças usamos óleo de Neem, as caldas e os bacilos”, explicou o produtor. A produção é vendida para programas oficiais, supermercados da cidade ou diretamente para os consumidores em sacolas semanais. Em outubro do ano passado o produtor chegou a entregar 350 sacolas. Como o processo de certificação foi feito pelo Tecpar, com a orientação dos extensionistas do IDR-Paraná, o produtor não teve qualquer custo com o processo.
O trabalho da extensão rural também contribuiu para mudar as condições de vida da família de Marques. Um sistema de saneamento básico foi instalado na residência e a água passou a ser clorada, já que anteriormente estava contaminada. A propriedade também passou a contar com uma unidade demonstrativa de mandioca, com o plantio de seis variedades diferentes. A área serve de modelo para outros produtores interessados em materiais produtivos e mais adaptados à região.
Para Marques, com a certificação a produção dele chega ao mercado com um diferencial. “A grande vantagem é ter um produto bom para quem produz e para quem consome. É uma hortaliça de mais qualidade, tem gosto diferente e está livre de veneno”, afirmou o agricultor. Agora, todo o esforço do produtor é reconhecido oficialmente pela certificação.
PREFERÊNCIA – A história de Danieli Komety Ossowski não é muito diferente. Ela também lidava com fumo e há quatro anos descobriu um câncer. “Tive que me afastar dos agrotóxicos. Como tinha frangos passei a usar o esterco das aves para adubar a horta onde plantava hortaliças para o consumo próprio”, contou a produtora. Depois de conhecer a produção orgânica de tomate, Danieli percebeu que era possível produzir sem os insumos químicos.
Ela buscou assistência técnica no IDR-Paraná e estendeu a prática orgânica a toda a sua propriedade, tendo em vista a certificação da produção de olerícolas. Com a orientação do IDR-Paraná, seguiu todos os passos para produzir sem agrotóxicos. Cuidou do solo, da água e do entorno do cultivo de olerícolas.
Atualmente, Danieli e o marido, Edecleto, produzem de 100 a 150 pés de alface por semana e há três meses eles já podem se orgulhar de terem conquistado a certificação. “A produção orgânica significou mais qualidade de vida para mim e para os clientes. Trabalho no Mercado do Produtor e antes da certificação sempre tinha quem perguntava se os produtos eram orgânicos mesmo, se não tinha veneno. Agora, temos a comprovação. O cliente sabe como é produzida a hortaliça que ele compra”, disse Danieli.
Por enquanto a produtora não recebe mais pela produção sem agrotóxico no mercado local, mas ela já nota que os produtos orgânicos têm a preferência dos consumidores. “Na feira pode ter outro produto ao lado. O meu, como é orgânico e certificado, vende melhor”, contou. Ela lembrou que foi importante contar com o apoio do IDR-Paraná para conseguir a certificação. “O Raphael esteve sempre por perto para dar toda a orientação. Sempre fomos bem atendidos. Ele tirava todas as nossas dúvidas”.
PROGRAMAS OFICIAIS – Como são produtores orgânicos, Danieli e Marques têm prioridade na venda da produção para programas oficiais como o PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar) e o PAA (Programa de Aquisição de Alimentos). Nessas vendas eles conseguem um adicional de 30% no preço por serem orgânicos. Além disso, ainda vendem para supermercados e outros estabelecimentos do mercado local.
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As duas primeiras certificações conquistadas por agricultores familiares de Ivaí têm um grande significado. Para o extensionista, Raphael de Araújo, Danieli e Marques são exemplos. “A conquista dos dois é um grande incentivo para os produtores da região. Outros dez agricultores já têm potencial imediato de certificação. Temos ainda muito mercado para essa produção”, observou.
Para ele, a produção orgânica está apenas engatinhando em Ivaí e pode ter um futuro promissor, à medida em que os consumidores demandem e valorizem alimentos mais saudáveis.