A CVM (Comissão de Valores Mobiliários) deu os primeiros passos para exigir dados climáticos das empresas de capital aberto. Audiência pública tratou sobre o tema em 2021 e resultou numa resolução que prevê mudanças em 2023, mas ainda é difícil delimitar a padronização de informações a serem fornecidas ao mercado.
A autarquia segue o caminho dos Estados Unidos. A SEC (Securities and Exchange Commission), a CVM dos EUA, disse que passará a exigir informações detalhadas sobre poluição por gases e de efeito estufa. O tema está sendo discutido em audiência pública no país norte-americano. Eis a íntegra do comunicado (95 KB, em inglês).
O anúncio foi feito em 21 de março. A SEC disse que empresas divulgariam as emissões diretas (escopo 1) e indiretas (escopo 2) de gases. Também haveria a publicação de emissões feitas pelos fornecedores e parceiros (escopo 3).
O tema avançou primeiramente na União Europeia, que ainda não tem uma padronização de informações climáticas pré-estabelecida. No Brasil, a CVM ainda não exige detalhamento de informações ESG (ambientais, sociais e de governança, na sigla em inglês). Reconhece que a agenda vem ganhando cada vez mais destaque no mercado de capitais, e que é importante o avanço no Brasil para que as empresas brasileiras fiquem mais competitivas.
Por enquanto, a comissão disse que “incentiva” a transparência dessas informações. A legislação, porém, ainda não estabelece quais os dados devem publicados.
RESOLUÇÃO DA CVM
No fim de 2021, a CVM editou uma resolução para iniciar a discussão do tema. Uma audiência pública foi feita para estabelecer novos parâmetros para a divulgação. Institutos de livre mercado avaliam que as exigências precisam de avaliação para verificar se haverá aumento direto de custos e potenciais distorções de incentivos econômicos e sociais.
Há um receio de que os critérios estabelecidos possam interferir ou incentivar a escolha “discriminatória entre produtos disponíveis no mercado” por parte dos investidores, segundo parecer da audiência pública.
A CVM disse que optou por “não expandir ou pormenorizar exigências relacionadas a informações ASG”.
“Sem deixar de reconhecer a importância de temas […], ou de recomendar que emissores voluntariamente atentem às preocupações levantadas, a CVM optou por, no momento, não expandir ou pormenorizar exigências relacionadas a informações ESG”, disse o relatório.
Outra iniciativa foi a realização de um estudo para avaliar quais seriam as possíveis melhorias na transparência de tais informações aos investidores. Foi feito pela ASA/CVM (Assessoria de Análise Econômica e Gestão de Riscos).
A pesquisa também avalia como o tema influencia na decisão de escolha de investimentos. As respostas recebidas servirão de base para a adoção de novas políticas. A assessoria de imprensa da CVM disse, porém, que ainda não há data prevista para publicação.
Leia a resolução da CVM, que vale para 2023:
Em relação à versão que recebeu comentários do público, as principais mudanças foram: Inclusão de novas informações sobre aspectos ASG, em especial no que diz respeito a questões climáticas, em formato “pratique-ou-explique”. Esclarecimentos adicionais sobre a prestação de informações a respeito da diversidade do corpo de administradores e empregados e previsão da abertura de informações por nível hierárquico, no caso dos empregados.
TENDÊNCIA INTERNACIONAL
As empresas globais com acesso ao capital de investidores são pressionadas com o movimento de exigência de dados climáticos desde a COP26. Há cada vez mais companhias que estão empenhadas em zerar a emissão de carbono e criando metas para os próximos anos.
Os reguladores do mercado, entre eles a CVM, ainda estão acompanhando o desenvolvimento e adaptação dessas informações para a criação de um patrão de dados no mercado que seja auditável.
Os processos da SEC e da CVM seguem as recomendações da TCFG (Task Force on Climate Related Financial Disclosures) criada no setor financeiro para aumentar a atenção aos riscos climáticos.
Annelise Vendramini, coordenadora do Programa de Finanças Sustentáveis do Centro de Estudos em Sustentabilidade da FGV (Fundação Getulio Vargas), disse que o principal objetivo é relatar postura que a empresa tem sobre assuntos ESG. “Não é apenas uma questão de relatar inventários de gases de efeito estufa, mas contar a governança que tem sobre assunto na empresa”, disse.
Segundo a analista, o padrão de informações e a exigência global ainda devem demorar para serem concretizadas. Mas o movimento de consciência ESG começou a mais tempo. “As empresas estão sentindo essa pressão muito antes do regulador demandar. É um movimento de mercado que vem recrudescendo e se tornando cada vez mais importante. As empresas que já estão expostas a mercados internacionais já estão de alguma forma lidando com essa demanda”, disse. Annelise afirmou que a tendência de informações ESG ainda é “confusa”. A União Europeia está empenhada há mais tempo e ainda encontra dificuldades para definir demandas e regulações.
“O Brasil não está pior do que ninguém. Está todo o mundo no mesmo passo no sentido de entender os custos e benefícios dessas medidas. Não existe uma padronização aceita por todos e pacificada sobre que informações devem ser relatados, como são com as informações contábeis”, disse a coordenadora da FGV.
A CVM disse que as informações ESG devem começar a ser publicadas pelas empresas em 2023 e que, por isso, devem se preparar já neste ano.