“Não espero grande coisa porque acho que a correlação de forças é adversa e o processo começou mal”, diz Rubens Ricupero. “Árvore que nasce torta, depois é difícil de corrigir.” A previsão pessimista do ex-ministro do Meio Ambiente e da Fazenda do governo Itamar Franco está relacionada ao projeto do novo Código Florestal, na reta final de tramitação no Senado. “Agora vai ser um exercício de contenção de danos, de verificar quais as perdas e ver como corrigir.”
“O Brasil perde, seguramente”, prossegue Ricupero, se o novo Código Florestal continuar muito parecido ao projeto que foi votado na Câmara e que tinha o deputado Aldo Rebelo como relator. “A agricultura poderá ter que fazer muito esforço para não ter uma imagem muito negativa internacionalmente.” Commodities, lembra, são negócio volátil. Embora no momento, com a demanda chinesa, o setor não esteja tendo problemas, isso pode mudar e a situação ficar adversa. “Se no exterior existir a percepção que o Brasil destrói floresta para plantar soja ou carne, o futuro pode trazer problemas gravíssimos”. Continua: “agricultores irlandeses, franceses e americanos não vão deixar de usar esse argumento contra o Brasil. Isso é problema real, não é imaginário. Temos grandes competidores nessa área, não estamos sozinhos.”
No seu entendimento, “o que houve na Câmara foi um retrocesso em relação à legislação ambiental brasileira”. O embaixador Ricupero, hoje diretor da faculdade de Economia e Relações Internacionais da Faculdade Armando Álvares Penteado (FAAP) falou ontem na abertura do seminário “Código Florestal: Proteção Ambiental e Produção Agrícola” promovido pelo Valor. “O Código Florestal estava longe de ser ideal. Mas essa lei, ao invés de melhorias, acrescenta outros defeitos.” Ele não tem expectativas com o trâmite no Senado, depois do relatório do senador Luiz Henrique (PMDB-SC) -“que praticamente endossou o texto da Câmara”- e do próximo passo, o relatório do senador Jorge Viana (PT-AC) – “que provavelmente terá tentado tudo o que podia”, diz. “Mas em politica o que vigora é o que Stálin chamava de correlação de forças. E a correlação de forças é adversa a um avanço esclarecido nessa área, tanto na Câmara como no Senado. O que se pode conseguir agora é a partir de uma posição de fraqueza.”
Arnaldo Carneiro Filho, diretor de Programa da Secretaria de Desenvolvimento Sustentável (SAE), da Presidência da República tem avaliação similar sobre o projeto de lei que saiu da Câmara. “O Código de Aldo nos leva a perdas”, disse em sua palestra. “Nos coloca em uma sinuca de bico, onde temos que defender um Código que não nos servia mais.” A proposta que saiu da Câmara, analisa, “tem um olhar nostálgico e antigo da realidade agrária e florestal do Brasil”.
Ele diz acreditar em uma terceira via. A proposta deveria olhar o futuro e trabalhar para tornar a pecuária brasileira mais eficiente, diminuir a pressão nos remanescentes florestais, incluir a questão dos aquíferos e a perda da biodiversidade, a recuperação dos passivos e a prestação de serviços ambientais. “Temos que ter um código menos normativo e mais pró-ativo, em que o agricultor não seja mais o vilão da história e veja no código oportunidades de negócios”, defendeu. “Hoje a oportunidade do Brasil é a floresta.”
“O debate do Código não consegue avançar, ficou em uma discussão de punição”, constatou João Sampaio, ex-secretário da Agricultura de São Paulo. Ele diz que o debate deveria separar “o gigante do produtor rural”, lembrando que propriedades com 63 hectares são o padrão brasileiro. E citou o caso do rebanho paulista, que há dez anos tem 12 milhões de cabeças de gado em área que, no período, foi reduzida em 2 milhões de hectares. “Ganhamos eficiência. Há boas notícias acontecendo.”
Para Ana Cristina Barros, da TNC, uma ONG com 23 anos de Brasil, o fortalecimento do Cadastro Ambiental Rural (CAR) deveria ser o foco da discussão. “Assim é que se conhece o CPF do cidadão que mantém floresta e também aquele que a desmata.”