Há algo de fundamentalmente errado no sistema de preços que vigora no planeta. Os gases do efeito estufa não são precificados. No mundo todo, o sistema registra o custo monetário da produção de um quilowatt/hora de energia. Mas não calcula o custo em emissões de CO2 se a eletricidade for gerada, por exemplo, em uma usina termelétrica. Por isso, tem-se a percepção de que o kw/h produzido a partir da queima de carvão é muito mais barato que o kw/h obtido em uma usina de vento. Isso significa que o sistema de preços não capta parte do custo real da produção energética. “Se a humanidade quiser enfrentar o aquecimento global, certas coisas vão ter que ficar mais caras. Cruzar o Atlântico para ir à Europa uma vez resulta em mais emissão de carbono do que as de um indiano pobre por um ano”, afirma Eduardo Gianetti da Fonseca, economista do Insper.
Do mesmo modo, a emissão de gases pelo rebanho mundial de bovinos, suínos e aves supera a da frota de automóveis de todo o planeta – mas seu custo ambiental não é levado em conta na formação de preços dos alimentos à base de proteína animal. Para Gianetti, isso vai ter de ser corrigido. Consequentemente, carne e leite ficarão mais caros.
Isso não acontecerá voluntariamente, como mostram as primeiras experiências empresariais que apelam à sensibilidade do consumidor. Recentemente, a British Airways deu a seus clientes a opção de, na compra de passagens aéreas, adquirir créditos de carbono correspondentes à emissão de gases provocadas pela viagem. Resultado? Adesão próxima de zero. Ou seja, quando se resolver levar a sério o custo ambiental dos võos, o preço vai ter que subir na marra. “Se continuarmos no caminho atual [ignorando o custo ambiental do consumo] e houver alguns acidentes climáticos importantes, haverá medidas governamentais nesta direção”, afirma ele. Autoritarismo? “Não é muito diferente do imposto sobre cigarros e bebidas. Os cidadãos vão ter de entender que nem todo o custo dos bens e serviços que consomem está sendo computado.”
Gianetti prevê que o consumidor global vai mudar o mix de produtos que compra à medida que o sistema de preços for alterado. Bens e serviços com alto impacto ambiental tendem a tornar-se proibitivamente caros. Produtos pouco onerosos ambientalmente ficarão mais baratos. Muito embora não tenha conseguido citar exemplos do que deve baratear, Gianetti diz que as vantagens para o planeta seriam evidentes. Se, por exemplo, a economia incorporar no preço do do kw/h de energia o custo ambiental, a energia eólica pode se tornar a opção mais barata.
Para que isso aconteça, o que falta é a definição de uma fórmula para converter em valores monetários o custo das emissões de CO2. “O grande desafio agora é chegar ao preço do carbono”, afirma Gianetti.
Mais complicado é definir como cobrar pela preservação da natureza, assunto da maior relevância para o Brasil. O País tem na Floresta Amazônica um ativo ambiental que interessa ao mundo. Se existe mercado para a conservação, é possível firmar contratos de compra e venda deste ativo. Mas as questões subjacentes são espinhosas. Como será feito esse contrato? Quem vai fiscalizar a preservação? “Esta discussão toca no problema da soberania, que é uma caixa de pandora”, diz Gianetti. “Este é o grande nó a desatar”.