Para viabilizar o principal objetivo de longo prazo do Acordo de Paris, que é a contenção do aquecimento global em 1,5 grau Celsius até o final deste século acima dos níveis pré-industriais, o setor energético precisa fazer a transição para um sistema baseado em 100% de fontes renováveis. De acordo com um novo estudo, essa transição energética traz consigo oportunidades econômicas importantes para o setor, que devem motivar os esforços e direcionar os investimentos de maneira custo-eficientes nas próximas décadas.
Realizado pela universidade finlandesa LUT e pela rede de cientistas e parlamentares Energy Watch Group, o estudo Global Energy System based on 100% Renewable Energy faz uma modelagem científica que simula uma transição energética total nos setores elétrico, de aquecimento, transportes e dessalinização até 2050. Isso é realizado a partir de uma combinação ótima de tecnologias baseadas em fontes renováveis de energia, que ajuda a determinar o caminho de transição energética mais eficaz em termos de custos para fornecimento global de energia. O cenário global de transição energética é realizado em períodos de cinco anos, de 2015 a 2050. Os resultados são agregados em nove grandes regiões do mundo: Europa, Eurásia, Oriente Médio e Norte da África, África Subsaariana, Sul da Ásia, Nordeste da Ásia, Sudeste Asiático, América do Norte e América do Sul.
A partir de dados coletados e analisados ao longo de quase cinco anos de trabalho, a pesquisa aponta que a transição para 100% de energia renovável é economicamente competitiva com o atual sistema fóssil e nuclear, e poderia reduzir as emissões de gases de efeito estufa da geração de energia para zero antes mesmo de 2050.
“O relatório confirma que uma transição para 100% de energias renováveis é possível em todos os setores, e não é mais caro do que o atual sistema de energia”, disse Hans-Josef Fell, ex-membro do Parlamento Europeu e presidente do Energy Watch Group. “Isso mostra que o mundo inteiro pode e deve fazer a transição para um sistema energético de emissão zero. É por isso que todas as forças políticas ao redor do planeta devem fazer mais para proteger nosso clima”. Graças ao modelo desenvolvido e à base de dados extensa existente, é possível agora desenvolver mapas nacionais para a transição para 100% renováveis, montado precisamente para o contexto individual de cada país, acrescenta Fell.
“Os resultados do estudo mostram que todos os países podem e devem aumentar suas metas atuais dentro do Acordo de Paris”, aponta Christian Breyer, professor de economia solar na Universidade LUT. “Uma transição para 100% de energia renovável e limpa é bastante realista – mesmo hoje, com as tecnologias que temos a nossa disposição”.
O estudo conclui com recomendações políticas para uma rápida integração de tecnologias de energia renovável e emissões zero. Entre as medidas mais importantes sugeridas, estão a promoção de investimentos privados (idealmente incentivados com tarifas fixas), isenções fiscais e benefícios legais combinadas com a descontinuação simultânea dos subsídios para combustíveis fósseis. De acordo com o relatório, a transição para um sistema global baseado em 100% de renováveis pode ser atingida antes de 2050 se um framework robusto para políticas públicas for implementado.
“Este trabalho reafirma a posição da ciência de que uma transição para energias 100% renováveis em todo o mundo é possível”, aponta Mark Jacobson, professor da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos. “Além disso, ele mostra que é possível evitar um aquecimento acima de 1,5 grau Celsius a partir de emissões líquidas zero em 2050 sem a necessidade de tecnologias de captura de carbono ou energia nuclear”.
Confira abaixo alguns dos destaques do estudo:
· A transição para 100% de energia renovável requer eletrificação massiva em todos os setores energéticos. O total de geração de eletricidade seria de quatro a cinco vezes maior que a geração elétrica de 2015. Assim, o consumo de eletricidade em 2050 seria responsável por mais de 90% do consumo energético primário. Ao mesmo tempo, o consumo de fontes fósseis e nucleares de energia em todos os setores seria completamente extinto.
· A geração energética primária global em um sistema de 100% renováveis consistiria no seguinte mix de fontes energéticas: energia solar (69%), eólica (18%), hidroeletricidade (3%), bioenergia (6%) e energia geotérmica (2%).
· Até 2050, a energia eólica e solar corresponderia a 96% do total de energia ofertada de fontes energéticas renováveis. As fontes renováveis são produzidas de maneira quase exclusiva de geração local e regional descentralizada.
· A transição de todos os setores reduziria as emissões anuais de gases de efeito estufa do setor energético continuamente de quase 30 GtCO2eq (giga tonelada de dióxido de carbono equivalente) em 2015 para zero em 2050.
· Um sistema 100% de eletricidade renovável poderia empregar 35 milhões de pessoas em todo o mundo. Quase nove milhões de empregos no setor global de carvão deixariam de existir até 2050. Isso será sobrecompensado por mais de 15 milhões de novos empregos no setor de energia renovável
O relatório está disponível aqui.