Redação (28/07/06)- A oferta hostil da Sadia pela Perdigão marcou o início de um processo de alteração societária no mercado de carnes, frangos, suínos e alimentos congelados que deverá se consolidar até o fim do ano. A previsão é de autoridades de defesa da concorrência do governo brasileiro, que acreditam que a negativa da Perdigão aos R$ 3,88 bilhões por fim propostos pela Sadia não marcou o fim das negociações no segmento. Pelo contrário. Para as fontes, agora as empresas do mercado de alimentos congelados vão se movimentar em direção a reorganizações societárias. Novas fusões e aquisições deverão acontecer até dezembro próximo.
Essa movimentação terá efeito direto sobre o Cade e as secretarias de Direito e de Acompanhamento Econômico dos ministérios da Justiça e da Fazenda (SDE e Seae) – órgãos responsáveis pelo julgamento de fusões e aquisições no Brasil. Daí o acompanhamento minucioso das autoridades sobre os passos que estão sendo dados pelas empresas. “A oferta hostil acendeu um sinal amarelo no Sistema de Defesa da Concorrência”, comentou um integrante do Cade. Para ele, uma nova proposta de compra da Perdigão não deve ocorrer nas próximas semanas porque as ações da empresa subiram na Bolsa – e como as ofertas são baseadas nessas ações, a alta faz com que possíveis compradores recuem. Mas seis meses é o prazo considerado por técnicos dos órgão antitruste do governo para que uma nova oferta pela companhia apareça.
No mercado, as ações de Sadia e Perdigão voltaram a registrar forte valorização na Bovespa ontem (dia 27), pela desconfiança de que ambas ainda podem estar negociando. O “diagnóstico” foi negado pelas empresas, mas Perdigão ON subiu 3,88% e Sadia PN, 5,90% – as maiores variações positivas do Ibovespa.
Acostumados a analisar grandes negócios, técnicos do Cade, da Seae e da SDE acreditam que a oferta hostil feita pela Sadia jogou sinalizações importantíssimas no mercado. Em primeiro lugar, que a Perdigão estaria apta a ser vendida. No exterior, quando uma oferta hostil é realizada, normalmente os acionistas da empresa vítima da proposta (no caso, a Perdigão) passam a imaginar se a gerência da empresa não seria capaz de obter mais lucros em seus negócios. Eles olham, de um lado, a oferta do concorrente, e de outro os lucros da companhia. Essa comparação é crucial, segundo disse ao Valor um técnico graduado em fusões e aquisições do Ministério da Justiça.
Em segundo lugar, surge a hipótese de uma terceira empresa adquirir aquela que foi vítima da oferta hostil. Como já foi oferecido um valor pela Perdigão e os acionistas não aceitaram, o mercado passa a precificar qual seria o valor correto. Com medo de perder para a concorrente (no caso, a Sadia) outras empresas do setor, do Brasil ou do exterior, aceleram estudos para adquirir a companhia vítima da oferta hostil. Esses estudos envolvem elevar um pouco a oferta e oferecer novas condições para agradar os acionistas.
A terceira hipótese é a empresa vítima da oferta hostil reagir – seja por pressão dos acionistas ou pela necessidade de seus gerentes em responder à proposta – e adquirir outras empresas. “Os controladores da Perdigão devem estar se movimentando, ainda mais os fundos de pensão”, comentou um conselheiro do Cade. No caso de conseguir realizar novas aquisições, a empresa, antes vítima, mostra-se mais firme no mercado, dá uma resposta aqueles que não acreditavam em sua gerência e aumenta o preço de suas ações. Se não conseguir, terá de apresentar resultados melhores para não ser adquirida num futuro próximo.
As três hipóteses levam à alterações concorrenciais nos mercados de atuação de Sadia e Perdigão, e por isso estão sendo analisadas com atenção pelas autoridades. “Algo vai acontecer, nem que seja uma nova parceria da Perdigão”, comentou um técnico do Ministério da Fazenda. “Já começamos a olhar mais atentamente para os mercados de alimentos congelados”, afirmou.
A maior preocupação das autoridades com as eventuais fusões e aquisições que podem envolver Sadia e Perdigão está no mercado de pratos prontos. Juntas, ambas têm 64,5% do mercado de presunto, 60% das pizzas congeladas e 92,4% das tortas congeladas salgadas. Estas concentrações são consideradas muito altas. Seria como a cobertura de chocolate no caso Nestlé-Garoto, explicou um técnico, lembrando que as duas empresas tinham quase 100% deste mercado e não havia alternativas contra a imposição de restrições àquela fusão neste ponto. Logo após a oferta hostil, a Sadia apresentou números menores de concentração. No mercado de frango, a Sadia teria 12,2% e a Perdigão, 11,3%. Em suínos, a Sadia estaria com 14,2%, e a Perdigão com 11,3%. Mas nos dois as empresas, juntas, superam o percentual mínimo definido pela Lei de Defesa da Concorrência (n 8.884) para a análise de fusões e aquisições: 20%