O esforço da China para saciar o crescente apetite da classe média no país está causando um salto abrupto na demanda de milho, o que tem vastas repercussões no cinturão agrícola dos Estados Unidos e pode mexer com fluxos de comércio do grão no mundo todo.
O apetite chinês pelo milho — que é a base para adoçantes, amido e álcool, bem como ração para animais — esteve em plena vista em julho, quando o país comprou de uma tacada 21 milhões de bushels (um bushel equivale a 25,40 quilos) de milho nos EUA, mais do que o governo americano achava que compraria em um ano. O pedido surpreendeu o mercado — e bem quando a intensa onda de calor em julho derrubava a safra no meio-oeste americano. A China comprou outros 2,2 milhões de bushels de milho americano no começo deste mês.
A cotação do milho, que quase dobrou no último ano, subiu mais 1% na terça. O contrato futuro de milho para entrega em dezembro na Bolsa de Chicago subiu US$ 0,075, para US$ 7,275 o bushel.
A influência da China na demanda de milho mostra como a economia do país, que cresce a ritmo acelerado, vem reconfigurando o comércio mundial. A nação, com uma população de 1,3 bilhão de pessoas e que não para de crescer, tem sido um ator de peso em mercados de commodities nos últimos anos.
A China já compra cerca de 25% de toda a soja americana. Mas o súbito apetite de milho pegou muitos desprevenidos. A China, que por 15 anos — até o ano passado — não foi um importador líquido de milho, tem ela própria uma vasta produção do grão e por muitos anos lutou para ser autossuficiente. E, já que a China não revela os níveis de commodities mantidos em reservas estratégicas, resta ao mercado tentar adivinhar quanto mais o país precisará comprar.
Muitos atribuem a demanda maior do que a esperada à crescente classe média chinesa, cujos hábitos estão mudando mais depressa do que previsto. À medida que enriquece, por exemplo, o chinês está comendo mais carne de porco. E o governo chinês pressiona produtores de suínos a adotar métodos ocidentais de criação, o que inclui aumentar o milho na ração. Além disso, o consumidor também quer sucos e outros produtos com adoçantes a base de milho: a Coca-Cola Co. disse que o volume na China subiu 21% no segundo trimestre.
Ma Liangfeng, um engenheiro aposentado de 69 anos que vive em Xangai, diz que o sortimento atual de produtos nos supermercados seria “impensável” 30 anos atrás. Naquela época, um artigo básico como a carne de porco era reservado para ocasiões especiais.
Nos EUA, muitos corretores e economistas veem essas últimas operações como sinal de que as vendas pelos EUA vão crescer tão rápido que de cinco a dez anos a China poderia ser o maior país comprador de milho americano, destronando o Japão, que comprou cerca de 610 milhões de bushels de milho dos EUA no ano passado. “Para nós, é o ponto de inflexão”, diz Brian Schouvieller, executivo de comercialização de grãos na CHS Inc., maior cooperativa controlada por produtores nos EUA. “Acreditamos que, a partir de agora, a China passará a comprar sempre”.
Verdade seja dita, executivos no mundo ocidental se equivocaram antes sobre o apetite chinês por milho estrangeiro. O aumento súbito de pedidos da China em meados da década de 1990 gerou a expectativa de uma explosão no comércio para agricultores americanos. Mas foi só um surto.
Na província oriental de Zhejiang, o produtor Qian Fanghua tem hoje 2.000 suínos; quatro anos atrás, eram menos de 200 animais. Para alimentá-los, é preciso cerca de 4 toneladas de ração a base de milho por dia. Sua crescente produção, e outras espalhadas pelo país, é uma das razões para a cotação interna do milho ter subido tanto — a ponto de fazer o milho americano parecer barato.