Depois de ter sido o ator principal da forte quebra nas safras de grãos, fibras e cana-de-açúcar – e do recuo do PIB agropecuário nos primeiros meses do ano -, o clima deverá voltar à cena com surpresas para a agricultura brasileira.
O fenômeno climático que trouxe a catastrófica estiagem do verão (La Niña, esfriamento das águas do Oceano Pacífico) está perdendo espaço para o fenômeno oposto (El Niño), que será agora responsável por antecipar em quase em mês a estação de chuvas. Se confirmadas, as precipitações fora de época trarão problemas para cana e café, mas benefícios para o plantio de soja.
Neste momento, explica Eduardo Gonçalves, da Somar Meteorologia, o clima está na transição do La Niña para o El Niño (aquecimento das águas do Pacífico). Por isso as instabilidades em curso, como as chuvas atípicas do mês de junho. No mês passado, na maior parte do país choveu mais de duas vezes a média esperada. Isso por causa do aquecimento das águas da costa do Sudeste para níveis 1,5 graus Celsius acima do normal.
O café e a cana-de-açúcar foram as culturas mais afetadas pelas chuvas do mês passado. O café, em fase de colheita, teve sua qualidade afetada em regiões importantes, como o sul de Minas Gerais, sobretudo os cafés finos. Uma antecipação da estação de chuvas para o início de setembro deve ainda atrapalhar o fim da colheita do grão.
A cana no Centro-Sul do país atrofiou com a estiagem do primeiro trimestre, e as usinas tiveram que reduzir em 40 milhões de toneladas suas expectativas de moagem, para 509 milhões de toneladas. Em seguida, postergaram o início da moagem na esperança de que a cana se desenvolvesse um pouco mais. No entanto, em meados de maio e em junho as chuvas fora de época interromperam a colheita e reduziram a qualidade da cana. Somente em Piracicaba (SP), um importante polo canavieiro, choveu 198 milímetros (mm) no mês de junho, quando a média é de 47 mm, afirma a Somar.
Dias perdidos de moagem geralmente são recuperados com a postergação do fim da safra. No entanto, se de fato a estação de chuvas se antecipar, as usinas podem não conseguir moer tudo o que previam e terão que deixar cana em pé para processar em 2013.
Mas as chuvas prematuras não trarão apenas malefícios. Principalmente para as culturas de grãos e fibras, espera-se bons efeitos. Se trouxer solos mais úmidos no começo de setembro como promete o El Niño, as precipitações ajudarão no plantio de soja das variedades de soja superprecoces no maior Estado produtor da oleaginosa do país: Mato Grosso. O Estado planta o grão a partir de 15 de setembro para colhê-lo em janeiro e, em seguida, plantar a segunda safra de milho ou algodão.
Assim, é preciso que o plantio de soja ocorra no tempo certo para não aumentar o risco climático do milho e algodão da segunda safra. Até lá, no curtíssimo prazo, as culturas em fase de colheita – cana, laranja e café – terão algum alento, pois até agosto, a previsão é de clima seco.
Na safra 2011/12, o Nordeste e o Sul do país foram as regiões mais afetadas pela estiagem. Segundo levantamento da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) as culturas de feijão e de milho tiveram perdas de 80% no semiárido nordestino. O algodão também sofreu, sobretudo na Bahia, segundo maior produtor nacional. A redução da produtividade da pluma atingiu 17% em consequência da pior seca das últimas décadas.
No Sul do país, a seca provocou perdas de 43,8% na soja gaúcha e de 29% nas lavouras do grão no Paraná. Os campos de soja de Mato Grosso do Sul também perderam 10,5% em produtividade.