Redação (10/11/2008)- Os estoques mundiais apertados e a demanda chinesa por alimentos devem sustentar os embarques do complexo soja em 2009, principal item nas exportações do agronegócio brasileiro. Os representantes dos produtores acreditam que a falta de crédito para ACC (Adiantamento sobre Contrato de Crédito), instrumento utilizado para financiar as exportações, pode impactar diretamente a safra brasileira com a redução dos recursos antecipados ao produtor. As indústrias, por sua vez, acreditam que as vendas devem fluir com mais lentidão em virtude da restrição de recursos, mas sem grande impacto na demanda.
O algodão pode ser a cultura mais atingida pela restrição ao ACC e pelo alto custo dos empréstimos. As cotações da commodity recuaram 35% desde setembro, período que antecede o agravamento da crise mundial. Analistas afirmam que os consumidores cortam em primeiro lugar os gastos com produtos derivados da fibra. Segundo fontes do setor, a valorização do dólar encarece o custo dos embarques da pluma, que podem ficar no mercado interno e pressionar os preços. Benedito Oliveira, da consultoria AgRural, diz que será difícil embarcar o resto da mercadoria neste ano. "O prognóstico para 2009 é ainda mais incerto", avalia. Segundo a Secretaria de Comércio Exterior (Secex), até setembro, foram embarcadas 295 mil toneladas de pluma, de um total de 450 mil toneladas calculados para 2008.
Conforme os dados do Banco do Brasil, principal financiador do agronegócio brasileiro, no último mês, o ritmo de liberação ficou estável. Foram liberados US$ 250 milhões em recursos para ACC, queda de 0,1% em relação á 2007, quando US$ 252,3 milhões foram consumidos. No acumulado do ano, o montante atinge US$ 3,7 bilhões.
"Os produtos para alimentação não tem a mesma reação à crise que os bens duráveis. A alimentação é a última coisa que as pessoas reduzem", explica Fábio Trigueirinho, secretário geral da Associação Brasileira da Indústria de Óleo Vegetal (Abiove). Conforme a associação, as exportações do grão e dos derivados devem ter leve alta em 2009. O embarque de grão será de 33 milhões de toneladas, seguido por farelo (13,3 milhões de toneladas) e óleo (2,1 milhões de toneladas). Apenas este último não deve apresentar crescimento.
Apesar de não ser considerado item importante na alimentação humana, o café não deverá ser prejudicado com a crise de crédito neste ano porque as vendas são feitas antecipadamente, avalia Sérgio Carvalhaes, do Escritório Carvalhaes. Ele revela que há uma normalização sensível nas linhas de crédito e acredita que só em caso de notícias negativas a situação pode mudar. Com relação ao consumo, não acredita em redução. "As vendas são fragmentadas em xícaras, o que não tem muito peso no bolso. O que pode acontecer é a migração de cafés especiais para outros de menor valor agregado". No mundo, a relação oferta e demanda são ajustadas em 125 milhões de sacas (60 quilos).
O diretor geral da Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec), Sérgio Mendes, acredita que a próxima safra será menor por causa dos problemas com crédito. Segundo informou, há uma semana ainda eram observados problemas para obter recursos de ACC. "O hedge (proteção) consumiu recursos das exportadoras, isso reduz o crédito ao produtor".
José Mario Schreiner, presidente da comissão de cereais fibras e oleaginosas da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA), vai mais além e afirma que a situação pode reduzir ainda mais a renda do produtor no próximo ano. Ele explica que, caso a situação do crédito não seja resolvida, pode sobrar grãos no mercado interno. "As empresas buscam recursos para estocar a mercadoria no início da safra, processar e exportar", afirma.
Marcos Matos, técnico de mercado da Organização das Cooperativas do Brasil (OCB), revela que 50% das exportações brasileiras são financiadas no exterior. "Precisamos que o governo crie uma linha específica para exportações de cooperativas, que representam o agricultor". Segundo informou, as vendas neste ano devem proporcionar receita de US$ 4 bilhões. "O volume deve cair um pouco porque o dólar desvalorizado prejudicou o fluxo", diz.
Schreiner diz que a próxima safra pode demandar maior intervenção do governo. "Por isso, precisamos reavaliar a política de preços mínimos para manter a remuneração num patamar adequado ao produtor. Torcemos para não usar, mas é preciso proteger o produtor".