As regiões leste e nordeste do Mato Grosso, em meio ao Vale do Araguaia, passam pela maior expansão agrícola do Brasil atual. O movimento se baseia no avanço da soja sobre pastagens degradadas, após décadas de pecuária extensiva. Com 3,1 milhões de hectares de latossolo (terra boa para a sojicultura), o território apresenta potencial para dobrar a produção do estado e consolidar o País como o segundo fornecedor mundial da commodity.
Nos últimos três anos, as plantações do grão mais do que duplicaram nos municípios da região nordeste, que é a maior área de pastagens do estado, onde se concentra a expansão. Foi de 445,5 mil hectares, em 2007, para os 953,8 mil hectares de hoje em dia. “Com os preços atuais de terras já consolidadas, a região se tornou ainda mais atrativa”, afirmou o gestor Daniel Latorraca, do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea).
Fatores como a escassez de infraestrutura para o abate de gado – há apenas três frigoríficos, todos do mesmo dono, para atender os pecuaristas locais – desestimularam a atividade de corte na região, segundo o especialista. Além disso, o esgotamento dos pastos gerou a necessidade por outras culturas, que inclusive ajudam a recuperar a pastagem e a manter a bovinocultura.
Para produtores envolvidos no processo de expansão, o que está havendo não é a derrocada da pecuária em nome da sojicultura, mas, o uso massivo de uma técnica desenvolvida há anos pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa): a integração das lavouras à pecuária.
“Acredito muito mais na integração lavoura-pecuária do que em deixar a pecuária para ir à agricultura, até porque é mais fácil o agricultor virar pecuarista do que o contrário”, disse o produtor Laércio Fassoni, que preside o Sindicato Rural de Água Boa, uma cidade encravada no Vale do Araguaia. “Com o advento do confinamento e o manejo adequado do pasto, é possível equilibrar as duas culturas”, explicou.
O próprio produtor é um exemplo dos que passaram a trabalhar simultaneamente com a soja e com o gado. “Estou entrando com força na soja, mas sem prejuízo da bovinocultura”, contou, sendo que cria, recria e engorda 6,5 mil cabeças de boi e dispõe de 500 hectares para plantar soja, com a produtividade média do estado (65 sacas por hectare).
“Os sojicultores tradicionais estão aumentando suas áreas com a compra de pastagens degradas”, relatou Fassoni. “Nós estamos plantando a nova fronteira agrícola do Brasil. Provavelmente, a maior dos próximos vinte anos”, acrescentou.
De origem paulista, o produtor chegou ao Mato Grosso no final dos anos ’70, quando o cerrado passava a ser explorado nos mesmos termos, como a grande fronteira agrícola do País.
Problema estratégico – De lá pra cá, os problemas com transporte e infraestrutura nunca foram resolvidos – talvez tenham até piorado, posto que a produção cresceu. Os produtores do Mato Grosso enfrentam altos custos, seja para importar insumos ou para exportar commodities. Para especialistas e agricultores, a nova fronteira agrícola depende de obras que solucionem esse histórico déficit logístico.
“Serão precisas obras de infraestrutura e logística para dar condições de desenvolvimento e viabilidade à região”, disse o presidente da Associação dos Produtores de Soja do Mato Grosso (Aprosoja-MT), Carlos Fávaro. “E as obras estão acontecendo”, garantiu ele.
Trata-se das Rodovias BR-80 e BR-158 e da Ferrovia de Integração do Centro-Oeste, projetos federais cujas conclusões estão previstas para daqui no máximo três anos. “Por enquanto, a soja sai do estado por Goiás, via rodovia, e uma barcaça vai por hidrovia”, disse Latorraca, do Imea.
“Se as obras acontecerem, a produção será viabilizada. Se não, o Brasil continuará patinando em sua falta de infraestrutura e logística”, observou Fávaro. “A depender disso, vamos consolidar o Brasil como o segundo maior produtor de soja do mundo, podendo chegar a primeiro”, disse.
O representante disse que é possível, em cinco anos, dobrar a produção estadual de soja, equiparando-se às regiões norte e médio-norte do Mato Grosso, onde hoje predomina a sojicultura. Haveria, então, dois polos da oleaginosa no estado, separados pela reserva ambiental do Xingu.
Meio ambiente – A respeito de eventuais ameaças ao meio ambiente, com a expansão da soja nos arredores do rio Araguaia, Fávaro declarou: “O Código Florestal não tem um parágrafo que permite a abertura de áreas. O documento está consolidando regras sobre áreas já abertas, e ainda exige compensação. Não se fala em abertura de terras, mas no melhor aproveitamento das já abertas”.