Até então desprezado por médios e grandes produtores de Mato Grosso, o maior celeiro nacional de grãos, o milho cultivado na safra de inverno passou a ser uma importante fonte de financiamento das lavouras de soja nos últimos dois ciclos.
Os produtores de Mato Grosso, líderes na “safrinha” de milho, à frente das tradicionais lavouras do Paraná, têm usado cada vez mais o milho como “moeda de troca” em tradings e revendas para antecipar as compras de insumos da safra principal de verão, plantada a partir de setembro. Cerca de 30% da área total ocupada com soja e algodão no verão já produz milho safrinha no inverno.
A produção de milho safrinha em Mato Grosso já significa mais de 40% da produção de segunda safra no Brasil. E há forte potencial de crescimento. “Com novas tecnologias, existe potencial para produzir em mais de 50% da área”, previu o superintendente do Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea), Seneri Paludo, durante a Bienal da Agricultura.
Até pouco tempo, boa parte dessas áreas era mantida em regime de pousio durante o inverno, sem nenhuma cobertura vegetal. Depois, os produtores passaram a usar o milho como solução agronômica para a rotação de culturas, o que ajudava a manter a qualidade dos solos e gerava excedentes para produzir ração animal. Mas a recente onda de migração de indústrias frigoríficas de aves e suínos para Mato Grosso começou a mudar o cenário para o milho.
Vastas áreas começaram a ser cultivadas, sobretudo na região de Lucas do Rio Verde, no médio norte do Estado, onde a soja é colhida bem cedo e o milho consegue driblar “veranicos” mais fortes. Hoje, o Estado consome mais de 2 milhões de toneladas de milho: 60% vão para granjas de aves e o restante serve criações de suínos.
A estratégia de apostar no milho deu certo. A área deu um salto movida por altos índices de produtividade, a melhor entre os maiores produtores. Em 2008/09, foram plantados 1,6 milhão de hectares e colhidas 7,1 milhões de toneladas. As lavouras renderam a média de 4,5 mil quilos por hectare – no Paraná, a média atingiu 3,1 mil quilos. Três ciclos atrás, a safrinha de Mato Grosso não chegava a 2,5 milhões de toneladas.
Dono de 2 mil hectares em Campo Novo do Parecis, o produtor Ricardo Arioli tem reforçado a aposta no milho como financiador da soja. Neste inverno, plantou 1,2 mil hectares do grão e conseguiu recordes de produtividade média no Estado. “Colhemos 7,2 toneladas por hectare que usamos para antecipar as compras de insumos”, diz.
Os altos níveis de produtividade também ajudaram na preservação ambiental do Estado. Nas últimas quatro safras de grãos, houve um aumento de apenas 4% na área plantada, mas a produção cresceu 21%. “A produtividade explica tudo”, diz Arioli.
Mas há quem discorde. O produtor Nelson Piccolli, de Sorriso, critica o movimento. “O milho tem que ter rentabilidade, não pode só servir para bancar o plantio da soja”. O diretor de Agronegócios do Banco do Brasil, José Carlos Vaz, pondera: “O produtor tem que fazer a conta do ano-safra, somando a soja no verão e o milho na safrinha. Se der lucro, está ótimo”.
E a situação deve seguir favorável para o milho safrinha no próximo ciclo. Mesmo com a superoferta registrada no último ciclo, que obrigou os produtores a estocar milho a céu aberto por falta de armazéns e ação do governo para subsidiar o escoamento da produção. O consultor André Pessôa, da Agroconsult, afirma que haverá demanda firme pelo milho safrinha em 2010. “A oferta será curta e os preços devem bons”, avalia.