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O risco do milho Bt para o Brasil: fundamentos, referências e questões aguardam respostas

<p>Confira artido do Sr. de Nagib Nassar - Professor titular de genética da Universidade de Brasília.</p>

Redação (06/03/07) – “A toxina Bt tem efeito fatal sobre predadores, causando o desequilíbrio nas populações de insetos e o surgimento de ataques de novos insetos, não nocivos anteriormente”

Nagib Nassar é professor titular de genética da Universidade de Brasília (http://www.geneconserve.pro.br). Artigo enviado pelo autor ao “JC e-mail”:

Aproveito o fato e a ocasião em que a comissão CNTBio estuda a possibilidade de liberar o cultivo do Milho Bt no Brasil para expor à respeitada comissão, as seguintes informações, que coletei de periódicos especializados e renomados:

1- O plantio de uma variedade transgênica Bt significa substituição da variedade local gerando várias conseqüências prejudiciais. Uma destas é a substituição da ampla base genética e diversidade da variedade local por uma faixa muito estreita geneticamente. Essa substituição conduz à vulnerabilidade às doenças e perda de genes úteis das variedades locais e indígenas. Em um país como o Brasil há grande heritage de cultivares indígenas, que contribuíram e contribuem no melhoramento do milho. Devemos considerar este aspecto quando se liberar a variedade de milho Bt. Na literatura mundial a diversidade genética dos conjuntos gênicos foi reduzida drasticamente pela introdução da monocultura (Telman et al., 2001).

2- O milho é uma cultura totalmente alogama com 100% de polinização cruzada, devido à sua estrutura reprodutiva dióica. Isto conduz a um fluxo gênico livre entre variedades transgênicas e variedades indígenas do Brasil. Os conjuntos gênicos indígenas serão altamente contaminados pelo gen Bt. Isto afeta tanto o processo evolutivo, como os ecossistemas, reduzindo a aptidão e sobrevivência dos cultivares indígenas (Steinbrecher, 1996; Marvier, 2001; Rissler and Mellon, 1996; Snow and Moren, 1999). O gene Bt também se transfere da variedade transgênica às ervas daninhas, através da hibridação, criando ervas monstros resistentes a insetos (Rissler and Mellon, 1996; Snow and Moren, 1999). O prejuízo da contaminação das variedades indígenas e locais se estende ainda à cultura de nosso país, onde essas variedades tradicionais fazem parte da vida diária, das tradições e da economia da massa pobre da população (Altieri, 2000).

3- Dizer que o uso desses transgênicos economiza o uso de inseticidas não é mais do que uma eminente falsidade. Seu uso apresenta uma redução de certos insetos, chamados catarpilar da lepidóptera, mas aumenta muito o ataque de outros insetos. No final de contas acaba-se usando a mesma quantidade de inseticidas (Krimsky and Wrubel, 1999). De fato esse transgênico não economiza a quantidade aplicada de inseticida, mas sim reduz as opções disponíveis para os agricultores que querem manejar o controle de insetos.

4- A toxina Bt tem efeito fatal sobre predadores, causando o desequilíbrio nas populações de insetos e o surgimento de ataques de novos insetos, não nocivos anteriormente. Há ainda o efeito da toxina sobre polinizadores úteis, como abelhas. Isto traz graves conseqüências sobre o ecossistema (Dutton et. al., 2003; Losey et al., Altieri, 2000).

5- Há relatos sobre o efeito da toxina Bt no solo e como ela é altamente destruidora, ela persiste ativa no solo e se mistura com facilidade com a argila. A toxina Bt fica protegida contra a degradação microbial e age contra microorganismos impedindo a decomposição da matéria orgânica e criando assim uma série de problemas para a agricultura orgânica. Dizer que a toxina Bt é natural no solo e produzida pelos respectivos Bacilos não se compara de maneira alguma às imensas quantidades deixadas no solo pelas raízes de uma cultura Bt (Saxena et al., 1999; Marvier, 2001).

6- O perigo maior vem da toxina Bt movido na cadeia alimentar animal, seguido pela utilização do produto animal pelo homem, causando uma catástrofe incalculável para a saúde pública. Neste contexto há vários casos de intoxicação documentados pela imprensa mundial (Lean, 2005; Fares and El Sayed, 1998; Chawdhury et al., 2003).

7- A plantação do milho Bt nunca melhorou as condições financeiras dos agricultores, nem reduziu o uso de inseticida em qualquer país, mas ao contrário, há uma forte suspeita de que seja a causa de freqüentes suicídios de agricultores em Bradesh, na Índia, pela falência e frustração diante de uma realidade bem diferente da qual a propaganda os fez pensar (Scidev.net, 2007). Em culturas como as de milho onde predomina a polinização cruzada, toda a região cultivada se contamina compulsoriamente. Os agricultores não têm como escolher. Eles são obrigados a plantar e colher sementes de plantas contaminadas. Não há outra opção. Eles são constantemente cobrados pelas empresas produtoras a pagar pelo o que eles plantam. O valor da semente transgênica chega a 120 vezes mais do que a semente normal. Os agricultores não têm como fugir de pagar. Este aspecto sócio econômico deve ser levado em consideração, quando se pensar em liberar o milho Bt no Brasil.

Cinco questões aguardam resposta

1ª – Quais são os trabalhos experimentais que avaliam a segurança deste tipo de cultura sob condições brasileiras, durante um período suficiente, como manda a constituição? Quais são os resultados de avaliação disponíveis para o público?

2ª – Que monitoramento foi feito sobre risco de contaminação das variedades indígenas?

3ª – Quais são os estudos disponíveis sobre o impacto sócio econômico deste tipo de milho e as conseqüências sobre a população brasileira e a sua vida social?

4ª – Quais são os estudos do efeito deste tipo de milho sobre microorganismos úteis como o azotobacter e as condições agroecológicas do Brasil?

5ª – Quais são os resultados sobre as possíveis contaminações na cadeia alimentícia do Brasil, conforme documentado pela imprensa e literatura mundial?

Referências bibliográficas:

Alteiri, M. A. The ecological impacts of transgenic crops on agroecosystem health. Ecosystem Health 6:13-23. 2000.

Cunningham, S., Deutsch, L.; ERickson, J.;Quinlan, A.; Raez-Luna, E.; Tinch, R.; Trod, M.;Woodbery, P.; Zens, S. The risks and benefits of genetically modified crops: A multidisciplinary perspective. Conservation Ecocolgy, v.4, n.1, p.13.
Online
http://www.consecol.org/vol4/iss1/art13.2000

Chowdhury, E.H., Kuribara, H., Hino, A., Sultana, P., Mikami, O, Shimada, N., Guruge, K. S. Saito, M, Nakajima, Y., Detection of corn intrinsic and recombinant DNA fragments and cry 1Ab protein in the gastrintestinal contents of pigs fed genetically corn Bt 11. J. Anim. Sci. 81:2546-2551. 2003

Dutton, A., Romei J. and Bigler F. Assessing the risks of insect resistant transgenic plants on entomorphagous arthropods . Bt-maize expressing cry 1Ab as a case stdy. Biocontrol 511: 636. 2003.

Fares, N. H. and Elsayed A. K. Fine structural changes in the ileum of mce fed on transgenic potatoes. Natural Toxines 5:219-233. 1998.

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Lean, G. When fed to rats it affected their kidneys and blood counts. So what might it do to humans? We think you should be told. The Independence p.6, May, 2005. news.independent.co. uk/science_technology/story.jsp

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Marvier, M. Ecology of Transgenic crops. American Scientist 89:160-167.2001

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Rissler, J. & Mellon M. The ecological risks of engineered crops. MIT Press, Cambridge, MA.1996.

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Steinbrecher, R. A. 1996. From Green to Gene Revolution. The environmental risks of genetically engineered crops. The ecologist 26:273-282. 1996.

Tilman, D. Reich PB, Knops, J, Wedin, D. Mielke, T., and Lehman, C. Diversity and productivity in a long term grassland experiment. Sience 294:843-845, 2001.