O bom desempenho dos preços das commodities parece incoerente em meio à recessão econômica global, mas está longe de ser meramente especulativo. No caso da soja, a elevação das cotações internacionais responde ao que os analistas chamam de choque de oferta. Há dois anos o mundo produz menos soja do que consome.
Em 2009, a recessão econômica vai reduzir em 3% a demanda pelo grão, mas a produção mundial, que já havia sido deficitária no ciclo anterior, vai cair 4%. Como resultado, os estoques mundiais do grão recuarão ao mais baixo nível dos últimos cinco anos no ciclo 2008/09.
“Mesmo que a safra 2009/10 seja cheia no mundo todo, ainda assim não será suficiente para recompor os estoques”, calcula Pedro Collussi, analista da AgraFNP. O excedente mundial de soja, que chegou a ser superior a 60 milhões de toneladas em 2007, será de apenas 42,5 milhões de toneladas no ciclo 2008/09. A relação entre estoque e consumo, que alcançou confortáveis 28% há dois anos, despencou para 19% neste ano. Os dados são do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA).
O aperto dos estoques é notícia de janeiro e se confirma a cada nova estimativa de safra da Argentina, considera a analista da AgRural Daniele Siqueira. A safra do país vizinho tinha potencial para 50 milhões de toneladas, mas vai render pouco mais de 30 milhões. A projeção é revisada para baixo semanalmente pela Bolsa de Cereais de Buenos Aires. Na semana passada, caiu, de uma vez só, 600 mil toneladas, para 32, 2 milhões.
“Entre Argentina e Brasil, serão pelo menos 20 milhões de toneladas a menos”, calcula Leonardo Menezes, da consultoria Céleres. O cálculo do analista considera uma quebra de 16 milhões de toneladas na produção argentina e de 4 a 5 milhões no Brasil. A safra brasileira de soja vai recuar a 57,6 milhões de toneladas, segundo a Companhia Nacional do Abastecimento (Conab).
A quebra da safra sul-americana apertou ainda mais um quadro que já era justo. Enquanto a oferta cai mais que o esperado, a demanda recua menos que o previsto. A previsão do USDA é que o consumo mundial de soja se retraia 3% neste ano, mas a China, maior importador do grão do mundo, continua comprando como nunca. “Os chineses vão continuar priorizando o milho e comprando soja. A capacidade de esmagamento deles é muito grande. Tem espaço para que as importações aumentem entre 2 e 3 milhões de toneladas por ano”, calcula Collussi.