Como no vai e vem de uma gangorra, o abastecimento mundial de milho vive etapas alternadas de definições. As safras dos hemisférios Sul e Norte se complementam no atendimento das necessidades e, embora a maior parte da produção de milho seja obtida no Norte (nos EUA e China), dois países importantes em termos de exportação e consumo estão no Sul (Brasil e Argentina). Como as duas safras são desencontradas, a oferta ao longo do ano consegue se estabilizar. Com a safra de verão do hemisfério Sul praticamente definida, as expectativas se voltam neste momento para o plantio no hemisfério Norte.
A safra argentina está prevista para cerca de 20,5 milhões de toneladas, 9,6% inferior à safra anterior, em decorrência das péssimas condições climáticas durante a floração que prejudicaram os rendimentos agrícolas (esta redução na produção ocorreu apesar de um acréscimo de 11,8% na área plantada). Segundo as normas do governo argentino, será permitido um total exportável de 12 milhões de toneladas (divididas em duas parcelas de 5 e de 7 milhões de toneladas), muito inferiores às previsões iniciais de 18,5 milhões de toneladas.
Nos Estados Unidos, a decisão está na quantidade da área que poderá ser incorporada à produção e como ela será distribuída entre as principais culturas de verão (milho, soja, algodão, sorgo etc.). Ao contrário de anos anteriores, quando os baixos preços do algodão permitiram que áreas tradicionalmente ocupadas com esta cultura fossem destinadas à produção de milho, neste ano a situação é diferente, pois os preços do algodão apresentam uma elevação superior a 150% (na Bolsa de Chicago) em relação aos de doze meses atrás. No mesmo período, o preço do milho se elevou em cerca de 90%, a soja em aproximadamente 40% e o trigo em cerca de 60%.
Dois problemas assombram o abastecimento de produtos agrícolas e se localizam no hemisfério Norte. Um deles é o uso do milho para a produção de etanol nos Estados Unidos, que renova a cada ano as incertezas sobre a capacidade deste país atender às crescentes quantidades demandadas para esta finalidade e em que medida uma eventual queda na produção afetaria as exportações deste cereal. Por outro lado, está o apetite aparentemente insaciável da China por matérias-primas e produtos agrícolas. Este país já é responsável por 60% das importações de soja, 40% das importações de algodão e 20 % das importações de óleo de soja. No que diz respeito ao milho, uma situação no mínimo estranha se verifica. Os estoques chineses deste cereal são os maiores dos últimos anos (60 milhões de toneladas, mais do que uma safra brasileira e 40% dos estoques mundiais). Entretanto, sempre se encontra na mídia notícias de importações chinesas de milho. Isto apesar dos problemas de produção que se verificaram no ano de 2010. Analistas indicam a possível importação de 2,5 milhões de toneladas de milho pela China (a partir de setembro), a maior importação dos últimos 15 anos. Como esta expectativa de transformação da China em país importador de milho tem sido recorrente, esta esperança necessita de maior solidez para ser considerada seriamente.
Para finalizar, a situação na Líbia introduziu uma turbulência no mercado de petróleo, o que não deixa de contaminar os outros mercados. Toda vez que os preços do petróleo sofrem abalos drásticos, os preços de todas as commodities (inclusive os alimentos, pois os combustíveis e fertilizantes derivados de petróleo têm participação relevante nos custos de produção) acabam sofrendo algum choque, mesmo que seja apenas por inércia.
É neste ambiente que mais uma safra começa a ser implantada no hemisfério Norte. No caso específico do milho, em um mês os preços na Bolsa de Chicago atingiram valores acima de US$ 7,20 por bushel (cerca de US$ 283,00 por tonelada) e sofreram após uma queda brusca para algo ao redor de US$ 6,20 por bushel, passando a subir em seguida para US$ 7,00 e se localizando ao redor de US$ 6,70 nos últimos dias. Para um período tão curto, isto é uma variação considerável.
Situação Interna
No Brasil, a colheita do milho tem prosseguimento no Sul do Brasil, com resultados favoráveis de produtividade, e com preços que não estão sendo afetados pela entrada da nova safra (mesmo estando a colheita adiantada em relação ao ano passado). Nas outras regiões, o único problema que se verifica está na ocorrência de chuvas prejudiciais à colheita da soja. Como o milho pode esperar, a prioridade no uso das máquinas é a colheita da soja e, com isto, a oferta de milho da nova safra fica um pouco mais restrita.
No Paraná, a área com milho safrinha está estimada com um aumento de 19% em relação à da safrinha anterior e a previsão de colheita é superior ao da safra verão (que teve uma redução de 17% na área plantada e na produção em relação à safra 2009/2010). Deve-se ressaltar que a safra de verão no Paraná e em Santa Catarina foi implantada ainda sob o impacto dos baixos preços do milho no início do segundo semestre de 2010 e os produtores não se beneficiaram das condições climáticas favoráveis que ocorreram nas principais regiões produtoras (apesar das previsões desfavoráveis do efeito do La Niña).
O atraso no plantio da safrinha já está confirmado nas principais regiões produtoras de Mato Grosso. Segundo o Imea (Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária), a área plantada atingiu na última semana de março o quantitativo estimado para este ano, de 1,8 milhão de hectares (cerca de 7% inferior à do ano passado), com um atraso considerável em relação aos anos anteriores, o que potencializa a ocorrência de eventos climáticos desfavoráveis no fim do ciclo das lavouras de milho. Ao mesmo tempo, a menor área induz ao uso pelos agricultores de um pacote tecnológico menos intensivo na quantidade de fertilizantes e com uso de sementes de mais baixo custo. Projeções realizadas por institutos de meteorologia indicam condições favoráveis para os próximos meses, principalmente no mês de maio, em Mato Grosso. Entretanto, em função da alta instabilidade da safrinha, ainda é cedo para levantar previsões sobre o rendimento das lavouras.
Em Minas Gerais, a colheita de uma safra normal (o clima nas principais regiões produtoras não foi tão desfavorável como no leste do estado) está sendo afetada pela preferência da colheita da soja. Como o abastecimento interno do estado está apertado, os preços continuam altos e os criadores de animais confinados já mostram alguma intranquilidade (um acompanhamento semanal do preço do milho pode ser encontrado no site do CIMilho – www.cnpms.embrapa.br/cimilho).
Para completar o quadro relativo ao abastecimento interno, nota-se um crescimento na área plantada com sorgo, principalmente no Centro-Oeste (informações coletadas em empresas produtoras de sementes indicam um acréscimo nas vendas de até 20%). Isto já era de se esperar tendo em vista o atraso nas condições de plantio do milho safrinha que pode ter afetado a decisão de aumento na área plantada com sorgo.
De qualquer forma, com o problema da colheita da soja gradativamente se resolvendo, os preços se mostram afetados principalmente pelas possibilidades de exportação, que se encontram muito favoráveis.
As exportações de milho pelo Brasil continuaram firmes no mês de fevereiro (foram exportadas 1,183 milhão de toneladas, superior ao quantitativo de janeiro), com os preços médios de exportação superiores a US$ 250,00 por tonelada (e subindo, desde o segundo semestre de 2010). Estas exportações são vitais para a manutenção dos preços internos e, ao contrário que possa parecer, para garantir o abastecimento interno, pois incentiva os agricultores na consolidação da área plantada e no incremento do uso de insumos necessários para elevar a produtividade de suas lavouras.