Com lavouras geneticamente modificadas em franca expansão no Brasil, indústrias especializadas no processamento de grãos não-transgênicos prevêem dificuldade de abastecimento
Exportar soja convencional está cada vez mais difícil. Não por falta de comprador, mas de fornecedor. As indústrias que trabalham com este tipo de produto preveem dificuldade de abastecimento no Paraná. Diante da dificuldade para originar grãos convencionais no estado, a Imcopa irá atravessar estados e buscar em Mato Grosso boa parte da matéria-prima trazer para abastecer sua indústria em Araucária, na região metropolitana de Curitiba. Com contratos a cumprir, a Coamo Agroindustrial, com sede em Campo Mourão (Noroeste), está preocupada e também procura alternativas. Quase 90% das 3 milhões de toneladas que a cooperativa espera receber no ciclo 2010/11 serão transgênicos.
A Coamo precisar entregar a clientes europeus dois navios de farelo de soja não-transgênica por mês, cerca de 1 milhão de toneladas. Mas as lavouras convencionais, que no ano passado se estendiam por mais de 500 mil hectares (32% do total), neste ano ocupam menos de 200 mil (12%) na área de atuação da cooperativa, que além do Nordeste paranaense atua também em Mato Grosso do Sul. “Em algumas regiões, não tem nem 5% de soja convencional. E, dos que plantaram, muitos nem vão segregar”, relata o presidente José Aroldo Gallassini.
Sem considerar perdas climáticas, a oferta de soja convencional na área da Coamo deve cair de 1,5 milhão no ciclo passado para pouco mais de 600 mil toneladas nesta temporada. A conta considera uma produtividade média de 3 mil quilos por hectare, marca que foi superada na região na safra anterior, mas que não deve ser ultrapassada neste ano.
Para estimular o produtor a separar e entregar os grãos não transgênicos, a cooperativa está oferecendo um bônus de R$ 2 por saca de 60 quilos. O prêmio, que era de R$ 1,7 na safra passada, teve reajuste de 18% nesta temporada. De acordo com Gallassini, 80% do adicional pago pelo importador à cooperativa será repassado ao produtor. No ano passado, o repasse era de 60% do valor.
“Tentamos negociar um prêmio melhor com o comprador. Mas quase resultou em quebra de contrato. Quase não vale a pena, mas é uma clientela de mais de 10 anos que queremos manter. Então aumentamos o prêmio para motivar o produtor. Poderemos ter dificuldade, mas vamos superar”, diz o dirigente. Aproximadamente metade dos contratos da cooperativa com a Europa exige grãos convencionais. Os principais clientes são França e Alemanha.
A maior dificuldade, relata o presidente da Coamo, é que a negociação com os importadores ocorre entre setembro e outubro, muito tarde para influenciar a decisão de plantio do produtor, que é tomada cerca de três meses antes. “O ideal seria negociar entre abril e maio”, confirma o diretor operacional da Imcopa, José Enrique Marti Traver. “Mas para isso os clientes teriam que antecipar em mais de um ano compra. E não há como prever seu consumo anual com antecedência assim”, defende.
Especializada em processar soja não-transgênica, a Imcopa e se firmou como uma exportadora para o mercado europeu. Suas fábricas, em Araucária e Cambé, têm capacidade de processar 5 mil toneladas do grão por dia, ou 1,6 milhões de toneladas/ano, e produzem itens de alto valor agregado, como farelos com alta concentração de proteína e lecitina de soja. Todo o farelo e metade da produção de óleo é exportada.
Recuperada da crise que a fez desativar parte da linha de produção no ano passado, a empresa paranaense trabalha com capacidade total, mas não prevê grandes problemas de abastecimento, de acordo com Traver. Para evitar falta de matéria-prima, mantém um programa contínuo de originação de grãos convencionais, com fornecedores cativos no Paraná e em Mato Grosso. Assim como a Coamo, oferece prêmio de R$ 2 por saca de soja convencional. “Para incentivar o produtor aqui, porque o repasse lá fora não cresce na mesma proporção”, observa o dirigente.