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Transgênicos ainda dividem opiniões na UE

Agricultores europeus receiam ficar fora do mercado com a proibição de cultivos geneticamente modificados.

Transgênicos ainda dividem opiniões na UE

Os agricultores europeus provavelmente ficarão em desvantagem no competitivo e globalizado mercado de grãos da União Europeia (UE). A hostilidade dos consumidores locais aos organismos geneticamente modificados (OGMs) impede pesquisas no segmento e tornou-se obstáculo ao desenvolvimento de culturas de rendimento maior e resistentes a pragas.

A União Europeia aprovou o cultivo de apenas um grão de milho modificado – (MON810), da Monsanto, resistente a insetos. Mas a acirrada oposição levou Alemanha, Áustria, Grécia, Hungria, Luxemburgo e Bulgária a proibi-lo em seus territórios.

A moratória na França, maior exportadora de grãos da Europa, foi anulada por razões legais em 2011. Mas o governo já pediu à Comissão Europeia a suspensão do plantio antes que a nova temporada de semeadura tenha início em algumas regiões durante este mês.

Agricultores e cientistas, porém, dizem que o milho transgênico demonstrou poder melhorar a produção e reduzir custos. “As coisas andarão mais rápido em continentes com acesso a essas técnicas”, disse Fabien Lagarde, diretor do Cetiom, instituto técnico francês especializado em oleaginosas. “Certamente a Europa vai perder competitividade, especialmente, no caso do milho”, acrescentou.

O grupo agrícola francês AGPM forneceu os resultados do plantio do milho MON810 cultivado em mais de 22 mil hectares, em 2007, um ano antes de a França impor a moratória ao plantio. A lavoura transgênica evitou perda média de rendimento de meia tonelada de grãos por hectare, vantagem equivalente a € 100 por hectare.

O valor inclui o custo adicional de € 35 a 40 por hectare das sementes transgênicas em relação às convencionais. De acordo com a AGPM, os agricultores economizaram 8,8 mil litros de pesticidas e 30 mil litros de combustível necessários para aplicá-los.

O prejuízo para a competitividade europeia no mercado mundial será limitado pelo fato de sua principal cultura de exportação ser o trigo, cereal com escassa pesquisa genética até agora. A produção de milho europeia é cerca de metade de sua produção de trigo.

Um estudo realizado pelo lobby biotecnológico do Serviço Internacional para Aquisição de Aplicações Biotecnológicas (ISAAA, na sigla em inglês) constatou que a área mundial cultivada com lavouras transgênicas cresceu 8% no ano passado, para um recorde da ordem de 160 milhões de hectares. As principais culturas foram algodão (82% delas são hoje geneticamente modificadas), soja, com percentual de 75%, e milho, com 32%.

Os agricultores europeus semearam milho transgênico em 114,49 mil hectares, pouco mais de 1% da área total do grão, segundo o ISAAA. Nos Estados Unidos, este cultivo ocupa 88% de toda área plantada. No ano passado, a Espanha plantou 85% de sua área total de produção com a variedade MON810 da Monsanto.

O vice-diretor da AGPM, Cedric Poeydomenge, disse que a Europa poderia encontrar mercados para ampliar sua produção de milho no norte da África e no Oriente Médio, com o intuito de alimentar as crescentes criações de aves.

“Esses mercados são agora supridos por Argentina, Brasil, EUA, Ucrânia e, por vezes, pela França, como neste ano”, disse ele. “É preciso permitir que os agricultores tenham acesso a estas culturas porque estamos em um mercado mundial. Se não formos competitivos, vamos desaparecer dele”, comentou Poeydomenge.

Ao ampliar a produção de milho, a UE também poderia reduzir as atuais importações anuais de cerca de 30 milhões de toneladas de carregamentos transgênicos de milho e de farelo de soja destinados à alimentação do gado. “Nós importamos transgênicos porque, do contrário, não conseguimos sobreviver. É mais um absurdo”, disse Marc Van Montagu, presidente da Federação Europeia de Biotecnologia.

Alguns dos maiores produtores mundiais de sementes, como Basf Plant Science, Syngenta e Bayer CropScience, desistiram de desenvolver variedades geneticamente modificadas para atender ao mercado europeu. Empresas de biotecnologia como a Monsanto, Limagrain e SAAT KWS reduziram as pesquisas vinculadas aos projetos de pequena escala que permitem o cultivo de transgênicos.

Agricultores franceses, os maiores produtores e exportadores de grãos na UE, receiam que a fuga de pesquisadores tenha grandes consequências a longo prazo. “Todos os pesquisadores estão, agora, no exterior. Essa é uma situação intolerável que não permite nos prepararmos para o futuro”, disse Guy Vasseur, presidente das Câmaras Francesas de Agricultura.

“Alguns dizem que precisamos esperar uma segunda geração de culturas geneticamente modificadas. Mas quando você perde a primeira fase, fica com menos chances de participar das etapas seguintes”, acrescentou. Mas nem todos os agricultores europeus concordam que o acesso aos transgênicos seria realmente benéfico.

“O cultivo de plantas geneticamente modificadas traz problemas de segurança alimentar e à biodiversidade, especialmente em países como a Itália, com peculiaridades de solo e dimensão das culturas. Não seria possível evitar contaminação ambiental”, afirmou Carlo Franciosi, funcionário da Coldiretti, maior associação italiana de agricultores.

Alguns cientistas garantem ser difícil ver muita diferença entre o aumento das safras resultante de modificações genéticas comparadas a incrementos verificados em culturas convencionais.

Dados do Ministério da Agricultura francês mostram que a produção de milho cresceu cinco vezes entre 1950 e 2010, para cerca de 10 toneladas por hectare, apenas com base em recursos tradicionais.

Pesquisas envolvendo culturas convencionais prosseguem na Europa. “Tenho dúvidas sobre não haver salvação fora dos transgênicos”, afirma Herve Guyomard, diretor científico do Instituto de Pesquisa Agronômica (INRA), na França, o maior centro de pesquisas europeu nessa área.

O programa do INRA denominado “amaizing” – um trocadilho com “maize” (milho) -, pretende motivar o aumento da produção do grão convencional, cujo rendimento permanece estável na Europa. O objetivo é evitar a disparidade da competitividade entre o bloco europeu e seus concorrentes.

“Se abandonarmos as pesquisas com melhoramento tradicional, certamente seremos incapazes de acompanhar os países que investem no desenvolvimento das sementes transgênicas para incrementar os níveis de produtividade”, afirmou Herve Guyomard.