Mais do que reverberar a tendência de aumento da área plantada de soja nos EUA na safra 2014/15 ou confirmar a recomposição da oferta de grãos em geral no país, as primeiras projeções do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) para o próximo ciclo ofereceram um contorno mais nítido do impacto que esse novo cenário poderá ter sobre as cotações das principais commodities agrícolas. E não é pouca coisa. Em relação aos preços praticados atualmente na bolsa de Chicago, milho e trigo, de acordo com o USDA, tendem a recuar quase 15% na nova safra, enquanto a queda prevista para a soja se aproxima de 30%.
Se é uma boa notícia do ponto de vista da inflação dos alimentos, o horizonte traçado pelo órgão, se confirmado, significará margens mais apertadas para os agricultores, inclusive no Brasil. Nada que vá inviabilizar a atividade, mas certamente algo que exigirá mais cuidado nas definições de investimento e expansão de cultivo. Mas, de fato, as projeções do USDA não surpreenderam os traders, tanto que soja e milho registraram altas moderadas ontem em Chicago, ao passo que o trigo não variou.
Em parte, essa reação das cotações reflete as incertezas intrínsecas da agricultura. Da mesma forma que em setembro do ano passado, quando começou o plantio de soja desta safra 2013/14 no Brasil, não havia no radar um risco climático tão grande quanto o que hoje paira sobre lavouras do Sudeste e do Sul do país, é difícil afirmar que não haverá ameaças no Hemisfério Norte durante o plantio e o desenvolvimento das lavouras em 2014/15. E também ainda não se sabe exatamente o que vai acontecer na América do Sul no próximo ciclo – e isso, em parte, também dependerá das colheitas acima do Equador e de seus reflexos sobre os preços.
Conforme o USDA, o preço médio da soja deverá ficar em US$ 9,65 por bushel (medida equivalente a 27,2 quilos da oleaginosa) em 2014/15, ante os US$ 13,4775 registrados ontem no fechamento de Chicago. O órgão estima uma cotação média de US$ 3,90 por bushel de milho – que equivale a 25,2 quilos do cereal -, ante os US$ 4,6225 de ontem, enquanto para o trigo a média projetada foi de US$ 5,30 por bushel (27,2 quilos), para um valor final que na sessão de ontem da bolsa alcançou US$ 6,1350. Para soja e milho, a safra vai de setembro deste ano a agosto do próximo; para o trigo, o ano-safra terá início no dia 1º de julho.
Nas pesquisas de campo que realizou, o USDA, que é o Ministério da Agricultura americano, captou entre os produtores do país uma intenção de elevar a área plantada com soja para 32,2 milhões de hectares em 2014/15, 3,9% mais que na safra passada. Esse avanço deverá ocorrer sobre áreas que foram ocupadas em 2013/14 pelo milho, para o qual o órgão estima agora retração de 3,5%, para 37,2 milhões de hectares. No caso do trigo, a projeção do USDA para a área plantada americana é de 22,5 milhões de hectares, 1,2% menor que a da temporada anterior.
O avanço da soja sobre o milho já era dado como certo pelo mercado. Em reportagem do “The Wall Street Journal” publicada na edição de segunda-feira do Valor, por exemplo, Terry Reilly, analista da corretora Futures International, partia dessa premissa para estimar que a soja poderia cair até US$ 9,50 no segundo semestre. De acordo com levantamento do Valor Data, o preço médio estimado pelo USDA para a soja em 2014/15, se confirmado, será o menor desde 2007 – antes do recrudescimento da crise financeira global aprofundada pela quebra do banco americano Lehman Brothers, em setembro de 2008. No milho, é o patamar mais baixo desde 2009, enquanto a cotação média estimada para o trigo se aproxima do patamar observado entre 2006 e 2007.
Quedas já eram esperadas, porque depois das quebras provocadas por estiagens na Rússia na Ucrânia e na América do Sul na safra 2011/12 e nos EUA em 2012/13, a temporada 2013/14 já foi de recuperação e, portanto, de recomposição dos estoques mundiais de grãos. Portanto, um ciclo “normal” em 2014/15 confirmará uma oferta global mais confortável, em tempos de demanda ainda fragilizada pelo lento ritmo de crescimento dos países emergentes e pela desaceleração em nações como a China.