Fonte CEPEA

Carregando cotações...

Ver cotações

Economia

Contas públicas afetam exportações

Tendência do dólar é seguir desvalorizado. Setor privado discute alternativas para evitar colapso progressivo de vendas ao exterior.

Contas públicas afetam exportações

A “bolha” de interesse pelo Brasil, apontada pelo economista prêmio Nobel Paul Krugman, promete permanecer inflada por muito tempo. A expectativa de continuidade no crescimento econômico traz previsões de investimentos estrangeiros em torno de US$ 35 bilhões no ano que vem, a exploração do petróleo das camadas pré-sal promete atrair ainda mais recursos do exterior. Tudo isso garante aos exportadores a desagradável certeza de que a tendência do dólar é seguir desvalorizado. Por isso, já se discutem no setor privado alternativas à desvalorização do real, para evitar o progressivo colapso das vendas ao exterior.

Os empresários, apesar das previsões, ainda não abandonaram a discussão sobre a necessidade de valorização do dólar. A Fiesp, segundo seu diretor do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior, Roberto Gianetti, apresentou ao governo e fará campanha por uma coleção de medidas destinadas a segurar a enchente de moeda estrangeira que ameaça afogar o mercado brasileiro.

“Não voltaremos ao patamar anterior, mas dá para chegar ao dólar a R$ 2,10”, acredita. É um esforço heroico, mas é disseminada entre os especialistas a certeza de que a sobrevivência das exportações brasileiras não pode se fiar na esperança de melhora no câmbio e depende do aumento da competitividade do país. Há medidas importantes para isso, presas na mão do governo. Uma delas é a devolução dos impostos cobrados indevidamente na exportação, dinheiro que daria fôlego aos empresários para se manter à tona em um mercado tormentoso.

É velho dito no comércio exterior brasileiro a reclamação contra a exportação de impostos. Imposto, por definição, não se cobra das exportações. Há países que, pelo contrário, pagam um “reintegro” para compensar exportadores pelos tributos colhidos em sua cadeia de produção. Tributam-se, no máximo, os lucros dos exportadores, que, se forem obrigados a repassar aos consumidores lá fora toda mordida fiscal dos governos locais, passarão a competir em desvantagem. Essa discussão voltou às conversas entre setor privado e governo, no Comitê de Aceleração do Crescimento (novo batismo do Comitê de Acompanhamento da Crise, criado no ano passado).

Pelos cálculos da Fiesp, podem chegar a R$ 20 bilhões os tributos cobrados indevidamente dos exportadores, como PIS e Cofins, e não devolvidos. Nos Estados, a gula do fisco já acumula em torno de R$ 40 bilhões cobrados indevidamente, sem devolução. O cálculo é endossado pela secretária-executiva da Câmara de Comércio Exterior, Lytha Espíndola, mas é assunto tabu no Ministério da Fazenda, onde as autoridades, em conversas informais, alegam que as preocupações com a queda de arrecadação não abrem espaço para qualquer medida que toque em impostos.

O governo federal não está sozinho na sabotagem tributária às exportações. A discussão sobre os problemas fiscais brasilieiros falha ao concentrar-se nas mazelas da administração dos cofres federais. Em seminário recente da Fiesp, Gianetti pode mostrar que, nos cinco anos entre 2003 e o ano passado, as exportações cresceram apenas 41%, enquanto a arrecadação do IPI e do PIS/Cofins cresceu 95.4%. Nesse mesmo período, a arrecadação do ICMS, estadual, aumentou 84,1%. O vigor do mercado interno responde por parte desse descompasso, claro, mas ele mostra também que o crescimento da produção tributável excede o crescimento das exportações, indício da fome irracional de impostos sobre as vendas ao exterior.

Enquanto isso, competidores do Brasil no cada vez mais agressivo mercado externo azeitam mecanismos ágeis de compensação de impostos. A China devolve a seus produtores 17% dos impostos cobrados na produção, a Índia, 16%, e a vizinha Argentina, 6%, segundo dados da Organização Mundial do Comércio. Por isso, pesquisa da Fiesp com empresas, associações e sindicatos empresariais constatou que 28% consideram problema grave a acumulação de créditos tributários na esfera federal e 29% classificam o problema como “muito grave”.

No caso do ICMS, é problema grave para 20% e “muito grave” para 44%. O ICMS concentra o acúmulo de créditos não pagos para 53% das empresas. Na maioria (57%), são créditos de pequeno valor, abaixo de R$ 1 milhão, mas os tributos são um peso considerável, entre 10% a 20% para 26% das empresas e entre 20% e 40% para 36% das firmas. Ao apontarem os custos tributários que mais dificultam um preço de exportação mais competitivo (podendo apontar mais de um tributo), 57% das empresas citaram os encargos trabalhistas, 46%, o ICMS e 33% o PIS/Cofins.

O tema foi levado à Comissão de Aceleração do Crescimento pela Confederação Nacional da Indústria, que preparou um estudo sobre o peso dos impostos na exportação e sugere um leque de medidas para eliminar a tributação sobre as vendas externa. “Não é benesse, não é subsídio: a desoneração fiscal das exportações é prevista na Constituição”, defende o gerente-executivo de Políticas Econômicas da CNI, Flávio Castelo Branco, que coordena o estudo sobre as medidas necessárias para evitar o indevido peso dos tributos sobre as exportações. A CNI sugere mudanças nas normas da Receita para permitir a informatização dos registros de crédito tributário e sua compensação imediata, com a possibilidade de transferência a terceiros dos valores cobrados indevidamente na exportação.

A discussão sobre tributos excessivos – um debate curioso, por acontecer enquanto os competidores do Brasil são criticados por dar estímulos fiscais às vendas externas de sua indústria – é apenas um ponto da necessária agenda de competitividade do Brasil. Ainda que a ação contra a excessiva valorização do real seja uma necessidade indiscutível, como ressalta Roberto Gianetti, o sequestro do potencial exportador brasileiro por cofres federais e estaduais sedentos de caixa é uma anomalia, a ser banida do cenário econômico, em qualquer discussão racional sobre o futuro do Brasil, com ou sem “bolha” financeira internacional.