Redação (26/08/2008)- Em todo os Estados Unidos, ao lado de elevadores de grãos, enormes montes dourados de trigo e de milho aguardam vagões ferroviários para transportá-los ao mercado. Os grãos podem ficar aguardando um mês ou mais no solo, expostos a vento, chuva e ratos.
É o lado negativo do crescimento explosivo da demanda mundial por milho, trigo e soja americanos. O surto exportador está revelando ineficiências nas ferrovias, rodovias e rios que escoam os grãos que ajudam a alimentar o mundo. E esses gargalos estão custando aos agricultores, transportadoras e, em última instância, aos consumidores, milhões de dólares por ano.
Mark Hodges, diretor-executivo da Comissão de Trigo de Oklahoma, viu o problema com seus próprios olhos. No início do segundo semestre, quando consumidores demandavam mais do que nunca trigo e milho americanos, Hodges fez um giro de visitas aos elevadores de grãos locais. Viu pilhas de grãos que pareciam formigueiros gigantes aguardando o embarque. Administradores frenéticos não conseguiam encontrar vagões ferroviários suficientes para transportá-los.
"Quando colocamos trigo no chão, ocorrem perdas", diz Hodges. "Eles nunca gostam de pôr os grãos no chão, mas quando o trigo está custando US$ 7, US$ 8 ou US$ 10 por bushel, com ainda mais razão, eles não gostam mesmo de colocá-lo no chão".
Uma colheita surpreendentemente grande, neste segundo semestre, deverá testar mais o sistema. O Departamento de Agricultura dos EUA prevê a segunda maior colheita de milho e a quarta maior safra de soja na história.
Alguns grupos empresariais do agronegócio temem que os gargalos possam prejudicar o status dos EUA como fornecedor mundial, à medida que outros países – como Brasil e Argentina – competem por uma lucrativa participação no mercado.
Em anos passados, grandes colheitas fizeram com que milhões de bushels fossem armazenados fora de silos de grãos repletos, aguardando transporte. Grãos carregados em barcaças enfrentavam esperas em comportas e barragens antiquadas no rio Mississippi, aumentando o número de dias e o custo do transporte.
Apenas os atrasos nas barcaças acrescentaram, em média, US$ 72,6 milhões por ano ao custo do transporte de mercadorias nos rios Mississippi e Illinois, segundo uma nova análise do Corpo de Engenheiros do Exército (CEE), divulgado à Associated Press.
Atrasos ferroviários também são onerosos. Em 2006, cerca de 1 bilhão de bushels de grãos foi armazenado a céu aberto ou em abrigos improvisados em Iowa, Illinois e Indiana, acrescentando estimados US$ 107 milhões a US$ 160 milhões, naquele ano, ao custo de seu transporte, segundo estatísticas do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA). Isso corresponde a cerca de 1% do valor agregado, de US$ 13,8 bilhões, das exportações de milho e soja em 2006.
"Estamos muito atrasados em nossos investimentos em infra-estrutura, nos setores tanto privado como estatal", diz Peter Friedmann, diretor-executivo da Coalizão para Transportes Agrícolas, entidade que reúne exportadoras de grãos. "E precisamos tirar muito desse atraso ou veremos outros países nos ultrapassar, à medida que investem mais em sua infra-estrutura". O problema deve persistir, e mesmo se agravar, nos próximos anos.
Eliminar os gargalos necessitará bilhões de dólares em investimentos durante vários anos. Até que isso aconteça, as previsões são de que as exportações cresçam, sendo que os embarques de milho deverão crescer a cada ano durante a próxima década – de 54 milhões de toneladas para 77 milhões de toneladas -, segundo o Instituto de Pesquisas sobre Políticas Alimentares e Agricultura.
Custos adicionais por conta dos maiores gargalos só vão prejudicar agricultores americanos num setor extremamente competitivo no mundo. "Nessa atividade, preço é o que continua mandando", afirma Larry Jansky, negociante-sênior de commodities agrícolas na North Pacific , em Portland, no Estado de Óregon. "Dois ou três dólares por tonelada é a diferença entre ganhar ou não uma concorrência".
As exportações agrícolas no ano passado totalizaram pouco menos de US$ 90 bilhões. Se os Estados Unidos perderem somente 1% ou 2% desse mercado para países exportadores em rápido crescimento – como a Argentina -, isso poderá subtrair entre US$ 900 milhões e US$ 1,8 bilhão da economia.
De acordo com alguns economistas, os custos de transporte mais elevados podem prejudicar tanto agricultores como consumidores. Isso ocorre porque as companhias operadoras de elevadores de grãos ou de barcaças podem cobrir seus custos mais altos pagando aos agricultores um pouco menos por seu grão, ou cobrando dos consumidores um pouco mais pela mercadoria. O Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) não monitora o custo que os gargalos no sistema de transportes acrescentam anualmente ao preço dos alimentos.
Operadoras de elevadores de grãos ganharam prática no armazenamento de grãos a céu aberto, usando plataformas de concreto e lonas para garantir que apenas uma fração da colheita seja perdida, disse Marvin Prater, economista do USDA.
Porém, mesmo nas melhores condições, a armazenagem de grãos a céu aberto implica que a carga precisa ser "manuseada duas vezes", por ser colocada, primeiro, fora do silo, depois recolhida para ser colocada no silo e somente então despejada num vagão ferroviário. Em contraste, quando as coisas funcionam a contento, os grãos são carregados dos caminhões dos agricultores diretamente nos elevadores de grãos cujos funis os despejam em vagões ferroviários que já os aguardam. O duplo manuseio acrescenta entre 10 e 15 centavos de dólar por bushel, diz Prater.
A Associação das Ferrovias Americanas (AFA) estima que custará cerca de US$ 148 bilhões para expandir as linhas ferroviárias nos próximos 30 anos, para dar conta do crescimento da demanda. Mas a associação diz que as companhias ferroviárias podem apenas arcar com de 70% dos custos necessários.
A AFA e as companhias que operam no setor de agronegócios estão apoiando a aprovação de uma legislação que ofereceria créditos tributários para investimentos na expansão da capacidade de transporte ferroviário.
As barcaças que descem o Mississippi são há muito tempo uma alternativa de transporte mais barato para agricultores com acesso ao rio. Mas o seu tráfegi é dificultado por comportas e barragens construídas na era da Depressão. Esses atrasos acrescentam cerca de 50 horas ao tempo de viagem ao longo do trecho superior do Mississippi, segundo cálculos de Scott Whitney, gestor do Corps.
Os maiores gargalos estão nos movimentados portos americanos, onde os produtos agrícolas são carregados em navios oceânicos. Com o passar dos anos, os exportadores passaram a despachar cada vez mais os grãos alugando contêineres vazios que traziam bens de consumo para os EUA provenientes de outros mercados extrangeiros, como a China. Mas como essas importações diminuíram, as exportações estão sujeitas a maiores esperas, e a pagar mais, para conseguir espaço em navios que seguem para o exterior, disse Jansky, o comerciante de grãos em Portland.
Jansky disse que o custo de alugar um contêiner de 20 pés mais que dobrou, para US$ 1,7 mil, apenas nos últimos 10 meses.