No segundo artigo da série sobre os desafios da inserção global do agro brasileiro vamos tratar do tema mais crucial para consolidar um novo ciclo de crescimento desse setor: acesso a mercados.
De nada adianta recebermos dezenas de pedidos de clientes potenciais a cada semana ou propostas de parceria no exterior se não conseguimos a “permissão para exportar”, ou seja, para ingressar formalmente nos mercados. Sem acesso efetivo, tampouco adianta baixar custos, melhorar a infraestrutura ou diferenciar produtos.
No passado, as principais restrições de acesso a mercados eram altas tarifas de importação, quotas proibitivas e a concorrência com subsídios domésticos. Hoje as barreiras mais perversas são as não-tarifárias: sanitárias, técnicas ou burocráticas.
Temos ganhado mercado frente aos nossos concorrentes nos produtos que enfrentam menores barreiras, como soja, milho, algodão, café e celulose. Já nas carnes, lácteos, açúcar, frutas e alimentos processados o Brasil tem perdido partes de mercado por causa de barreiras e subsídios, que hoje exigem do país maior estratégia e priorização de ações.
Como a nossa produção agropecuária já ultrapassa, de longe, a dimensão do mercado doméstico, é necessário agir em três frentes de acesso a mercados:
1. Negociações comerciais: para manter o acesso que conquistamos no passado temos obrigatoriamente de retomar negociações com países e blocos estratégicos. Não vai ser fácil. Ficamos 15 anos isolados do mundo, sem uma política comercial consistente. Hoje estamos no fim da fila, pois nossos concorrentes e clientes da Europa, América do Norte, Ásia, Oceania e Aliança do Pacífico estão cobertos por mais de uma centena de acordos de livre-comércio ou preferenciais.
Na agenda agro, precisamos concluir o Acordo UE-Mercosul o mais breve possível, mesmo que de forma subótima. Deveríamos investir pesado na Ásia, por meio do ingresso na Parceria Transpacífica (CPTPP) ou de um acordo com a Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN). Em paralelo, precisamos avançar na difícil negociação com o Japão e a Coreia do Sul, já anunciada mas ainda pouco factível.
2. Parcerias estratégicas: de longe, a parceria mais importante é com a China, nosso maior cliente e investidor no agro. Temos de diversificar as exportações para esse país muito além da soja, atrair investimentos e agir de forma mais estratégica e coordenada, dentro do governo e em ligação estreita com o setor privado. Uma parceria estratégica com os EUA também seria fundamental, ainda que difícil no contexto da atual administração americana.
3. Abertura para importações: exportamos sete vezes mais do que importamos no agro. Queremos acessar o mundo, falamos o tempo todo das nossas belezas e grandezas, mas na hora de negociar com os parceiros comerciais não oferecemos nada em troca.
Dos cinco maiores exportadores do agro mundial, somos o único que tem importações irrisórias. Continuamos sendo um dos países mais fechados do mundo. Trigo, cacau, café, banana, coco, camarão, lácteos e pescados são exemplos de produtos nos quais o protecionismo localizado impede grandes volumes de exportações potenciais.
Acesso aos mercados é peça central no tabuleiro que leva a um novo ciclo de crescimento do agro brasileiro. O tema torna-se ainda mais relevante em um ambiente de comércio administrado por interesses geopolíticos, retaliações, disputas comerciais e um imenso “toma lá dá cá”.