A alta do dólar é “ótima” para o Brasil e para a JBS e é um movimento que vai persistir pelos próximos anos, avalia o presidente da gigante global de proteína animal, Wesley Batista, em entrevista exclusiva ao Valor. Para o empresário, “entramos num ciclo de valorização do dólar”, reflexo da recuperação recente da economia americana em decorrência da melhora na balança comercial e da mudança da matriz energética dos EUA, entre outros fatores.
“Foram 10 anos de perda de valor do dólar em relação a outras moedas”, observa Batista. Nesse período em que o dólar perdeu terreno, os EUA ganharam competitividade – o que permite a atual recuperação – enquanto os países emergentes, entre eles, o Brasil “ficaram caros”, analisa o empresário.
A JBS, que anunciou mês passado a compra da Seara Brasil da Marfrig, aproveitou justamente o período em que o dólar estava fraco e fez aquisições importantes nos EUA, como a Swift Foods em 2007 e a Pilgrim’s Pride em 2009. “Talvez tenha sido um pouco de sorte. Compramos ativos que estavam se depreciando lá fora”, afirma.
Dessa forma, como boa parte das operações da JBS fica nos EUA, a fatia da receita em dólar é elevada, um dado favorável em tempos de alta da moeda americana. Hoje, segundo Batista, 65% das receitas da companhia são em dólar. O índice inclui as exportações feitas a partir do Brasil, que também ficaram mais competitivas, lembra o empresário.
Mas se favorece a receita, a alta do dólar também tem impacto nas dívidas em moeda americana, o que no caso da JBS alcança 70% do endividamento líquido, que era de R$ 15,678 bilhões no fim do primeiro trimestre deste ano. O quadro parece não incomodar a JBS. “Temos política de hedge. Considero que temos uma boa gestão sobre a exposição cambial do grupo”, assevera o presidente da JBS.
A empresa, aliás, foi questionada recentemente pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sobre o elevado volume de operações com derivativos no mercado. Sobre o tema, Wesley Batista diz que “a JBS continuará com a política de administração de riscos, utilizando instrumentos que o mercado oferece”.
A mudança no cenário do câmbio não é o único assunto que entusiasma o empresário, que entre 2007 e o início de 2011 comandou a JBS USA, nos Estados Unidos. A recente aquisição da Seara Brasil, que elevará o faturamento anualizado da JBS a R$ 100 bilhões, virou um dos temas mais importantes no dia a dia de Batista.
A compra da companhia, por meio da assunção de dívidas de R$ 5,85 bilhões da Marfrig, amplia a alavancagem (relação entre Ebitda e dívida líquida) da JBS, o que acentuou o mau humor dos investidores na bolsa, num momento em que o mercado estava em queda generalizada. Desde o dia anterior ao anúncio da aquisição (7 de junho) até ontem, as ações da empresa recuaram 8,7%, segundo levantamento do Valor Data, ainda que tenha havido alguma recuperação nos últimos dias. No mesmo período, o Ibovespa caiu 11,34%.
“As ações já estão voltando”, diz Batista, em referência à valorização dos papéis da empresa na bolsa a partir da última semana de junho. Ele afirma ver com “naturalidade” os movimentos de baixa do mercado que se seguem a aquisições. “Estamos um pouco escolados com isso. Já fizemos aquisições mais desafiadoras do que a Seara. Quando adquirimos a Pilgrim’s (em 2009), a ação dela estava em US$ 5,00. Agora está em US$ 15,00”, afirma.
“À medida que [o investidor] vai entendendo o negócio, isso se reflete nas ações”, avalia, em tom otimista o empresário, que tem reiterado o compromisso de desalavancagem da JBS. O indicador era de 3,4 vezes no fim do primeiro trimestre deste ano, mas alcança 4,4 vezes atualmente, conforme relatório do Bradesco sobre o setor de alimentos. A JBS já informou que buscará renegociar as condições da dívida da Marfrig que assumiu junto a bancos.
Convencer o investidor de que a Seara é um bom negócio é só mais um dos desafios da empresa. Outra tarefa é enfrentar a concorrente BRF. No mercado, fala-se que a Seara nas mãos da JBS deve ser uma empresa muito mais forte e competitiva do que era quando estava sob o controle da Marfrig.
Mas Wesley Batista não ignora a força da concorrente, toma a tarefa com a importância que ela tem e mostra humildade. “Estaremos muito focados em operar a Seara com nível alto de competitividade. Em produzir bons produtos com custo baixo, numa estrutura eficiente e enxuta, e em oferecer um alto nível de serviço ao clientes. O resto é consequência”, argumenta. “Nosso foco não é a BRF, somos nós mesmos”.
Questionado se a empresa pode disputar de igual para igual com a BRF no mercado doméstico, onde esta lidera em industrializados de carnes, Batista afirma que “toda empresa, de qualquer setor tem potencial para ganhar espaço de outra”, mas isso “é fruto do que se faz todos os dias. Não é de um dia para outro que se conquista o consumidor”. E acrescenta, referindo-se à BRF, que “não é de um dia para outro que se monta a plataforma de distribuição que a empresa construiu”.
No mercado externo, porém, a JBS consolida sua posição como a maior exportadora de carne de frango do mundo após a aquisição da Seara e vai usar sua ampla plataforma internacional para comercializar os produtos da empresa.
Com a aquisição da Seara, a JBS terá mais 39 unidades de produção no Brasil, entre frango, peru, suínos e alimentos processados. O número eleva a cerca de 120 o total de plantas da empresa só no Brasil. Segundo o presidente da JBS, ainda é cedo para concluir se serão necessários ajustes na operação da Seara. “Estamos fazendo um reconhecimento da empresa”.