Na véspera de decidir o destino da BRF- Brasil Foods, empresa de alimentos formada com a compra da Sadia pela Perdigão, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) ainda traça as linhas finais de um possível acordo com a empresa.
Após um período de negociações bastante duras, no qual o Cade estudou até a possibilidade de intervir na Sadia para determinar o desfazimento do negócio, a tendência do conselho é a de concordar com a venda de um pacote grande de marcas e ativos para uma companhia só de modo a criar um concorrente efetivo da BRF.
Essa venda deve ser aliada a outras medidas, como a suspensão da marca Perdigão.
O objetivo é que a empresa que adquirir os ativos da BRF e outros concorrentes que estão no mercado tenham melhores condições de disputar a preferência do consumidor na ausência da marca Perdigão.
Apesar de a suspensão de uma marca ter sido utilizada num caso famoso, nos anos 90, – a compra da Kolynos pela Colgate -, o Cade deve inovar na medida. No caso Kolynos, a Colgate soube ocupar o espaço deixado pela suspensão da marca e lançou uma outra, a Sorriso. Isso gerou críticas ao órgão antitruste, pois a Colgate logo criou outra marca para ocupar a participação de mercado que, antes, era da Kolynos, numa espécie de “drible” na decisão.
Agora, os conselheiros não querem que a BRF crie uma Sorriso para ocupar o espaço da Perdigão e estudam salvaguardas neste sentido, que vão desde restrições pontuais no uso da marca em vários mercados até a proibição geral da Perdigão por até cinco anos.
Segundo uma fonte que está acompanhando as negociações, a comparação com o caso Kolynos não faz muito sentido, pois aquele caso envolveu apenas o mercado de cremes dentais, enquanto, no atual, trata-se de marca que está presente em vários mercados. Outra diferença é que naquele caso não houve a proibição de a empresa lançar marca nova. Agora, o Cade está avaliando formas para que não surja mais uma Sorriso.
Além da suspensão da Perdigão e da eventual proibição de a BRF lançar marcas novas, o conselho estuda formas de vender marcas menores, como Resende, Confiança, Wilson, Escolha Saudável e Batavo. Por fim, o pacote do Cade também envolve a venda de cadeias inteiras de produção e de distribuição, que vão desde o sistema de abates de animais até a chegada do produto aos pontos de venda.
Essas cadeias são regionais e localizadas em diversos Estados, mas os conselheiros estudam vendê-las para uma companhia só. O objetivo é fazer com que a Brasil Foods tenha um concorrente nacional efetivo.
De acordo com outra fonte que acompanha as negociações, esse concorrente precisa ter escala de produção e de distribuição nacional, caso contrário não vai conseguir fazer frente à BRF. “As mini-BRFs (como estão sendo chamadas as cadeias) devem ser integradas”, afirmou essa fonte. “Elas não podem ser vendidas para várias empresas, senão elas não terão escala (para competir com a BRF)”, completou.
O julgamento da compra da Sadia pela Perdigão é o primeiro item da pauta de amanhã do Cade. Até aqui, houve apenas o voto do relator, conselheiro Carlos Ragazzo, e esse foi pela desconstituição do negócio. Falta o voto de mais quatro conselheiros.
O segundo item da pauta de amanhã é a compra da rede Sendas pelo Pão de Açúcar. A sessão terá início às 10 horas.
Cenário é ruim para venda de ativos
A venda de ativos pela BRF-Brasil Foods, para que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) aprove sua criação, pode não ser uma tarefa simples. A razão é que o setor de carnes de frango e suíno vive um momento de demanda retraída e incertezas no mercado externo, segundo analistas que acompanham esse mercado. Portanto, um cenário que não estimula grandes investimentos. E que pode pressionar negativamente os preços dos ativos.
Uma das condições negociadas com o Cade para que a compra da Sadia pela Perdigão seja autorizada é a venda de marcas da BRF, como Rezende, Confiança e Wilson, além de ativos de produção e de distribuição da empresa no país.
“Vai vender para quem?”, indaga uma fonte, com experiência de muitos anos nesse mercado. O nome da americana Tyson é sempre mencionado como empresa que deseja crescer no Brasil, onde entrou timidamente há quase três anos. Mas analistas divergem quanto ao ímpeto da empresa para dar tal passo. A americana demorou a entrar no país e quando entrou o fez adquirindo ativos de porte pequeno ou médio.
O nome da JBS, que não tem carne de frango nem de suínos no Brasil, também é lembrado por analistas do setor como uma potencial compradora de ativos. Um especialista que acompanha o dia a dia da gigante mundial de carne bovina diz que operações com escala, sinergia e marca poderiam ser atraentes para a JBS.
Ele afirma, no entanto, que dificilmente haveria interesse pela compra de marcas menos conhecidas, como a Rezende. “Nenhuma grávida vai acordar de madrugada para pedir produtos dessas marcas”, brinca, referindo-se a marcas como Rezende e Wilson.
O interesse de algum fundo de investimento por ativos da BRF também não está fora de cogitação, diz outra fonte do setor, já que esses investidores buscam boas oportunidades.
Além do cenário externo ruim para o setor de carnes, o quadro de instabilidade na economia global também é prejudicial para eventuais vendas de ativos.