A disputa entre Brasil e Estados Unidos, que levou a um recall de carne bovina industrializada brasileira em maio, ganhou um novo capítulo. Representantes do Ministério da Agricultura e de exportadores brasileiros reuniram-se segunda-feira e ontem (8) com técnicos do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA), em Washington, para discutir a metodologia de análise para detectar resíduos do vermífugo ivermectina na carne proveniente do Brasil.
Saíram das reuniões apontando que as divergências continuam, o que mantém a carne brasileira fora dos EUA – no fim de maio, o próprio ministério decidira suspender as exportações de carne industrializada brasileira ao país.
Segundo Otávio Cançado, diretor da Associação Brasileira da Indústria Exportadora de Carnes (Abiec), a metodologia usada pelos EUA, e que detectou resíduos do vermífugo acima do permitido em produto exportado pela JBS, não é sistematizada e nem reconhecida pelo Codex Alimentarius (organismo internacional de referência para a segurança dos alimentos).
Os métodos de análises reconhecidos pelo Codex preveem análise do fígado e do músculo do boi. Mas os EUA estão fazendo a análise do produto final (a carne processada), segundo o dirigente da Abiec. Antes, a informação no Brasil era que os EUA analisavam o músculo. No caso da análise do fígado (método usado no Brasil), o nível máximo de resíduos permitido é 100 partes por bilhão (ppb) e no músculo, de 10 ppb.
De acordo com Cançado, não é possível saber se 10 ppb no músculo é o mesmo que 10 ppb no produto final porque a carne bovina industrializada pode conter fígado, músculo e gordura.
Uma nova missão brasileira vai visitar laboratórios americanos no dia 21 deste mês para checar como é feita a análise para detectar a ivermectina, segundo ele.
O episódio levantou a questão sobre eventuais excessos no uso do vermífugo por pecuaristas. Segmentos da cadeia produtiva chegaram a pedir ao ministério que suspenda a comercialização da ivermectina no país até que a questão seja resolvida.
Há, no setor, quem acredite que a indústria farmacêutica tenha afrouxado o controle sobre o uso do produto, o que poderia levar à detecção de resíduos acima do permitido. A ivermectina foi desenvolvida pela Merial, que a comercializa com a marca Ivomec. A patente do produto já venceu e hoje outras farmacêuticas o fabricam. Depois disso, a Merial desenvolveu outro vermífugo, cujo princípio ativo é a ivermectina, mas com uma nova molécula. Estaria, então, privilegiando o produto.
A Merial nega. Segundo o diretor-técnico da empresa, Emílio Salani, a estratégia de vendas não se restringe à comercialização de um ou outro produto. “A empresa trabalha com a venda de orientações técnicas e usa um programa sanitário para se basear”. Ele explica que a equipe de vendas é formada por veterinários ou zootecnistas que escolhem o produto adequado, dentro da dosagem correta para ser utilizado em cada fase da vida dos animais.
Enquanto não se chega a um consenso sobre métodos de análise, o governo brasileiro vai apresentar um plano aos EUA que prevê a análise do produto no Brasil, pelos frigoríficos, para que as exportações possam ser retomadas, segundo Cançado.