O clima não era de festa na assembleia extraordinária em que associados da Corol, cooperativa de Rolândia, no Paraná, aprovaram a continuidade do processo que poderá resultar na união com a vizinha Cocamar, de Maringá.
“Coma dessa comida ou saia pela janela”, falou o produtor de laranja, café e cana, Otacílio Campiolo, reproduzindo o que diz ser um ditado italiano. “A Corol, por si só, não sobrevive”, opinou ele em seguida, pouco antes do começo da reunião, realizada na sede da cooperativa no dia da estreia da Copa do Mundo.
O avanço dos estudos para o projeto “3 em 1” – que inclui a Cofercatu, de Porecatu, e levará a mais assembleias nos próximos meses -, foi aprovado por unanimidade, mas nem todos estão felizes com a ideia. “Não vejo vantagem, mas estou de acordo. Vamos saber se isso é bom com o tempo”, resignou-se Elza Martini, professora aposentada e produtora de cana e soja.
“Agora, é torcer para dar certo”, disse Bento da Silva, que planta soja e trigo. “Será o melhor para a cooperativa”, afirmou Elizeu Santana, que também lida com grãos. O edital falava da possibilidade de incorporação ou participação em nova sociedade, mas o termo fusão era o único admitido pelos que foram à reunião. O sentimento desses produtores ligados à Corol – e de outros da Cocamar que se mostraram inseguros com a união -, retrata um pouco das relações no cooperativismo.
O que os agricultores mais querem é agregar valor aos produtos que cultivam e ter bons serviços no fornecimento de insumos e armazenagem. Mas o movimento de modernização das cooperativas agropecuárias do Paraná, que tiveram receitas de R$ 21,1 bilhões em 2009, menos que em 2008 mas o dobro de dez anos atrás, está ganhando um novo capítulo, que deve resultar na consolidação do segmento e na redução do número de organizações.
“Trata-se da intensificação do que elas começaram lá atrás”, diz Gilmar Lourenço, coordenador do curso de Economia da FAE Centro Universitário, de Curitiba, ao citar que as cooperativas já foram forçadas a passar por modernização, profissionalização, incorporações e enxugamento de custos nas duas últimas décadas – a venda da Batavo para a Parmalat foi um dos casos mais conhecidos.
Para ele, o movimento de fusões e aquisições é inevitável. “Daqui a dez anos não vão sobrar mais que cinco cooperativas no Paraná”, prevê o professor, que cita a necessidade de ganhar escala e reduzir gastos e acredita que, em nichos específicos podem sobreviver algumas menores.
No Paraná, a atenção sobre as cooperativas é grande porque elas são vitais para a economia do Estado, que sempre disputa a liderança da produção nacional de grãos. Elas recebem 56% dos grãos produzidos, volume que tem crescido ao longo dos anos – eram 40% em 1990. Há dez anos, a produção ligada a elas era de 10 milhões de toneladas de grãos e, em 2009, foi de 16,6 milhões de toneladas. No período, elas elevaram as exportações e a presença no varejo, com marcas próprias.
A tendência, segundo especialistas ouvidos pelo Valor, é de que as multinacionais da área não entrem no processo de consolidação, porque as cooperativas costumam ter menos conflitos com produtores.
“Esse movimento de fusão e aquisição deve ser intensificado nas cooperativas pequenas por necessidade de economia de escala e melhor gestão e, nas de porte médio, para resolver problemas de endividamento”, diz Judas Tadeu Mendes, Ph.D em economia e presidente da Estação Business School.
Mendes fez um diagnóstico das cooperativas em meados dos anos 90. “Naquela época eu já dizia aos presidentes que vendendo grãos ninguém ia sobreviver”. Segundo ele, deve acontecer aqui o que ocorreu nos EUA. “Lá eles tiveram mais de 10 mil cooperativas e foram desaparecendo 250 por ano, ficando quatro grandes regionais.” Agora, é preciso avançar em industrialização para encarar as grandes multinacionais.
Os próprios executivos de cooperativas concordam que mais mudanças vão acontecer. “É um caminho natural. Junções e incorporações estão ocorrendo no mundo inteiro e cooperativas precisam ser tão boas como qualquer empresa”, defende o presidente da Cocamar, Luiz Lourenço.
“Não sei em qual prazo, mas que vai diminuir o número de cooperativas, isso vai.” Para Lourenço, não se trata de opção apenas para as endividadas, mas para as que precisam dar mais apoio ao produtor.
“Até agora foi pela dor, por problemas de gestão, por investimento mal feito e especulação no mercado financeiro”, diz. “Mas o futuro só interessa aos fortes. Os fracos não sobreviverão”. A Cocamar acredita que é possível explorar melhor a área atendida pela Corol, que recebe 20% da soja da região – enquanto a Cocamar recebe 70% em sua área.
Para o presidente da Corol, Eliseu de Paula, a fusão é um bom caminho “para que os fardos fiquem mais leves”. “É o modelo que o cooperativismo tem de seguir”, diz ele, que fala em criar uma nova cooperativa com a união das três e evita comparações com outras fusões de empresas.
“Somos uma sociedade de pessoas, não de capital.” Questionado se erros levaram a Corol a acumular dívidas de R$ 360 milhões, o executivo cita fatores externos, como crise internacional, falta de capital de giro e problemas climáticos, além de atraso na duplicação da usina de álcool, em 2009, por falta de equipamento. A usina está à venda.
A Cocamar tem 6,1 mil cooperados e fatura R$ 1,4 bilhão, enquanto a Corol conta com 7,5 mil cooperados e receita de R$ 600 milhões – juntas, portanto, elas somarão R$ 2 bilhões em faturamento, meta que havia sido traçada pela Cocamar para 2015, e terão uma área de 500 mil hectares cultivados com soja.
A esse valor devem ser acrescentados R$ 200 milhões da Cofercatu (que negociou recentemente sua usina com o grupo Alto Alegre). A meta é que, juntas, as três consigam receita de R$ 3 bilhões em três anos. Se, na continuidade do processo, o que acontecer for mesmo uma fusão, será a primeira do gênero entre cooperativas paranaenses.