Redação (24/03/2009) – Os efeitos da queda brusca das exportações de carne de frango a partir do fim do ano passado não se limitaram às férias coletivas de dez a 15 dias concedidas para quase 2 mil dos 4,7 mil funcionários da plantas da Doux Frangosul em Montenegro e Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, entre fevereiro e abril. Com a retração das vendas e as dificuldades para financiamento de capital de giro decorrentes da crise econômica, a empresa aumentou de 30 para até 90 dias o prazo de pagamento pelos lotes de aves recebidos dos criadores integrados no Estado.
Representantes de sindicatos de trabalhadores rurais que reúnem integrados da Doux dizem que a empresa prometeu colocar os pagamentos em dia em dois meses. A regularização seria possível graças a um contrato de exportação fechado com a China, que em janeiro habilitou 22 abatedouros brasileiros, dos quais dois da Doux, para vender para aquele país. Em 2007, de acordo com o último balanço divulgado, as vendas externas da multinacional francesa representaram 78% do faturamento bruto de R$ 1,55 bilhão no Brasil.
Procurada pelo Valor, a coordenadora de marketing internacional da empresa, Eveline Caria, respondeu por e-mail que "no momento" não confirma a informação sobre esse contrato. Por intermédio de sua assessoria, a Doux também disse que espera retomar o ritmo normal de produção em abril, depois da queda de 50% em dezembro na comparação com os dois meses anteriores. Neste mês de março, o índice de retração já está em apenas 20%, tomando o mesmo período como base de comparação.
Joaquim Weber, presidente do sindicato dos trabalhadores rurais de Tupandi (RS), município a 33 quilômetros da sede da Doux, em Montenegro, explicou que a empresa pagou na semana passada pelos frangos recebidos no fim de dezembro. Um criador da região, que pediu anonimato, disse que tem dois lotes de cerca de 20 mil aves para receber. O mais antigo deles foi entregue à Doux na primeira semana de janeiro, num valor total de quase R$ 9 mil.
Vinculado à empresa há 15 anos, o produtor afirmou que nunca havia enfrentado atrasos de pagamento tão longos. No fim do ano passado, ele investiu R$ 15 mil do seu próprio bolso para modernizar o aviário. De acordo com ele, a avicultura é a sua principal fonte de renda e a demora para receber pelos lotes já o obrigou a renegociar com o banco a quitação de dívidas com o Pronaf, o programa de financiamento do governo federal voltado à agricultura familiar. "Mas com a crise não é hora de mudar de empresa", comentou.
Conforme Weber, as entregas de pintos para alojamento, que tradicionalmente ocorriam a cada dez ou 15 dias, chegaram a sofrer intervalos de mais de 30 dias com a crise, mas agora estão retornando ao ritmo normal. Os preços pagos pelas aves prontas para o abate permaneceram na faixa de R$ 0,22 a R$ 0,23 por cabeça, mas "o problema é o atraso nos pagamentos, porque muitos criadores fizeram investimentos nos aviários", explicou o dirigente.
Em Tupandi, pequeno município com pouco mais de 3 mil habitantes, localizado a 82 quilômetros de Porto Alegre, mais de 200 famílias dedicam-se à avicultura integrada, das quais mais de 70% são vinculadas à Doux, relatou Weber. Na região de Lajeado, que inclui quatro municípios na base do sindicato local dos trabalhadores rurais, são 240 criadores divididos entre várias empresas e apenas os ligados à multinacional francesa enfrentam problemas de atraso de pagamento.
"Alguns já não têm mais fôlego [financeiro] para aguentar", disse o presidente do sindicato de Lajeado, Adilson Metz. De acordo com ele, o ritmo dos alojamentos começa aos poucos a se normalizar, mas a empresa ainda não deu uma previsão sobre o fim dos atrasos nos pagamentos.