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Comentário

Erros grosseiros no Índice de Sustentabilidade de Alimentos - por Marcos Jank

Indicadores conceitualmente equivocados rebaixam o Brasil em índice feito pela The Economist e a Barilla  

São Paulo-28.04.2009-Marcos Sawaya Jank,presidente da UNICAfoto.Niels Andreas
São Paulo-28.04.2009-Marcos Sawaya Jank,presidente da UNICAfoto.Niels Andreas

A EIU (Economist Intelligence Unit), divisão de dados da revista “The Economist”, lançou recentemente o Índice de Sustentabilidade de Alimentos. Patrocinado pelo Centro Barilla para Alimentos e Nutrição, o índice é composto por 34 indicadores usados para ranquear 25 países em três grandes áreas: perdas e desperdício de alimentos; agricultura sustentável; saúde e nutrição. Trata-se de uma iniciativa relevante e inovadora, que chega em boa hora.

Surpreendentemente o Brasil foi classificado numa das piores posições: 20º lugar. Em agricultura sustentável, área em que avançamos mais do que qualquer outro país nos últimos anos, fomos puxados para baixo por indicadores conceitualmente equivocados ou de mensuração altamente questionável. A saber:

– Impacto ambiental da agricultura na terra: fomos punidos pelo uso elevado de fertilizantes e agroquímicos. Ora, corrigir e adubar solos e combater pragas e doenças deveria dar nota alta, e não baixa, principalmente em zona tropical, onde se plantam duas safras por ano. Alta tecnologia, se bem utilizada, aumenta a produção e poupa terra. Nos trópicos, é o que separa quem deu certo e quem fracassou.

– Uso da terra: segundo o indicador, seriam sustentáveis os países que têm maior área relativa ocupada com produção orgânica. O contrassenso é evidente: como a produtividade da agricultura orgânica é notoriamente menor do que a da agricultura convencional, ela fatalmente acabará demandando maiores extensões de terra, leia-se desmatamento adicional, além do impacto do maior custo do alimento final. Aqui não aparece nenhuma referência ao percentual da área de cada país preservada com florestas (onde somos campeões mundiais) ou à obrigatoriedade de manter reservas florestais em cada propriedade rural, que só existe no Código Florestal brasileiro.

– Qualidade dos subsídios agrícolas: as políticas protecionistas da Europa, do Japão e da Coreia do Sul são muito mais dispendiosas e distorcivas que as da Austrália, da Argentina e do Brasil. Basta ver os estudos da OCDE ou checar as notificações na OMC. Sem comentários.

– Diversificação do uso da terra: com toda a nossa experiência acumulada na rotação de culturas, na integração lavoura-pecuária e duas a três safras por ano na mesma área, recebemos “nota zero” nesse conceito. Inacreditável terem proposto um método de mensuração que não faz sentido, e ainda com contas erradas.

– Impacto da produção de rações animais e biocombustíveis no uso da terra: as teses absurdas desse indicador são: a) as rações servem para produzir proteínas animais (carnes e lácteos), produtos que por definição seriam “insustentáveis”; b) a bioenergia é ruim para o meio ambiente porque prejudica a produção de alimentos, independentemente se ela gera energia renovável ou é feita de milho, cana-de-açúcar ou biomassa.

Na parte de nutrição e saúde, o indicador para “adoção de dietas não saudáveis” é a população do país dividida pelo número total de restaurantes das cadeias McDonald’s, KFC e Burger King. Ora, basta ver as filas que se formam nesses restaurantes nas cidades em que o cidadão não acha os alimentos com a origem e o padrão de qualidade e sanidade oferecido por essas redes.

Enfim, não surpreende que o patrocínio de um trabalho com vieses tão claros —como essa visão preconceituosa contra proteínas animais— venha de uma das principais empresas que vendem carboidratos no mundo, que é líder mundial em macarrão e com significativa participação nos segmentos de pães e biscoitos.

Difícil mesmo é entender por que a área de dados da “Economist” não checou seriamente a pertinência dos indicadores propostos ou ao menos abriu o debate sobre esse índice para círculos científicos fora da Europa.