Al-haj Abbas Al-Rubaie e Falah H. Habeeb embarcaram em Bagdá, encararam duas horas de voo até Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, e outras 14 até São Paulo, onde chegaram no domingo. Em três dias visitaram quatro frigoríficos no Rio Grande do Sul e no Paraná, e outras três companhias em Minas Gerais e de novo no Paraná os esperam na próxima semana. Já acertaram a aquisição de mil toneladas de carne de frango, e outras mil ainda deverão ser contratadas.
Abbas, que nunca havia estado no Brasil, é gerente-geral da empresa iraquiana Barakat Al-Najaf for General Trading. Seu colega, também estreante em viagens ao País, é gerente da Alguida Trading. As companhias são parceiras, e os dois executivos garantem que esta primeira visita é o início de um relacionamento duradouro. “É apenas a primeira de mil viagens!”, exagera Abbas.
Como Abbas e Habeeb, dezenas de outras empresas de comércio exterior do Iraque vêm intensificando o envio de representantes ao Brasil interessados em uma gama grande de produtos, mas sobretudo alimentos como carnes de frango e bovina, ovos, pescados açúcar e café descafeinado.
Esta maior aproximação foi deflagrada em 2003, com a abertura da economia depois do fim do governo de Saddam Hussein. Mas começa a ganhar força agora, com a ampliação de investimentos do Iraque em infraestrutura básica como rodovias e energia elétrica – particularmente no caso de produtos que precisam de refrigeração para serem armazenados.
Nawfal Assa Mossa Alssabak, vice-presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Iraque, explica que o mercado consumidor iraquiano há tempos é um dos maiores do Oriente Médio, e que até hoje parte das exportações para o país chegam por outras portas de entrada melhor estruturadas na região por causa da precária infra-estrutura iraquiana.
Nas estatísticas brasileiras de comércio exterior, muitas vezes as oscilações dos embarques para Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Kwait, por exemplo, tem relação com o comportamento do mercado iraquiano. “Isso já começou a mudar. Nos próximos três anos, teremos mais energia e estaremos importando mais alimentos e estocando”, diz Alssabak.
De acordo com ele, o consumo de carne de frango no Iraque chega a 50 mil toneladas por mês. No exterior, o fornecedor mais importante é o Brasil, que no primeiro semestre embarcou ao país 71 mil toneladas, 135% mais que em igual intervalo de 2008. Foi, de longe, o maior incremento entre os principais destinos das exportações brasileiras de frango. Na divisão por regiões do mundo, no topo do ranking das exportações de frango do Brasil está o Oriente Médio.
Conforme Alssabak, a melhoria na infraestrutura tem maior peso na atual aceleração das importações de carne de frango do que a abertura economica de 2003, que cortou os subsídios antes oferecidos aos produtores do país e que eram vitais para garantir a competitividade do produto doméstico.
Adriano Zerbini, gerente de relações com o mercado da Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frangos (Abef), lembra que o grosso das vendas para o Iraque – e para o Oriente Médio em geral – é de frango inteiro com peso entre 1 quilo e 1,2 quilos. A tonelada do galeto chega ao atacado do Iraque por cerca de US$ 1,6 mil, quase US$ 1 mil abaixo do valor negociado pelos locais.
O frango inteiro é menos valorizado, por exemplo, do que o nobre peito de frango preferido pelos europeus. Mas, em compensação, nada nele se perde – e o relacionamento com o Oriente Médio é muito menos suscetível a barreiras comerciais do que com a Europa.
“Nunca tivemos problemas no Iraque. O Oriente Médio já é um mercado tradicional e consolidado para o frango brasileiro”, diz. O custo é uma das vantagens. A outra, que para os iraquianos é tão importante quanto a primeira, é o respeito dos exportadores do Brasil às regras islâmicas de abate. Segundo Faisal Saleh Hussein, diretor da Barakat no Brasil, trata-se de um fator que faz enorme diferença. “Nossa confiança é total”.
Em boa medida, a confiança no Brasil decorre da crescente pressão global contra o abate “halal”, considerado por algumas correntes uma afronta ao bem-estar animal. O problema é que, segundo a milenar tradição árabe, afronta é se o abate não for desta forma. “Halal”, em árabe, significa “legal”, “permitido”, e quase todos os alimentos são considerados “halal”. Animais como bois e frangos só entram nesta categoria se forem abatidos de acordo com os rituais islâmicos (Zabihah), como explica a Abef.
Segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), as exportações brasileiras de carne de frango para o Oriente Médio, alcançaram 914 mil toneladas de janeiro a agosto de 2009, 20% mais que em igual intervalo de 2008. No mesmo período, as importações iraquianas de produtos brasileiros em geral somaram US$ 422 milhões, já acima de todo o ano passado (US$ 377 milhões).
Segundo Alssabak, da Câmara Brasil-Iraque, a carne de frango representa entre 30% e 40% do valor total das importações. Uma feira internacional em Bagdá, em novembro, poderá ampliar o comércio bilateral. Isso sem contar as outras 999 viagens prometidas por Al-haj Abbas Al-Rubaie.