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Agroindústrias

Gestão familiar criou problemas e marca valiosa

O olho do dono é o que fez a história de crescimento da Sadia.

Dois enormes quadros na sede da Sadia não deixam ninguém esquecer os 65 anos de história. Estão lá, estampadas, a ata da formação da sociedade anônima Sadia, em 7 de junho de 1944, com a assinatura do fundador Attilio Fontana, e a foto do moinho original do negócio, na cidade de Concórdia, interior de Santa Catarina. O nome surgiu da soma da sigla S.A. com a última sílaba de Concórdia.

O olho do dono é o que fez a história de crescimento da Sadia. Um moinho e um frigorífico foram transformados por descendentes de italianos, neste mais de meio século, na maior companhia de alimentos industrializados do país, com faturamento anual de R$ 11 bilhões. Para gerar essa receita, são 18 unidades produtivas, em oito Estados, uma fábrica na Rússia, um portfólio com cerca de 700 produtos, comercializados em mais de 300 mil pontos de venda e em mais de 100 países.

Mas essa proximidade do controlador do negócio que fez fermento para a expansão é também o alimento das críticas à administração nos dias atuais, em que profissionalização e independência são fatores-chave para a credibilidade no mercado, para o qual a empresa deve satisfação desde a abertura de capital, em 1971.

Em Concórdia, ninguém tem dúvidas de que a empresa tem dono e sabem bem que ele é. No jardim da unidade produtiva que serve de sede está lá a casinha de madeira em que viveu Fontana no começo do negócio. Nas ruas da cidade, há o memorial ao fundador, no que foi a nova residência da família fundadora. Esse culto não é sem razão, já que a cidade e a região vivem literalmente da companhia, tanto como empregadora da população como fonte de arrecadação municipal.

O clima de gestão familiar, ao passo em que criou empatia no consumidor e produziu uma das marcas brasileiras de consumo mais valiosas, gera desconfianças entre os investidores. E o passar do tempo trouxe problemas de confiança e disputas para dentro da família, que se multiplicou, assim como os números da empresa.

Depois de sofrer com isso na década de 90, os parentes conseguiram ao menos se unir em 1999 em torno de um acordo de acionistas. São 62 signatários, que reúnem 57,3% das ações ordinárias. A soma dos papéis em poder dos familiares, porém, chega a 77,5% do capital votante e a 32% do capital total. As disputas, contudo, continuaram e continuam existindo.

O sucesso industrial da empresa, que começou com 60 funcionários e hoje tem 60 mil, foi financeiramente abalado nos últimos anos, junto com a credibilidade da família como administradora, já que esteve envolvida ou ciente das decisões que trouxeram problemas à empresa.

Antes do episódio derradeiro dos derivativos, que levou a companhia a perder de uma só vez R$ 2,6 bilhões e a ter de aceitar condições inimagináveis no passado para se vender à concorrente Perdigão, houve outros exageros que prejudicaram a imagem da empresa do ponto de vista da governança empresarial. A surpresa dos prejuízos foi a gota d’água.

Mas antes dela, o apetite a risco da empresa e de seus diretores já eram de conhecimento do mercado, pois houve perdas com aplicações (em proporções muito menores) e a exposição da imagem da empresa no caso de informação privilegiada na tentativa de aquisição da rival Perdigão, por meio de uma oferta hostil, em 2006.

Assim, os derivativos afetaram de vez o futuro dos negócios, além de levar a companhia ao primeiro prejuízo anual em toda sua história, de R$ 2,5 bilhões em 2008. A perda de credibilidade na governança da empresa há tempos pesava no seu preço em bolsa, especialmente após a migração da concorrente Perdigão para o Novo Mercado, há três anos.

Mas nada disso, aparentemente, chegou às gôndolas dos supermercados. Chegará agora, junto com a Perdigão.