Na “Cidade dos Açougueiros”, um dos bairros mais chiques e promissores de Louisville, os açougues não são mais bem-vindos.
A área de cerca de 2,5 quilômetros quadrados na margem leste do centro da cidade recebeu seu nome, Butchertown, dos matadouros que ali se fixaram desde os anos 1820. Hoje ela abriga galerias de arte e lojas chiques – mas continua sendo o endereço de um matadouro da JBS SA, uma instalação de 43 anos que emprega cerca de 1.300 pessoas.
Um dia desses, a unidade exalava um cheiro de estábulo que passava por sobre as roseiras que enfeitam as calçadas. Grunhidos de porcos se alternavam com o som dos carros que passavam na rua. Caminhões carregados de porcos entravam no frigorífico para descarregar.
Do outro lado da rua uma antiga fábrica de sementes, agora chamada Butchertown Market, vendia enfeites de Natal e sabonetes franceses. Pouco adiante, a Cs’ Kitchen & Pantry servia sanduíches, pêssego em calda e sorvete com sabor de bourbon.
Charlotte Noel e Chris Sundberg abriram a loja em 2006, em parte porque gostaram do charme do bairro, com sua atmosfera “bacana, tipo retrô anos 50”, diz Sundberg. “O matadouro é a praga da nossa existência’, diz Noel, sentada ao lado de um porco de cerâmica de um metro de altura, que ela chama de Prissy, “a única porquinha boazinha de Butchertown”.
A Associação dos Amigos de Butchertown quer que o JBS, que tem sede em São Paulo, transfira seu matadouro – e sua folha de pagamento de US$ 40 milhões anuais e seus quase US$ 100.000 em impostos prediais – para outro lugar. “É um aborrecimento constante para as pessoas da área”, diz Jon Salomon, de 34 anos, morador de Butchertown e advogado que representa a associação de bairro. “Não queremos ver ninguém, especialmente nestes tempos difíceis, no olho da rua. Mas (…) temos de ver que tipo de crescimento econômico é bom para nosso bairro.”
Jerry Abramson, que há muito tempo é prefeito de Louisville – que fica no Estado de Kentucky, no sudeste dos EUA -, diz que não deseja que o matadouro desapareça por completo, mas apenas que encontre um novo lar, de preferência nas redondezas. “Especialmente nesta recessão, não é hora de mandar as pessoas se mudarem a daqui”, diz.
A JBS, que comprou o matadouro em 2007 ao adquirir a americana Swift & Co., afirma que vai lutar para manter o frigorífico
onde está. “Esse frigorífico é parte integrante da economia de Louisville” diz Chandler Keys, porta-voz da empresa. Construir um novo pode custar US$ 400 milhões e levar meses ou anos.
O matadouro da JBS processa uns 10.000 porcos por dia, fabricando presunto e outros produtos suínos que são transformados em bacon e salsicha em outros lugares. O frigorífico é o terceiro maior empregador industrial do Louisville, depois da Ford Motor Co. e da General Electric Co.
No ano passado a JBS começou a construir um nova caldeira e um local fechado para descarga dos animais. Autoridades municipais ficaram sabendo que a empresa não pediu alvará para essa construção. Em 31 de agosto a JBS, dizendo que havia errado de boa fé, pediu à comissão de zoneamento que deixasse o projeto seguir adiante. A associação de bairro argumentou que uma vez que a JBS começou ilegalmente, não deveria ter permissão de continuar.
A comissão votou para permitir que a JBS continuasse, com algumas pequenas mudanças. A comissão também exigiu que a JBS gaste US$ 137.500 em projetos de embelezamento, tais como plantar arbustos para conter os odores.
A JBS processou a comissão de zoneamento no Tribunal de Circuito do Condado de Jefferson, afirmando que a exigência da comissão para que faça reformas urbanísticas era “arbitrária e caprichosa”. A associação de bairro também processou, dizendo que a comissão permitiu erradamente que a empresa modificasse sua “permissão condicional de uso”, que rege o funcionamento do frigorífico. Os processos estão pendentes. Hoje, a comissão de zoneamento ouvirá depoimentos – tal como exigido pelas leis estaduais de Kentucky- para decidir se revoga ou não a permissão condicional.
Se a comissão revogar a licença, a JBS vai recorrer, diz Keys, o porta-voz da empresa. “Acabar com isso só por causa de queixas da vizinhança é uma questão muito delicada”, diz ele. “Nós estamos muito relutantes” em desistir da luta.