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Economia

Megablocos podem afetar agricultura brasileira, diz executivo

Marcos Jank, da BRF, diz que Brasil ficou "travado" na busca de acordos.

São Paulo-28.04.2009-Marcos Sawaya Jank,presidente da UNICAfoto.Niels Andreas
São Paulo-28.04.2009-Marcos Sawaya Jank,presidente da UNICAfoto.Niels Andreas

Marcos Sawaya Jank, diretor global de assuntos corporativos da BRF, quarta maior empresa exportadora do Brasil, veio a Bali acompanhar as negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC) e acabou sendo atraído por discussões paralelas sobre mega-acordos regionais de comércio em gestação. “O impacto desses megablocos regionais sobre o agronegócio brasileiro é gigantesco”, disse Jank, notando que eles podem tirar mercado do Brasil em favor de concorrentes como EUA, Austrália, Canadá, Nova Zelândia, México e Chile. “O mundo avançou muito e nós ficamos travados.”

Para Jank, mesmo se sair um acordo na OMC, em Bali “o Brasil não vai ganhar nada” em termos de liberalização. Em contrapartida, vai ser afetado com o que vem a seguir fora da OMC. “E não é algo para cinco ou dez anos, é para estar pronto em breve”, diz.

No sábado, após a conclusão da conferência ministerial da OMC, EUA, Japão e outros dez países vão tentar fechar a Parceria TransPacifica (TPP), em reunião em Cingapura. A TPP visa abolir tarifas e integrar economias na região Ásia-Pacífico até 2015. Pode emergir daí um bloco, que cobrirá quase um terço do comércio global. Uma semana depois, negociadores dos EUA e UE vão se reunir para prosseguir negociações de um acordo que tende a ser ainda mais amplo.

“Os grandes acordos estão acontecendo nesse momento de forma discriminatória para o Brasil e é superpreocupante”, afirma Jank. O destino dos produtos agrícolas também mudou em 12 anos, desde que a Rodada Doha de liberalização comercial foi lançada na OMC. Em 2000, o agronegócio brasileiro exportava US$ 20 bilhões, dos quais 60% para EUA e UE. Em 2012, o setor exportou US$ 100 bilhões – 50% para a Ásia e 30% para EUA e UE, onde estão sendo construídos esses grandes acordos.

Jank lembra que, quando Doha foi lançada, o Brasil navegava a pleno vapor no mundo dos acordos megarregionais, com as negociações simultâneas da Área de Livre Comércio das Américas (Alca) e UE-Mercosul. A estratégia era garantir acesso a mercados por meio desses grandes acordos e melhores regras de comércio pela OMC.

“A OMC é fundamental como tribunal multilateral para resolver disputas comerciais, das quais o Brasil tanto se beneficiou no passado”, diz. “É também fundamental para a construção de regras gerais em temas sistêmicos, como o tratamento dos subsídios agrícolas. Os países não vão reduzir subsídios em acordos bilaterais ou regionais, pois estariam entregando-os de graça para os países que não participam desses acordos. Vão fazê-lo unicamente na OMC.”

O problema, segundo Jank, é que, antes, a preocupação estava apenas no disciplinamento dos subsídios dos países desenvolvidos. ‘Hoje, os países em desenvolvimento aprenderam com os desenvolvidos e praticam subsídios enormes, buscando todo tipo de exceções, como quer a Índia, nossa parceira de negociação”, afirma.

Para piorar, a OMC se enfraqueceu tanto que já não terá capacidade de produzir regras de comércio e acesso a mercados, por causa dos “tratamentos diferenciados” e “exceções” que os países construíram, avalia Jank. Ao seu ver, se a OMC sobreviver à reunião de Bali, terá muito pouco a entregar em termos de redução do protecionismo e liberalização efetiva. ‘Se não sobreviver, se tornará irrelevante, uma organização ‘zumbi’, que só servirá para gerar discursos vazios”, diz.

Para Jank, se a reunião de Bali fracassar, quem vai “jogar a pá de cal” na OMC são os acordos megarregionais gestados em paralelo à conferência, principalmente as parcerias Transpacífico (TPP) e Transatlântico (TTIP). “Esses acordos representarão um desastre para o Brasil, pois estamos fora do mundo dos acordos megarregionais e o disciplinamento de regras na OMC será pífio”, avalia.

Os acordos megarregionais, para Jank, representam uma nova arquitetura de comércio, com integrações mais profundas que a proposta na OMC e atendimento às novas exigências das cadeias globais de suprimento. Além de acesso a mercados de produtos e serviços, cobrem áreas como investimentos, competição, compras governamentais, entre outras. Além disso, os novos mega-blocos vão realizar um processo chamado de “convergência regulatória” – uma forte harmonização das “regras do jogo” entre os países-membros, o que pode produzir resultados ainda mais poderosos, em termos de criação de comércio, do que uma mera redução tarifária, nota Jank.

No caso do agronegócio, a redução tarifária e a convergência regulatória na coordenação de padrões técnicos e sanitários entre EUA e Europa, ou EUA e Sudeste da Ásia, podem, juntas, “deslocar” o Brasil desses grandes mercados, em favor de quem está nesses acordos.