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Agroindústrias

'O mais preocupante é a competitividade', diz presidente da JBS

O país atravessa o pior ano das últimas duas décadas e a crise econômica afeta parcialmente as operações da JBS.

'O mais preocupante é a competitividade', diz presidente da JBS

O país atravessa o pior ano das últimas duas décadas e a crise econômica afeta parcialmente as operações da JBS, maior empresa de proteína animal do mundo. Nos últimos dois meses, a empresa fechou cinco frigoríficos de carne bovina no país. 

Mas o presidente da companhia, Wesley Batista, diz que a crise econômica não é o que mais preocupa. “Todo ajuste é dolorido, mas achamos que em 2017 ou 2018 o país volta para o trilho. O que nos preocupa é que o Brasil está perdendo competitividade”, diz Batista, que lidera os negócios de uma empresa presente em mais de 20 países. 

No exterior, a disposição de investir continua alta. Nos últimos 30 dias, fez duas aquisições na Europa e nos EUA que somaram US$ 3 bilhões e serão pagas com os R$ 14 bilhões em caixa e financiamento nos EUA. “Acessar o mercado de capitais de outros lugares do mundo, sem o custo Brasil, é um benefício da JBS”, diz. 
Em entrevista à Folha, ele ainda defendeu a nova campanha publicitária da Seara, a marca de alimentos industrializados da JBS, que gerou polêmica com a rival Sadia. “Para mim, ‘S’ é de Seara.” 

Folha – Como está o mercado brasileiro de proteína animal?

*Wesley Batista – * O segmento de carne bovina passou o semestre mais difícil dos últimos anos. Houve uma queda muito grande das exportações e a economia brasileira está num momento super desafiador, com um PIB negativo. Os consumidores estão olhando opções para manter a proteína dentro de casa gastando menos, mudando para o frango. Com a junção das duas coisas, a indústria está passando por um momento difícil. A carne tem um custo… 
E não dá nem para baixar preço porque o custo continua elevado?

O preço vem baixando um pouco nos últimos meses porque não tem demanda. Está faltando boi e sobrando carne. Eu estou nesse negócio há mais de 25 anos e eu nunca tinha visto a combinação tão severa de queda nas exportações e do consumo interno. O lado positivo é que a JBS Foods [que inclui carne de frango] vai bem, com a maior procura no mercado pelo frango. Nas exportações, os focos de gripe aviária nos EUA e no México estão beneficiando o Brasil, que está exportando mais para a Coreia, para o Japão…

Essa combinação ruim na carne bovina está resultando no fechamento de unidades?

Está faltando boi e sobrando carne. Não está vendendo. Vai fazer o que, com a economia brasileira do jeito que está indo? A indústria está se ajustando. 

A JBS interrompeu a produção em quantas unidades?

Cinco. 

Elas fecharam?

Sim, essas cinco pararam. Não esperávamos essa queda tão brusca das exportações atrelada com um mercado doméstico tão… Estávamos crescendo em bovinos, abrimos fábricas, compramos empresas. Nós tivemos uma surpresa. 

O que surpreendeu mais? A queda das exportações ou a do consumo interno?

As exportações. No fundo, erramos. Achamos que a exportação seria mantida e que o mercado doméstico não estaria tão pressionado. Achávamos que o Brasil não cresceria neste ano, mas teria um PIB negativo de 0,5%… Agora estamos falando de 2% de queda no PIB. A coisa está cada dia mais difícil. Se tivéssemos previsto um cenário tão desafiador, talvez não tivéssemos feito aquisições e aberto plantas como fizemos. 

Como o sr. vê o atual momento econômico?

Somos uma empresa otimista, mas não adianta tapar o sol com a peneira. Temos uma realidade super desafiadora no Brasil. 2015 está sendo um dos anos mais difíceis das últimas duas décadas. Nós acreditamos muito na capacidade de recuperação. Se você me perguntar como está a curto prazo, eu respondo que está difícil e vai ficar difícil. No médio prazo, em 2017 ou 2018, o Brasil volta para o trilho. Este é o ano mais difícil do ciclo. Não mudamos a nossa estratégia de investimento porque estamos olhando para frente. Se fôssemos olhar para este ano e tirar uma fotografia, nós teríamos parado. Agora, estamos fazendo os ajustes que são necessários. Como diz o ditado, você tem que dançar conforme a música. Todo ajuste é complicado, no setor público ou no privado, é sempre dolorido, causa estresse. 

Então o sr. acha que a situação melhora no médio prazo?

Nos preocupamos menos com o momento e mais com o caminho. O juro está alto porque tem que ficar alto momentaneamente. A inflação está alta e tem que voltar para a meta. Em um, dois, três anos o juro pode voltar para níveis mais acessíveis. A economia vai decrescer, mas daqui a pouco vai ajustar. O que mais nos preocupa é a competitividade brasileira. O Brasil está perdendo competitividade e precisa de reformas estruturais. Esse é o tema que mais nos preocupa. 

O ambiente para negócios está piorando?

Estamos regredindo na área tributária, trabalhista… As relações trabalhistas estão a cada dia mais litigiosas, está mais incerto. Quando olho para os últimos dez anos, hoje a situação está muito pior. Estamos indo no caminho errado. O sistema tributário há dez anos era mais simples do que é hoje. A insegurança jurídica está aumentando no Brasil. Isso tudo preocupa. Hoje eu falo com conhecimento de causa. Eu ouvi por muitos anos falar em “custo Brasil” e, na realidade, eu não conseguia mensurar isso. Hoje, a JBS tem operações grandes fora do Brasil, em diversos países, e eu sei exatamente o que é o custo Brasil e a sua complexidade. 

E esse custo está aumentando?

Está aumentando. Há dez anos, o Brasil tinha menos litígio na área trabalhista, tinha mais segurança jurídica. O sistema tributário já era muito ruim, mas ele piorou um pouco. Você tinha menos guerra fiscal, menos disputa de convalidação de crédito tributário entre um Estado e outro e isso veio aumentando nos últimos anos. Isso foi acumulando um monstro na sala. O Brasil está ficando muito litigioso e inseguro juridicamente. 

Por que ocorre esse aumento no litígio trabalhista? O cenário econômico favorece esse tipo de coisa?

Não. É por falta de regra, segurança jurídica. Acordo coletivo valia há dez anos. Hoje, acordo coletivo não vale mais nada. Você não tinha discussão de coisas primárias… isso está ficando insustentável. 

Como o sr. vê o ambiente político dificultando as reformas?

Ruim. Para endereçar reformas como essas, você precisa do Executivo e do Legistativo trabalhando na mesma pauta. Quando você tem divergências, tem um desafio adicional, sem dúvida. 

Seara

Faz quase dois anos que vocês compraram os ativos da Marfrig. É possível fazer um balanço desse período?

Quando compramos a Seara, dissemos que iríamos investir para conquistar a confiança do consumidor. Esse é o nosso foco: investir maciçamente em qualidade, inovação e comunicação. Tivemos uma evolução, ganhamos market share. Estamos super felizes. Temos feito campanhas de marketing da Seara e estamos muito satisfeitos. 

E essa polêmica da campanha do S, de Seara?

Não tem polêmica nenhuma. A Seara começa com S e termina com A. 
Mas o que achou do argumento da BRF, de que…
Concorrência é concorrência. Eu não posso falar por eles, o que eles viram no filme… Qual é o presunto que começa com S e termina com A? Seara começa com S e termina com A. Se tivéssemos falando alguma mentira… Difícil falar qual foi a motivação do concorrente. 

Mas é uma referência à marca Sadia. O sr. nunca pensou na Sadia ao se perguntar qual presunto começa com S e termina com A?

É sério que nós pensávamos que Seara começa com S e termina com A. Então vai aí a campanha. 

Quem é o principal concorrente da Seara? Sadia ou Perdigão?

Concorremos com todo mundo. Com a Aurora, Sadia, Perdigão… Em troca do que? Do consumidor. Para nós, não faz diferença se é Sadia, Perdigão, Aurora… Pode até parecer que não, mas olhamos muito para dentro de casa. O que os outros fazem a gente não controla. Nós controlamos o que nós fazemos. Controlamos qualidade, execução no ponto de venda, pontualidade. Estamos focados nisso para ganhar a preferência do consumidor. 

O que o sr. espera dessa nova fase do mercado, com a volta da Perdigão? [a marca esteve suspensa durante três anos em algumas categorias por determinação do Cade.]

Sem arrogância nenhuma, não estamos olhando. Não controlamos o que a concorrência vai fazer. Não estamos nos preparando para nada. Estamos focados em produzir com qualidade e competitividade, do ponto de vista de custo, serviços, comunicação e ponto. O resto é consequência. Temos uma cultura muito forte de gastar tempo com o que a gente controla. Vamos cuidar da nossa vida. Cada um cuida da sua. 

AQUISIÇÕES

A JBS fez duas aquisições bilionárias em duas semanas [a empresa comprou a Moypark, na Irlanda, no final de junho e, uma semana depois, os negócios da Cargill de suínos nos EUA]. A companhia está voltando ao perfil agressivo que a transformou no gigante que é hoje?

Não mudamos o foco de continuar melhorando os indicadores de alavancagem, perfil de dívida, rating. Acreditamos que vamos continuar tendo melhoras consecutivas e consistentes nessa área. Mas acreditamos que é possível fazer isso e continuar crescendo. E esses negócios são de longa data. 

A JBS negociou com a Cargill e com a Marfrig durante muito tempo?

Tem um namoro com a Cargill há seis ou sete anos. Quando nós compramos a Swift, em 2007, a Cargill nos abordou e perguntou se nós queríamos vender o nosso negócio de suínos para ela. Falamos que não, queríamos conhecer o negócio. Há cinco anos, tivemos muito próximos de fazer uma sociedade. Por um motivo ou outro isso não concretizou. Mas desde aquela época demonstramos para a Cargill que era do nosso interesse, que esse negócio tem uma sinergia extraordinária, um sentido estratégico gigantesco.

Esse negócio torna a JBS a segunda maior produtora de suínos dos EUA?

Isso. 

E mundialmente?

Mundialmente a JBS também é a segunda maior do segmento de suínos. Temos operação nos EUA, Brasil, Austrália… Juntando tudo, a JBS vai para um abate diário de 120 mil suínos por dia. Era de 75 mil. 

E a Moypark?

Desde que abrimos capital da JBS, há sete anos, recebemos a oferta de muitos negócios na Europa. Não achávamos que era o momento, muito mais do ponto de vista de timing do que achar que a Europa não tinha um sentido estratégico para nós. Agora, nos últimos 12 meses, começamos a discutir internamente que estava chegando a hora de nos estruturarmos para ter uma base relevante para montar uma operação na Europa. 

Isso tem a ver com o momento econômico da Europa?

Sim. Achamos que a Europa está no início da sua recuperação econômica. A Europa é os EUA de quatro anos atrás. E o cenário ideal para a JBS era ter uma plataforma na Alemanha ou na Inglaterra. A Moypark coincidiu em todos os sentidos: tem plataforma na Inglaterra, um negócio grande e nos segmentos em que nós queremos crescer: aves e processados, marca, produto de valor agregado. Temos uma estrutura que vai nos permitir, nos próximos dez anos, montar um negócio relevante na comunidade europeia. 

Agora falta a Ásia?

Achamos que ainda tem muita coisa para fazer antes de ir para a Ásia. Do ponto de vista de timing, as oportunidades nos EUA, Europa, Austrália e América do Sul são mais importantes do que colocar foco na Ásia. Essa hora vai chegar, mas é no longo prazo. 
Como serão financiadas essas aquisições? Para pagar a Cargill vocês pegaram um empréstimo nos EUA.
Fizemos negócio pensando no caixa que temos. 

Quanto a JBS tem em caixa?

Tem um volume expressivo, cerca de R$ 14 bilhões. Fizemos aquisição para usar caixa para pagar. Mas olhamos alternativas… Estamos aproveitando as boas condições no mercado de capitais nos EUA. Fizemos um ‘bond’ (título de dívida) para pagar em dez anos a 5,75%. É difícil companhia brasileira que hoje que consegue acessar o mercado, emitir uma dívida a esse custo. Esse é um benefício que a JBS tem, acessar o mercado de capitais de outros lugares sem o custo Brasil.