Quase um ano e meio depois de pedir recuperação judicial, o frigorífico Quatro Marcos, com sede em Mato Grosso, obteve aval de seus credores para uma reestruturação que tem por objetivo devolvê-lo a uma posição de destaque no mercado de carne bovina, de onde despencou, endividado e com a imagem arranhada, no início de 2009.
Até então, o frigorífico controlado pelo empresário Douglas Xavier tentava se firmar entre os grandes grupos da área, como JBS, Marfrig e Minerva. Após faturar quase R$ 1 bilhão em 2007, o Quatro Marcos chegou a anunciar, em meados de 2008, uma fusão com o concorrente Margen e a criação de uma nova companhia (Uni Alimentos) com potencial para faturar R$ 2,5 bilhões por ano.
Desentendimentos entre as partes enterraram a fusão em uma semana, e a crise financeira que eclodiu logo depois, em setembro de 2008, precipitou o debacle de ambos. Alavancados e sem crédito, Quatro Marcos e Margen pediram recuperação judicial e, em um capítulo seguinte, arrendaram unidades para manter algum fluxo de caixa e tentar estancar seus passivos.
Finalmente aprovada por 72,5% dos credores, a reestruturação do Quatro Marcos envolve R$ 500 milhões e prevê a venda de unidades produtivas para garantir e acelerar o processo. Se tudo der certo, a ideia é voltar a ganhar peso no segmento, inclusive na exportação, ainda que seja grande a possibilidade de o frigorífico ser vendido agora que o plano de recuperação foi aprovado.
“A primeira coisa era fazer a empresa parar de sangrar, o que conseguimos com o arrendamento de plantas para a JBS. O Quatro Marcos não chegou a parar, mas seu faturamento caiu a 10% do que havia sido. Agora, conseguimos aprovar um plano de recuperação simples, quase um plano de pagamentos, e o frigorífico voltou a crescer novamente”, diz o advogado Charles Isidoro Gruenberg, do escritório Leite, Tosto e Barros, com sede em São Paulo.
O plano de recuperação aprovado prevê que os pecuaristas receberão seus créditos, que no total somam R$ 35,7 milhões, em até 12 parcelas mensais consecutivas. Gruenberg também informa que um grupo de credores de um contrato de pré-pagamento de exportação – formado majoritariamente por bancos e que aportou US$ 125 milhões na companhia, com todas as garantias – concordou em conceder um deságio de 68% e receberá US$ 40 milhões.
O pagamento dos credores quirografários será feito também em 12 parcelas, mas semestrais. Diferentemente dos pecuaristas, que começarão a ser pagos neste mês, os credores quirografários começarão a receber a partir de 31 de março de 2013. Já os credores trabalhistas receberão em até 12 meses, com o primeiro pagamento previsto para os próximos dias.
Isto posto, é hora de correr atrás dos recursos. No plano aprovado, o Quatro Marcos se comprometeu a vender duas unidades em até nove meses. Uma delas fica em Vila Rica, extremo norte do Mato Grosso, e está sendo operada pelo próprio frigorífico. A outra é em Cuiabá, capital mato-grossense, e está arrendada à JBS, com opção de compra. Muito em função disso, a JBS aparece como um caminho quase natural para a aquisição da planta cuiabana.
Na crise, e para “parar de sangrar”, o Quatro Marcos arrendou cinco unidades para a JBS, mas apenas duas – a de Cuiabá e a de São José dos Quatro Marcos, berço mato-grossense da companhia – eram próprias. As demais eram arrendadas. No auge, o Quatro Marcos chegou a operar 12 plantas.
Uma vez concretizada a venda da unidade de Vila Rica, o Quatro Marcos pretende concentrar as operações na unidade de Quirinópolis, sul de Goiás, que também está operando sob sua responsabilidade, mesma situação do entreposto de distribuição de Jandira, no interior de São Paulo.
Conforme Charles Gruenberg, as plantas de Vila Rica e Quirinópolis geram atualmente cerca de mil empregos diretos e 4 mil indiretos e o abate conjunto de bovinos está em torno de mil cabeças por dia. “O abate subiu 50% na semana posterior à aprovação da reestruturação. Em abril a empresa já deverá encontrar seu ponto de equilíbrio”, acredita o advogado.
Se a venda das duas unidades render US$ 40 milhões, a dívida com os credores do contrato de pré-pagamento de exportação será quitada. Se gerar entre US$ 25 milhões e US$ 40 milhões, a diferença – até os US$ 40 milhões – poderá ser refinanciada e paga em três anos, com carência de 18 meses.
Ainda que admita que existe a possibilidade de o Quatro Marcos ser vendido para um de seus concorrentes maiores que continuam em busca de oportunidades de expansão, Gruenberg afirma que não há nenhuma negociação concreta nesse sentido em curso.
Sendo assim, ele prefere projetar no horizonte a imagem de um Quatro Marcos novamente forte, o que poderá acontecer, em seus cálculos, em quatro anos. “É um plano exequível. A empresa tem de cumprir o plano de recuperação e reconquistar a confiança do mercado.