O projeto de lei para regulamentar a produção agroindustrial integrada que está em discussão na Câmara dos Deputado não pode inviabilizar a atividade com exigências irrealizáveis e engessamentos que anulem o dinamismo produtivo do setor. O alerta é do presidente da Associação Catarinense de Avicultura (Acav), Clever Pirola Ávila.
A entidade, que reúne as principais companhias da avicultura industrial brasileira, está preocupada com o formato excessivamente burocrático do projeto de lei 8023/10. Para a Acav, a regulamentação para tipificar as relações contratuais de integração e estabelecer as regras gerais para o sistema deve melhorar a relação entre indústrias e produtores e não criar novos encargos e embaraços de ordem formal.
O projeto institui o Fórum Nacional de Integração Agroindustrial (Foniagro), composto por representantes dos produtores integrados, das agroindústrias integradoras e do poder público com a atribuição de definir políticas nacionais e as diretrizes gerais para o aperfeiçoamento e desenvolvimento dos sistemas de integração no país. Institui também as comissões para acompanhamento e desenvolvimento da integração e solução de controvérsias (Cadisc), célula de cada unidade de integração e cuja composição será paritária entre integrados e a empresa integradora.
O presidente da câmara de sustentabilidade e relações laborais da União Brasileira de Avicultura (Ubabef), Ricardo Gouvêa, destaca que a iniciativa é positiva para determinação de responsabilidades de integrados e de integradores, mas alertou que uma futura legislação não pode engessar esse dinâmico relacionamento entre produtores e frigoríficos, descaracterizando o bem-sucedido sistema de integração.
O presidente da Acav discorre sobre o projeto em discussão no Poder Legislativo:
Na sua opinião, as relações de integração – especialmente a integração avícola – necessitam ser regulamentadas por lei federal? Por se tratar de relação econômica, já não está contemplada no código civil, lei das parcerias rurais e demais regras do nosso ordenamento jurídico?
Clever Pirola Ávila – Na realidade, hoje estão regulamentadas pelo código civil. Podemos evoluir a conceituação numa lei mais específica. Já existe uma lei que rege este tipo de acordo, mas podemos atualizá-lo numa legislação específica.
Qual a sua análise do PL 8.023/2010 que trata dessa matéria?
Ávila – Certamente necessita evoluir com as sugestões do setor como um todo, visando buscar uma abrangência adequada ao conteúdo.
Quais os aspectos positivos desse projeto de lei? E quais os pontos negativos? A regulamentação não pode engessar ou até mesmo inviabilizar a integração avícola?
Ávila – Atualização da legislação considerando os aspectos específicos inerentes à cadeia produtiva. O ponto será negativo se houver um retrocesso dos pontos chaves existentes hoje na relação empresarial agroindústria e produtor empresário. Não pode haver alteração dos conceitos chaves baseados no desempenho de cada parceiro.
O Sr. considera que a relação criador/indústria está desequilibrada? Por quê?
Ávila – Acredito muito neste modelo que é sucesso há mais de 60 anos. À medida que todos os Estados estão copiando o modelo e há uma enormidade de produtores empresários interessados em entrar e/ou mesmo expandir as atividades, creio que não há este desequilíbrio. Está baseado na aplicação financeira de cada um e num nível de risco que cada um pode gerenciar.
Quais as reais vantagens do sistema de integração para o produtor rural?
Ávila – Participar de uma cadeia alimentar que mais cresce no Brasil, com garantias reais de produção pela Agroindústria sem haver sobressaltos por oscilações de preços de mercados. Nesse modelo, a indústria integradora fornece insumos (pintos, rações, vacinas etc), tecnologia e assistência técnica. O criador deve ter água em quantidade e qualidade na propriedade rural, atender as exigências legais, disponibilizar mão de obra, material para cama, combustível para aquecimento e energia elétrica. A indústria assume também todo o risco de comercialização e repassa ao produtor integrado a compensação financeira pela criação das aves, proporcional à quantidade de aves produzidas e a eficiência na produção.
E para a indústria?
Ávila – Garantia do suprimento da indústria dentro de padrões exigidos pelo mercado.
Em face da complexidade biológica e industrial da atividade, é inviável para o produtor ou empresário rural criar frango de corte fora de um sistema de integração?
Ávila – A grande vantagem do sistema é estar interligado com a Agroindústria que possui uma rede de comercialização em nível mundial, dando mais oportunidades de transferência de tecnologias, conceitos produtivos, bem estar animal e apoio à legislação para o país consumidor.
O Sr. entende que a integração é uma forma de minimizar o êxodo rural e de elevar a qualidade de vida da família rural? Por quê?
Ávila – Creio que é um dos modelos mais efetivos (não é o único) por ser um modelo empresarial e de real parceria. A avicultura integrada é a melhor e mais justa reforma agrária já realizada no país, com distribuição de renda e garantia de qualidade de vida para os parceiros. A parceria entre agroindústria e criadores de aves constituiu um modelo de produção essencial para o desenvolvimento do interior do país. Ele foi responsável pela estabilização das famílias rurais, pelo controle do êxodo rural e pela instituição da regularidade mensal em geração de renda, entre outros benefícios.
No tocante à integração, qual é a tendência do setor para os próximos anos: existe possibilidade das indústrias criarem integrações próprias, verticalizarem a produção e dispensarem os pequenos criadores?
Ávila – Acredito que a agroindústria já está bastante verticalizada: desde a produção de avós, matrizes, ração, transporte, etc. Realmente é uma oportunidade para o produtor empresário participar desta parte da cadeia produtiva e não vejo necessidade da agroindústria também ocupar este espaço.
Qual é o real tamanho da avicultura brasileira?
Ávila – A avicultura brasileira emprega mais de 4,5 milhões de pessoas, direta ou indiretamente, tem uma produção que supera 12 milhões de toneladas de carne por ano e representa sozinha cerca de 1,5% do produto interno bruto (PIB) nacional. Parte desse sucesso deve-se ao sistema de integração entre os produtores e indústrias de abate e processamento de carnes avícolas. O Brasil tornou-se o maior exportador e o segundo maior produtor de carne de frango do mundo e, aproximadamente, 85% da criação avícola no Brasil segue o sistema de integração. Em termos de produtividade o sistema de integração também se mostrou vencedor: o tempo de abate das aves nos anos 50 era de 70 dias. Nos anos 70, passou para uma média de 50 dias e em 2010, para uma média de 45 dias. O peso das aves também evoluiu, saindo de 1,4 kg nos anos 50, passando para 1,68 kg nos anos 70 e 2,2 kg em 2010.