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Superando os obstáculos

<p>Após começo difícil, JBS amplia mercado e avança nos EUA.</p>

Redação (27/08/2008)- Matar um boi era coisa simples na época em que o empresário Wesley Mendonça Batista começou a trabalhar, com 17 anos de idade. Um dos empregados do frigorífico do seu pai segurava o animal com uma corda e ele dava um golpe na cabeça do boi com uma marreta de ferro. Quando o ponto exato era atingido, o animal perdia os sentidos e desabava. Às vezes, o boi só morria após o terceiro golpe. 
"Tem um ponto certo no alto do crânio do boi que você precisa acertar", ensina Wesley, hoje com 38 anos. "Quando pega ali, ele se esparrama no chão com as quatro patas uma para cada lado." O método foi abolido em grande parte da indústria e hoje em dia só é empregado em abatedouros clandestinos. Os frigoríficos agora devem usar pistolas de ar comprimido para atordoar os animais e evitar que sofram nas etapas posteriores do abate. 
Em duas décadas trabalhando ao lado do pai e dos irmãos, Wesley aprendeu tudo que precisava saber sobre o negócio que fez a fortuna da sua família. Controladores do grupo JBS-Friboi, eles viraram os maiores processadores de carne bovina do planeta, e Wesley assumiu uma posição-chave para o futuro do clã. Ele dirige as operações do grupo nos Estados Unidos e na Austrália, mercados que juntos geram dois terços das receitas da JBS. O faturamento do grupo deve passar de US$ 20 bilhões neste ano. 
O empresário instalou-se nos EUA há pouco mais de um ano, quando a JBS adquiriu o controle da Swift, terceira maior empresa do setor no país, por US$ 1,4 bilhão. Em março deste ano, o grupo anunciou a compra de mais duas grandes empresas, a National Beef e a Smithfield Beef, por US$ 1 bilhão. As duas aquisições estão sendo examinadas pela Divisão Antitruste do Departamento de Justiça dos EUA. 
Se o governo aprovar as transações mais recentes, o grupo brasileiro assumirá a liderança da indústria no país, passando na frente da Cargill e da Tyson. Suas fábricas terão condições de processar quase 42 mil cabeças de gado por dia, o equivalente a quase um terço da capacidade de abate existente no mercado americano e o dobro da que a JBS controla no Brasil. 
O grupo mostrou os dentes cedo. Quando os brasileiros chegaram, a Swift se encontrava em péssima situação financeira e estava perdendo terreno para os concorrentes. Quatro dezenas de executivos americanos foram mandados para casa e uma dúzia de profissionais brasileiros, todos com vários anos de experiência na JBS, assumiram o comando das operações da Swift. 
Num movimento atrevido, eles decidiram dobrar a produção da maior planta da companhia, localizada a alguns quilômetros do seu quartel-general em Greeley, no Estado do Colorado. Em menos de dois meses foram contratados 1,3 mil trabalhadores e a fábrica começou a operar em dois turnos. "Todo mundo achou que eles eram loucos", diz Pedro Herrera, um analista que acompanha o setor no banco HSBC em Nova York.

Não havia demanda que justificasse um passo tão audacioso, e a empresa continuou perdendo dinheiro por vários meses. Mas o aumento da capacidade de produção em Greeley ajudou a JBS Swift a abocanhar uma fatia maior do mercado, avançando sobre seus principais rivais. "Eles deram uma chacoalhada na indústria", diz Steve Kay, editor da "Cattle Buyers Weekly", uma publicação especializada no setor. 
Os resultados começaram a ser colhidos neste ano. Com o dólar mais barato, as exportações dos EUA aumentaram. Países como a Rússia e a Coréia do Sul eliminaram barreiras comerciais que impediam a entrada da carne americana. E a redução de custos obtida com o processo de enxugamento promovido na JBS Swift tornou-a muito mais competitiva do que os concorrentes. 
"Passamos por alguns meses horríveis, mas precisávamos nos preparar para o momento em que o mercado voltasse a ficar bom", diz Wesley. As margens operacionais da empresa, que eram negativas quando a Swift foi adquirida, hoje são melhores do que as obtidas pelo grupo no Brasil, onde a valorização do real e a alta do preço do boi têm reduzido a lucratividade do setor. 
O grupo JBS registrou um prejuízo de R$ 364 milhões no segundo trimestre deste ano, por causa do peso do seu endividamento e de despesas financeiras contraídas com as aquisições dos últimos meses. Mas o resultado teria sido bem pior se as coisas não estivessem indo tão bem nos EUA, onde o grupo contabilizou um lucro de R$ 113 milhões nesse mesmo período. 
Wesley faz parte de uma família que procura conduzir seus negócios com extrema discrição. Seu irmão Joesley, 36, preside o grupo e mora em São Paulo. Nem ele nem Wesley se deixam fotografar. O irmão mais velho, José Batista Júnior, 48, é mais desinibido. Ele ensaiou uma candidatura ao governo de Goiás três anos atrás, mas desistiu da idéia e agora também vive nos EUA. 
Júnior abortou o plano porque na mesma época em que tentou entrar na política foi apanhado em escutas telefônicas combinando com os concorrentes o preço que pagavam pelo gado, o que é ilegal. O episódio nunca foi completamente esclarecido, porque a JBS fez um acordo com o governo para a suspensão das investigações sobre formação de cartel, que envolvia também outros 11 frigoríficos. A empresa pagou uma multa de R$ 14 milhões e ficou livre do processo em novembro de 2007. 
Os três irmãos falam pelo telefone diariamente. Todos pararam de estudar antes de completar o ensino médio para trabalhar com o pai, José Batista Sobrinho, que está com 74 anos de idade e fundou o grupo abrindo um açougue em Goiás, em 1953. Conhecido como Zé Mineiro, o patriarca vai praticamente todos os dias até a sede do grupo em São Paulo, onde também trabalham suas três filhas mulheres. 
Wesley não sabia falar mais do que meia dúzia de palavras em inglês quando chegou aos EUA, em julho do ano passado. Um dos executivos brasileiros que ele levou para Greeley atuou como seu intérprete nos primeiros meses, acompanhando o chefe por toda parte. Wesley toma aulas particulares três vezes por semana, mas ainda tem muita dificuldade com a língua. 
Há poucas semanas, ele visitou uma associação de criadores de gado no Estado de Nebraska e fez questão de discursar e responder às perguntas da platéia em inglês. "Vocês produzem gado, nós vendemos carne", disse Wesley. "Nossa porta está aberta e queremos trabalhar com vocês." 
Apesar das desconfianças que a agressividade da JBS despertou no início, muita gente viu a chegada do grupo brasileiro com alívio. "Nossa indústria atravessou uma fase difícil nos últimos anos, e a entrada de novos participantes com dinheiro e acesso ao mercado externo foi positiva", diz o presidente da associação de criadores de gado do Estado do Kansas, Tracy Brunner.