O resultado do PIB no primeiro trimestre de 2021 surpreendeu positivamente. A mediana das expectativas do Valor Data apontava para um crescimento de 0,5% na variação em relação ao mesmo trimestre do ano passado e de 0,7% na comparação com o trimestre anterior, feito o ajuste sazonal. O resultado foi de 1,% e 1,2%, respectivamente.
Na ótica da produção, destaque para o crescimento da agropecuária, de 5,2% ano a ano, e da indústria, com 3% de variação. O setor serviços teve contração de 0,8% nessa base de comparação. Do ponto de vista da absorção doméstica, o desempenho do investimento, com crescimento de 17% ano a ano, foi o que mais chamou a atenção, enquanto o consumo das famílias caiu 1,7% e o consumo do governo caiu 4,9%.
A análise dos números mostra que o grande destaque dessa divulgação do PIB foi a composição benigna do crescimento, com ênfase na produção e no investimento, e menos dependência do consumo agregado (governo + famílias). Esperava-se que, com as políticas monetária e fiscal expansionistas que tivemos no ano passado, o crescimento pudesse estar sendo inflado pelo consumo.
No entanto, o que se notou no primeiro trimestre de 2021 foi que a poupança agregada continuou crescendo e o consumo não foi o “motor” do crescimento. Isso nos remete a uma hipótese de que o bom crescimento atual pode estar ligado ao ciclo global de commodities, em um fenômeno semelhante ao que vimos na década de 2001 a 2010, quando o crescimento da China ativou um super ciclo de alta de matérias-primas que beneficiou o Brasil.
Dessa vez, o fenômeno é um pouco diferente. A taxa de urbanização da China se dá a um ritmo mais lento do que no passado, mas temos uma superdose de estímulos monetários e fiscais no mundo, que motivou uma recuperação acelerada da recessão ocasionada pela Covid-19. Como consequência, as matérias-primas subiram fortemente.
Parece que estamos vivendo novamente um superciclo, mas, de maneira acelerada, como se estivéssemos em uma espécie de “fast forward” do ciclo passado. Tudo indica que a duração atual será menor porque os estímulos foram excessivos e as consequências já estão batendo à porta. No entanto, ainda estamos na fase da aceleração e os benefícios para o Brasil estão começando a se fazer sentir.
No Brasil, além do crescimento real do PIB, é interessante destacar também o componente nominal. Em valores correntes, o PIB do primeiro trimestre cresceu 11,1% contra o mesmo período do ano passado. Isso significa que o deflator implícito (a taxa de inflação do PIB) foi de 10% ao ano. Se considerarmos que o PIB de 2021 vai crescer 5,5% em termos reais, e mantivermos o deflator em 10%, temos que o PIB nominal crescerá 16%.
Isso terá um efeito benéfico muito grande sobre os dados fiscais, particularmente sobre a relação dívida/PIB. O efeito nominal aumenta a arrecadação tributária, melhorando o resultado primário, enquanto o PIB também cresce, reduzindo, assim, o endividamento. Nessa linha, o Tesouro Nacional divulgou recentemente uma revisão do déficit primário de R$ 280 bilhões para R$ 180 bilhões no ano, ou seja, uma diferença de R$ 100 bilhoes, equivalente a aproximadamente 1,3% do PIB. Se tivermos alguns anos de crescimento forte, o benefício sobre a relação dívida/PIB será ainda maior e mais fácil a tarefa de estabilizá-la. Basta preservar o teto de gastos.
Por fim, uma consequência negativa do superciclo de commodities é a inflação mais alta. Esse fenômeno já está ocorrendo na economia brasileira. Os índices gerais de preços (IGPs) estão altíssimos e o deflator do PIB também. Porém, os preços no varejo estão relativamente bem comportados. Vejamos o IPCA, por exemplo. Houve uma alta de alimentos importante no ano passado e uma forte alta de combustíveis neste ano.
Ademais, os bens industrializados, particularmente os que demandam muitas matéria-primas, também subiram. Por outro lado, os serviços continuam com inflação baixa, refletindo o desemprego elevado e a renda agregada fraca. O Banco Central vem aumentando a taxa de juros para garantir que a mudança de preços relativos em curso não se transforme em um fenômeno inflacionário mais generalizado. Se isso for bem sucedido, e não temos razão para duvidar, o superciclo de commodities será benéfico para o Brasil.
Ainda temos que nos preocupar com um possível racionamento de energia. Essa é uma questão que de tempos em tempos nos preocupa. Talvez esteja na hora de repensar a matriz energética, tornando-a menos dependente do ciclo hidrográfico. Em suma, os bons ventos do crescimento global tendem a nos ajudar. Façamos a nossa parte.