Garantir acesso público e facilitado ao conhecimento disponível sobre alimentos, e sensibilizar e estimular consumidores a tomarem decisões cada vez mais sustentáveis. Esses são os principais motivos que levaram a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e o WWF-Brasil a lançarem, no final de 2016, a campanha #SemDesperdício com o apoio da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO Brasil). Esses parceiros históricos acabam de assinar um novo acordo de cooperação técnica (ACT) visando o avanço em várias frentes comuns.
Os signatários assumem compromisso mútuo de perseguir uma série de objetivos, como divulgar informações relevantes sobre sistemas alimentares saudáveis e circulares para as partes interessadas e contribuir para a elaboração de materiais educativos para a conscientização sobre dietas sustentáveis e desperdício de alimentos, visando especialmente os segmentos de jovens adultos e o público escolar. Dentre as primeiras atividades da parceria estão a participação conjunta em Grupo de Trabalho, liderado pela ONU Meio Ambiente, para propor ações visando a redução do desperdício de alimentos na América Latina com enfoque nas etapas de varejo e consumo, e ações de comunicação em mídias sociais por meio dos perfis da campanha Sem Desperdício.
“A intenção das duas instituições, desde o início das primeiras tratativas, é fortalecer o engajamento de consumidores. Da parte da Embrapa, temos claro interesse em analisar e divulgar pesquisas sobre dietas com impacto socioambiental positivo, inclusive do ponto de vista da redução do desperdício de alimentos”, afirma João Flavio Veloso, chefe da Embrapa Alimentos e Territórios. “Pretendemos fortalecer a atuação em rede, unindo esforços com outras Unidades da Embrapa e com parceiros das iniciativas pública e privada”, complementa.
Uma outra linha de atuação diz respeito à colaboração em iniciativas de apoio a políticas públicas de alimentação, com enfoque na ampliação do acesso a alimentos saudáveis e sustentáveis. “A promoção e fortalecimento da adoção das dietas saudáveis e sustentáveis tem alinhamento com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 1 (Combate à pobreza), 2 (Fome Zero), 3 (Saúde e bem-estar), 4 (Educação de qualidade), 12 (Consumo e produção sustentáveis) e 13 (Mudanças climáticas)”, lembra Gustavo Porpino, analista da Embrapa Alimentos e Territórios que participou diretamente das articulações para redação e assinatura do ACT.
Em setembro de 2019, foi lançada a Década da Ação para o alcance dos ODS pelas Nações Unidas. A ampliação da oferta de alimentos saudáveis pode ser parte de uma estratégia de mitigação de perdas e desperdício em diversos elos da cadeia produtiva. “Só iremos avançar na garantia da segurança alimentar a todas as pessoas se o combate à perda e ao desperdício de alimentos também for prioridade”, afirma Gabriela Yamaguchi, diretora de Sociedade Engajada do WWF-Brasil. “As transformações são urgentes e interdependentes: valorizar alimentos mais saudáveis e nutritivos, com redução da perda e do desperdício em todos os elos da cadeia, é parte dos modelos regenerativos de produção e consumo que garantam sistemas alimentares mais resilientes e justos. As soluções nessa direção devem ser uma prioridade dos governos e organizações”, destaca.
Ao mesmo tempo, é importante informar, educar e empoderar os indivíduos para que quando possível, façam escolhas mais conscientes sobre o seu consumo de alimentos, considerando os impactos significativos associados a mudanças coletivas de comportamento. “Em 20 anos, segundo o Relatório Planeta Vivo 2020 do WWF, tivemos uma queda de 75% na diversidade de culturas cultivadas nas safras de todo mundo. Ações de educação para valorizar e estimular a produção e o consumo de alimentos variados, nativos e regionais, em harmonia com as pessoas e a natureza, estimulam o aumento de valores nutricionais e culturais, gerando menos impactos negativos das atividades humanas, garantindo a saúde e o bem-estar humano e ecossistêmico”, avalia Gabriela.
Porpino acrescenta ainda que, por sua relevância e abrangência, o tema das Perdas e Desperdício de Alimentos tem desdobramentos diretos nos compromissos assumidos pelos países em acordos estratégicos internacionais, como o Acordo de Paris firmado na 21ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima; a Agenda 2030 e o Plano da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos para a Segurança Alimentar, Nutrição e Erradicação da Fome 2025 (PLANSAN CELAC 2025).
A Agenda 2030 traz em seu Objetivo de Desenvolvimento Sustentável nº 12 (Assegurar padrões de produção e de consumo sustentáveis), a meta 12.3: “Até 2030, reduzir pela metade o desperdício de alimentos per capita mundial, nos níveis de varejo e do consumidor, e reduzir as perdas de alimentos ao longo das cadeias de produção e abastecimento, incluindo as perdas pós-colheita”.
Em 2018, a Embrapa liderou uma pesquisa, em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV) e apoio da União Europeia, para identificar os alimentos mais desperdiçados pelos consumidores, e explorar possíveis motivos que justificassem esse comportamento. “Esse estudo contribui para a construção de uma linha de base para pautar o desenho de ações para a redução de perdas e desperdício de alimentos, a sua divulgação por meio da plataforma e da rede estabelecida pela campanha #SemDesperdício, também contribui para a construção de repertório, conscientização e sensibilização dos consumidores em geral”, considera Gustavo.
A Embrapa ressalta que os dados dessa e de outras pesquisas evidenciam que o Brasil precisa atuar em diferentes elos da cadeia para evitar perdas e desperdícios de alimentos, e incentivar mudanças em padrões alimentares, buscando a saúde e bem-estar, e que ações de comunicação e educação alimentar são fundamentais para conscientizar e conectar o consumidor com o alimento, assim como às tecnologias e capacitações técnicas.
Comunicação
Aplicar conhecimento técnico e informações científicas em materiais de educação é outra atividade fundamental prevista no ACT, para ampliar o avanço da agenda de redução das perdas e desperdício de alimentos e promoção de dietas sustentáveis. Nesse sentido, a iniciativa expandiu suas atuações em 2019, com a produção conjunta de materiais educativos ao público escolar e realização de eventos e oficinas empregando este material, como no projeto financiado pelos Diálogos Setoriais União Europeia – Brasil.
Além da produção do Guia do Educador #SemDesperdício, com passo-a-passo para a realização de atividades lúdicas para o combate ao desperdício de alimentos e sistemas alimentares, a iniciativa também coordenou a publicação de um gibi, em parceria com o Instituto Maurício de Souza focado na redução do desperdício de alimentos. “Ambos os materiais tiveram divulgação presencial, com eventos conduzidos em Rio Branco (AC), Aracaju (SE) e Foz do Iguaçu (PR), contabilizando a participação de mais de 300 jovens e professores naquele período”, lembra Gustavo.
Ainda em 2019, a Iniciativa #SemDesperdício também fortaleceu seu pilar de engajamento do público geral através de um evento cujo público-alvo eram influenciadores digitais e que permitiu a esse público uma vivência com a agroecologia e troca de experiências com especialistas da Embrapa, WWF-Brasil e UnB.
Em dezembro de 2017, um grupo formado por especialistas da Embrapa, Ministério do Desenvolvimento Social, WWF-Brasil e Delegação da UE no Brasil participou de missão à Bélgica, Dinamarca, Holanda, Inglaterra e França para conhecer campanhas de comunicação e outras experiências exitosas de combate ao desperdício de alimentos, tais como bancos de alimentos e supermercados sociais.
Além do aprendizado e troca de experiências, a missão permitiu estreitar o relacionamento da Embrapa com diversas instituições, como Wageningen UR, ministérios europeus e WRAP. Foram realizadas apresentações institucionais na Comissão Europeia, em Bruxelas; no Ministério da Agricultura e Alimentação da Holanda; e no Ministério do Meio Ambiente e Alimentação da Dinamarca.
Por meio do comitê técnico da Câmara Interministerial sobre Segurança Alimentar e Nutricional (CAISAN) foi aprovada em 2018 a “Estratégia intersetorial para redução das perdas e do desperdício de alimentos”, que tem como um dos eixos de ação “comunicação e capacitação”. A iniciativa #Sem Desperdício influenciou também a oficialização da Semana Nacional de Conscientização sobre Perdas e Desperdício de Alimentos, realizada pelo Ministério do Meio Ambiente e parceiros de 5 a 10 de novembro de 2018.
Pandemia
Considerando as diversas mudanças em hábitos alimentares dos consumidores brasileiros devido à pandemia de COVID-19, e a intensificação das discussões sobre Dietas Sustentáveis e Desperdício de Alimentos em meio a este cenário, é essencial a continuidade das atividades das duas instituições como articuladoras na construção de uma rede que busque identificar e implementar soluções multissetoriais com os diversos atores da cadeia dos alimentos, incluindo o consumidor final.