A batalha dos grandes países emergentes para obter mais voz e voto no Fundo Monetário Internacional (FMI) coloca em risco a cúpula do G20 a iniciar-se amanhã (24/09) em Pittsburgh (EUA), a terceira em menos de um ano do clube das 21 maiores economias do mundo mais a União Europeia.
Para o Brasil, é prioridade absoluta aumentar o peso dos emergentes no FMI, de forma a que a distribuição de poder fique, grosso modo, em 50% para ele mais países em desenvolvimento e 50% para os ricos, quando hoje é, respectivamente, de 43% e 57%.
Mas, nas negociações entre os técnicos do G20, ficou evidente a fortíssima resistência dos países europeus à mudança pretendida pelos Bric (Brasil, Rússia, Índia e China).
Os europeus é que perderiam na alteração, já que eles estão sobre-representados no FMI. Os Estados Unidos apoiam a mudança, embora ainda não esteja claro, para a delegação brasileira, se aceitam as porcentagens desejadas pelos emergentes.
Agora ou nunca – Para a delegação brasileira, a cúpula de Pittsburgh é o agora ou nunca para consolidar a mudança no Fundo (e também no Banco Mundial), por mais que, em reuniões anteriores, a decisão técnica sobre as novas cotas tenha sido jogada para 2011 (no FMI) e 2010 (no Banco Mundial).
O Brasil acredita que a alteração só se dará se houver um impulso político, que só pode ser dado pelos chefes de governo, e só pode ser agora, em um momento em que a crise parou de piorar – até melhorou em muitos países. Sem a urgência que uma crise sempre impõe, acreditam os brasileiros, o impulso reformista se diluirá.
A batalha pelo FMI, se não for bem conduzida de parte a parte, acabará causando uma vítima colateral: o plano norte-americano para a cúpula, batizado de “Moldura para um Crescimento Equilibrado e Sustentável”.
Em resumo, a ideia básica do plano é escapar dos desequilíbrios pré-crise, caracterizados por taxas de poupança e de exportações elevadíssimas por parte da China (principalmente mas não só ela) e, na outra ponta, por um nível de consumo e endividamento insustentáveis nos Estados Unidos.
O que o FMI tem a ver com isso? Tudo, segundo o projeto norte-americano: caberá justamente ao Fundo a função de monitorar os equilíbrios econômicos globais, o que significa vigiar variáveis como o câmbio, exportações, transações com o exterior etc.
Para o Brasil e para seus pares dos BRIC, essa nova função do FMI é inaceitável sem que haja previamente uma reequilíbrio nos votos na instituição.
China – Se não bastasse esse nó, há ainda o fato de que a China está pouco disposta a deixar-se monitorar por agentes externos, por mais que concorde, em tese, com a necessidade de estimular o consumo interno, para tê-lo como motor do crescimento ao lado (ou acima) das exportações.
Contribui para a resistência chinesa o fato de ter sido o país que mais ganhou com o modelo vigente até a crise e que os Estados Unidos pretendem agora alterar.
É eloquente que, na antevéspera da cúpula, o Banco Asiático de Desenvolvimento tenha anunciado que o crescimento chinês em 2009 será de 8,2%, nível superior aos 7% antes estimados -o que revela a quase plena recuperação da China.
Não é apenas a China que resiste: a Alemanha, outro pais que tem nas exportações sua principal alavanca econômica, também não se entusiasma com a mudança de modelo.
Tanto é assim que sua chanceler, Angela Merkel, enviou carta a seus pares do G20 em que defende, como o plano norte-americano, enfrentar os desequilíbrios globais, entre outros pontos.
Mas a carta contém apenas princípios gerais, sem prever monitoramento, ao contrário do projeto dos EUA.
De todo modo, o reequilíbrio econômico global subiu ao topo da agenda, deixando em segundo plano o outro contencioso, este entre os Estados Unidos e a Europa, em torno da remuneração de banqueiros e agentes financeiros.
O presidente francês, Nicolas Sarkozy, chegou a ameaçar retirar-se do G20 se não houver, em Pittsburgh, alguma providência forte em relação aos ganhos dos banqueiros, em especial os bônus que recebem.
Já o presidente Barack Obama pergunta, em entrevista à Bloomberg: “Por que vamos limitar os salários dos banqueiros de Wall Street, e não o dos empreendedores do Vale do Silício ou das estrelas da Liga Nacional de Futebol [americano]?”.