A americana AGCO está colocando em prática uma estratégia que outras montadoras de máquinas agrícolas poderão adotar no médio prazo por conta do câmbio atual. Suas plataformas de exportação, principalmente de componentes, serão transferidas para países onde os custos de produção estão mais baixos em relação ao Brasil. Dona das marcas Massey Ferguson, Valtra e Challenger, a AGCO vai construir duas novas fábricas na China e reforçar sua atuação na Índia.
A multinacional americana não revela os valores da operação, mas já está decidido que serão duas unidades em pontos diferentes da China para tentar aproveitar ao máximo a logística do país. Além de enxergar um grande potencial para a o abastecimento do mercado chinês de máquinas agrícolas, o grupo quer atender boa parte de sua demanda global a partir dali.
No caso indiano, a AGCO já tem uma participação de 23% das operações da Tafe, segunda maior fabricante de tratores daquele país, com faturamento próximo a US$ 1 bilhão, e, por enquanto, não tem planos de construção de novas plantas. A ideia é deixar de ter uma presença apenas financeira na operação, para assumir uma postura mais operacional na empresa.
“O Brasil perdeu muita competitividade nos últimos anos. Já fizemos algumas importações de tratores da Índia para o Brasil e queremos utilizar essas fontes para outros lugares do mundo”, reconhece André Carioba, vice-presidente sênior da AGCO para a América do Sul.
Com os investimentos e a aposta no mercado asiático, a empresa quer proporcionar um melhor equilíbrio a seus negócios. Com faturamento global de US$ 6,6 bilhões no ano passado, apenas 3% da receita da AGCO vem do mercado asiático. O grande mercado do grupo ainda foi o europeu, com participação estimada de 55% no faturamento em 2010; a América do Norte deverá abocanhar 22% da receita global do grupo, e a América do Sul, 20%, mais do que em 2009 (18%).
“Queremos reduzir os riscos da operação e a tendência é que, com o passar dos anos, haja um equilíbrio maior entre as regiões que atuamos. Com isso é possível até que o Brasil perca um pouco de espaço, apesar de o país ainda ter um grande potencial de crescimento”, afirma Carioba.
Especificamente para o Brasil, a AGCO planeja consolidar este ano o investimento de US$ 10 milhões feito para duplicar sua unidade de implementos agrícolas em Ibirubá (RS) e o aporte de US$ 8 milhões na duplicação da capacidade de produção de motores em Mogi das Cruzes (SP), ambos concluídos em 2009. Além disso, a companhia começou a atuar no mercado de aluguéis de máquinas para agricultura, como já faz na Europa.
“Esse é um nicho que pretendemos explorar melhor. Por enquanto, vamos atuar nos mercados de São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul e canalizar os esforços pelo concessionário, que vai treinar e oferecer suporte aos usuários”, afirma Carioba.
Não é por acaso que as empresas do segmento estão interessadas em reduzir suas exportações a partir do Brasil. Nos três primeiros meses do ano, a queda registrada no número de máquinas exportadas é de 26%. Segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), foram exportadas de janeiro a março deste ano pouco mais de 3 mil unidades, ante as 4.054 embarcadas no mesmo período do ano passado.
O ápice das exportações brasileiras foi alcançado em 2004. Naquele ano, foram embarcadas a partir das montadoras brasileiras quase 30 mil unidades, e as empresas tinham a seu favor a valorização do dólar em relação ao real, o que concedia ao país uma forte competitividade no mercado internacional. Então, o valor médio do dólar comercial alcançou quase R$ 3,00.
Algumas empresas, entre elas a própria AGCO, chegaram a transferir linhas de produção instaladas em países europeus para o Brasil no início dos anos 2000. Em 2003, a empresa ampliou sua unidade de Canoas (RS) para receber parte da produção de sua planta de Coventry, na Inglaterra, com a estratégia de aproveitar a vantagem que o Brasil tinha nas exportações.
Também em 2003, a italiana CNH decidiu transferir toda sua fábrica colheitadeiras de cana-de-açúcar de Bundaberg, na Austrália, para Piracicaba (SP). Nesse caso, a empresa identificou não apenas a vantagem que o câmbio oferecia para as exportações, mas também o potencial de crescimento dos biocombustíveis e do aumento dos canaviais brasileiros, o que acabou se concretizando, apesar da queda do dólar.