Redação (22/09/2008)- A tempestade na oferta global de crédito vai atingir o setor agrícola do Brasil, um dos maiores exportadores mundiais de café, açúcar, suco de laranja, carne, soja e etanol, mas desta vez o setor parece mais preparado do que em crises anteriores.
O Brasil realizou importantes reformas macroeconômicas desde a onda de escassez de crédito que atingiu a Ásia, a Rússia e a América Latina no final da década de 1990.
"As empresas locais estão mais voltadas para o exterior. Muitas delas realizaram oferta de ações e estão cotadas em Nova York. Estão mais bem capitalizadas", disse à Reuters Pedro Carmargo, ex-dirigente do Ministério da Agricultura, hoje presidente da Abipecs, que representa produtores e exportadores de carne suína.
Apesar das melhoras nos últimos tempos, ele acha que haverá uma crise de crédito para o setor em curto e médio prazo. "Haverá problemas. Há muita dívida realizada aqui, e os bancos locais terão de recorrer ao mercado internacional."
Nas crises anteriores, os credores externos restringiram as linhas de crédito que mantinham para os bancos brasileiros, que por sua vez repassavam os empréstimos para o mercado doméstico. O setor agrícola responde por 20-25 por cento do PIB brasileiro, e é um dos principais responsáveis pelos sucessivos superávits comerciais do país, o que gera uma invejável reserva em moedas fortes no Banco Central.
Com a escassez de crédito nos maiores bancos do mundo e uma tendência de regras mais rígidas nos EUA e União Européia sobre a forma como esses bancos arrecadam e alavancam capital, os economistas prevêem tempos mais difíceis para os mercados emergentes dependentes das linhas de crédito internacionais.
"Ainda é cedo para saber como ficará a paisagem financeira quando isso tiver passado, mas por enquanto parece que haverá uma disputa por crédito em 2009", disse Fabio Silveira, da RC Consultores, de São Paulo.
As usinas de álcool, após anos de bonança, já decidiram adiar projetos de novas unidades, devido às restrições do crédito, segundo Plínio Nastari, presidente da consultoria Datagro.
Maturidade
A poucas semanas das eleições municipais, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, vêm repetindo que o Brasil está praticamente imune à crise.
Especificamente para o setor exportador, um efeito colateral adicional deve ser o câmbio, segundo economistas.
"É muito mais difícil para o setor exportador agrícola lidar com grandes oscilações na taxa de câmbio do que com o aperto no crédito", disse Amaryllis Romano, economista da consultoria Tendências.
Depois da reabertura das linhas de crédito para o Brasil, após o pânico pré-eleitoral de 2002, o real já se valorizou mais de 100 por cento frente ao dólar, dificultando a vida de quem exporta em moeda estrangeira, mas tem dívidas a pagar em moeda nacional.
Nas últimas semanas, a situação se inverteu e o real se desvalorizou fortemente, o que tende a perturbar as exportações em curto prazo. Em médio e longo prazo, porém, um real mais fraco favorece a competitividade agrícola do Brasil no mercado internacional.
Porém, a valorização do dólar nas últimas semanas torna os bancos mais relutantes em emprestarem aos exportadores os dólares de que eles precisam no seu dia-a-dia.
"Os bancos no Brasil têm sido muito cuidadosos em vender dólares", disse o corretor de café John Wolthers, segundo quem os bancos preferem manter dólares guardados a emprestá-los, quando há perspectiva de valorização da moeda norte-americana.